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05/07/2012

Pro memoria (60) – pior é difícil

Ao comentar a derrapagem da execução orçamental do 1.º trimestre, António José Seguro conseguiu de uma assentada mostrar falta de memória, dizer vários dislates e contradizer o seu discurso habitual.

Comecemos pela falta de memória. Terá AJS esquecido o seu silêncio sepulcral face às inúmeras derrapagens de Teixeira dos Santos? Veja-se, por exemplo, o défice de 2009 que começou por 2,2%, foi derrapando e quando se pensava que já teria derrapado tudo ainda teve mais uma derrapagem final para 10%. Ou veja-se o défice de 2010 que no programa eleitoral do PS de Abril de 2011 já era 6,8% e acabou em 9,8%.

Continuemos com as contradições. Depois do choradinho habitual da «austeridade», dos «sacrifícios», do «crime», do «empobrecimento», do «desemprego», etc., resultante das medidas do governo, queixa-se agora que a receita não serviu para nada porque houve uma derrapagem. Mas nesse caso, onde estava a «folga» de que tanto falou, se mesmo tão duros «sacrifícios» não chegaram? Se não fossem estes «sacrifícios» qual seria o resultado? Se os «sacrifícios» fossem menores a derrapagem não seria maior?

Prossigamos com os dislates. AJS quer que o financiamento seja a «taxa de juro mais baixa e para isso não é necessário alterar qualquer tratado europeu». Como diz «não quero que o BCE financie o nosso défice», o que aliás não seria admitido pelos tratados europeus, vejamos as outras possibilidades.

A compra de dívida pública pelo European Stability Mechanism, já pode há meses ser feita no mercado secundário, onde não tem influência na taxa de juro fixada nos leilões no mercado primário que é taxa relevante para o serviço da dívida. Para ser feita no mercado primário passará a ser necessário, se e quando for aprovado o acordo do dia 29 de Junho, um programa de medidas parecido ou pior do que o MoU.

Para emitir eurobonds, leia-se a Alemanha, a Holanda, Finlândia a garantirem a dívida dos inadimplentes, o que também não é admitido pelos tratados europeus, seria preciso alterá-los, coisa dificilmente aceite pela Alemanha e pelos outros países solventes, para já não falar do Reino Unido.

Quando se diz Alemanha, não é apenas nem principalmente o governo alemão. Uma alteração deste calibre teria que ser aprovada por 2/3 do Bundestag e pelo Tribunal Constitucional, porque a democracia alemã não é tão asmática como a portuguesa em que os deputados aprovam o que o chefe os mandar aprovar.

Se, um gigantesco se, tudo isso fosse conseguido, ainda assim seria preciso um longo calvário de anos para negociar, aprovar e nalguns países referendar os novos tratados. Enquanto isso, onde esgravataríamos os carcanhóis para pagar a festa? Pediríamos ao senhor Hollande?

Perante isto, sou tentado a subscrever o comentário de um leitor do Público: «Tem dó Tozé! Já não bastava a austeridade, temos agora que gramar a tua imbecilidade?»

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