Há três meses recordei que o governo Barroso inventou e os governos Sócrates desenvolveram um expediente miraculoso para praticar preços políticos da electricidade, ao mesmo tempo que aparentemente liberalizavam o mercado. A coisa chama-se défice tarifário e corresponde à diferença entre os custos de produção e a facturação dos produtores. O milagre consiste em os produtores contabilizarem como rendimentos a facturação acrescida do défice tarifário e, consequentemente, os preços subsidiados não afectam os seus lucros e os consumidores ficam felizes porque pagam a electricidade abaixo do seu custo. Os produtores vão contabilizando no seu activo esses «défices tarifários» que no final são créditos sobre alguém que um dia vai pagar e podem titularizar esses créditos transferindo-os para um banco e recebendo-os o seu valor com um desconto.
É o paraíso em que toda a gente fica feliz: os produtores que não têm os seus lucros afectados, os consumidores que pagam a electricidade a custos subsidiados, os bancos que ganham umas comissões com a operação de titularização, e os governos que ganham uns votos (ou deixam de os perder) com este milagre.
Parece um daqueles truques dos consultores powerpoint que descrevem uma solução mirífica e no último slide aparece win-win. Neste caso, até seria mais do que win ao quadrado, seria win à quarta potência: win para os produtores, win para os consumidores, win para os bancos e win para os governos.»
Haverá algum perdedor esquecido no powerpoint? Há sim senhor. São vocês, os vossos filhos e quem sabe os vossos netos. Segundo as últimas contas, o défice tarifário vai em 2,7 mil milhões. Quando os vossos filhos e netos perceberem a pesada herança que lhes deixais, de que o défice tarifário é apenas mais uma parcela, irão tirar-vos dos asilos em largar-vos nos pinhais do interior.
Afinal, diferentemente do que pensava, nem toda a gente está feliz. Por exemplo António Mexia que lamenta estar «a financiar os consumidores» com o défice tarifário. É por esta e por outras que o homem merece a nossa admiração e o dinheiro que ganha.
Our Self: Um blogue desalinhado, desconforme, herético e heterodoxo. Em suma, fora do baralho e (im)pertinente.
Lema: A verdade é como o azeite, precisa de um pouco de vinagre.
Pensamento em curso: «Em Portugal, a liberdade é muito difícil, sobretudo porque não temos liberais. Temos libertinos, demagogos ou ultramontanos de todas as cores, mas pessoas que compreendam a dimensão profunda da liberdade já reparei que há muito poucas.» (António Alçada Baptista, em carta a Marcelo Caetano)
The Second Coming: «The best lack all conviction, while the worst; Are full of passionate intensity» (W. B. Yeats)
Lema: A verdade é como o azeite, precisa de um pouco de vinagre.
Pensamento em curso: «Em Portugal, a liberdade é muito difícil, sobretudo porque não temos liberais. Temos libertinos, demagogos ou ultramontanos de todas as cores, mas pessoas que compreendam a dimensão profunda da liberdade já reparei que há muito poucas.» (António Alçada Baptista, em carta a Marcelo Caetano)
The Second Coming: «The best lack all conviction, while the worst; Are full of passionate intensity» (W. B. Yeats)
12/03/2012
SERVIÇO PÚBLICO: o milagre do défice tarifário faz toda a gente feliz? (2)
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