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11/03/2012

CASE STUDY: António Champalimaud revolve-se na tumba (3) - Tem tudo menos o principal

aqui e aqui tratei da Fundação Champalimaud, suspeitando que seja mais um convento de Mafra. Ou seja, uma construção paquidérmica para albergar muitos fiéis com pouca fé, feita com dinheiro que não custou a ganhar a quem o gasta. Em Agosto de 2010 quanto abordei este tema pela primeira vez só havia disponível no site da Fundação o relatório e contas de 2007. Hoje no mesmo site não há um só relatório e contas disponível, nem mesmo o de 2007. Esta total opacidade não costuma ser de bom augúrio.

Infelizmente a entrevista de Clara Ferreira Alves a Jorge Rosa Santos, director do Serviço de Cirurgia e Pescoço do IPO, na revista do Expresso de 03-02, parece confirmar os meus piores receios.

Fundação Champalimaud. Qual a relação como IPO?

A Fundação Champalimaud começou mal. Devia ter começado - já que ia trabalhar na área da Oncologia - por tentar chamar as pessoas mais marcantes da Oncologia nacional, quanto mais não fosse para estarem presentes na inauguração da Fundação. Não percebo porque é que estava lá o doutor em Economia e não estavam o presidente da Sociedade Portuguesa de Oncologia ou os presidentes dos Institutos de Oncologia. Além de instituições de investigação, como o IPATlMUP... Mas a Fundação existe. Tem condições boas, tem bom equipamento, tem profissionais... Alguns saídos do sector público. Mas falta-lhe os doentes. É tudo muito bonito, os jardins, etc., mas no outro dia fui lá e não há doentes.

As pessoas leem que a Fundação Champalimaud tem uma máquina de radioterapia inovadora, caríssima, que poupa o doente aos efeitos secundários, e perguntam porque é que o IPO não tem...

Têm o IMRT, uma radioterapia de intensidade modulada, que tenta preservar as estruturas anatómicas. Mas o IPO também tem. Só que os jornais dão azo a esses equívocos. A grande parte das técnicas da Fundação Champalimaud já existe no sector público. Eles vão comprar agora um aparelho caríssimo, de milhões, que de facto não existe no sector público. Nem sei o nome dele. Há tempos, o presidente do CA pediu às pessoas que pensassem sobre a Fundação Champalimaud. Porque têm instalações, máquinas, e nós temos os doentes, que são uma riqueza incalculável em casos clínicos. A minha resposta foi a de que deveríamos engolir sapos. Por mais que me custe engolir sapos. Tentar estabelecer um protocolo. Se o IPO não aproveitar isto, outros o vão fazer.

Quem é que tem acesso aos tratamentos caríssimos?

Até agora tive dois doentes tratados lá. Ambos tinham seguros de saúde milionários, feitos no estrangeiro. É bizarro que nunca tenhamos sido convocados pela Fundação Champalimaud para discutir o assunto. E a Fundação veio buscar ao IPO o presente diretor clínico. Quer que lhe diga o que penso mesmo? Aquilo faz pena. Está deserto. Por isso eles dizem que têm um novo conceito: os doentes não têm uma sala de espera e entram diretamente para os gabinetes. Teriam de ter centenas de gabinetes e centenas de médicos. O terreno das instalações, à beira-mar, foi oferecido pelo Estado. Exatamente. A Fundação Champalimaud tem parque de estacionamento, muitos seguranças, jardins bonitos... Tem tudo menos o principal. Faz-me pena.

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