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07/11/2016

Crónica da anunciada avaria irreparável da geringonça (56)

Outras avarias da geringonça.

Finalmente, na sexta-feira, com os votos de comunistas e bloquistas, o orçamento foi aprovado na generalidade, não obstante os inúmeros equívocos, quer por parte da geringonça, quer da oposição.

E aldrabices, como a de esconder a informação sobre a previsão da execução orçamental de 2016 para comparar com o OE 2017. Quando finalmente a informação ficou disponível, surgiram buracos, o que era aumento passou a redução, como o orçamento da Educação que foi cortado em 170 milhões, de onde um dos equívocos da oposição ao criticar o governo por gastar menos no próximo ano do que o governo «neoliberal» gastou em 2012, em vez de o criticar pela aldrabice ou criticar o factótum do PCP na Fenprof por ficar caladinho como um rato quando antes guinchava todos os dias.

E o que parecia bem ficou mal, como o desvio de 580 milhões da receita fiscal de 2016, dos quais 400 milhões de IVA - Centeno deve ter-se esquecido da redução do IVA da restauração...

E surgiram aldrabices como a de desconsiderar no orçamento do próximo ano 500 milhões de despesas cativadas em 2016 - parte será realizada e terá de ser paga em 2017, aumentando o défice em contas públicas. E confirmaram-se metas não cumpridas como a da redução do número de funcionários públicos que o governo enfiou no OE 2016 para calar Bruxelas, o que, segundo a UTAO, poderá resultar em suborçamentação das despesas com pessoal.

E revelaram-se derrapagens monumentais na despesa de 2016, como os 680 milhões de euros na Educação que é parte do custo que Mário Nogueira, o factótum do PCP e ministro de facto, impôs ao seu factótum Tiago Brandão Rodrigues.

E surgiram consequências indesejadas, como a suspensão do investimento de 40 milhões de euros da Coca Cola em resposta à fat tax, o imposto sobre as bebidas açucaradas, inventado pela geringonça

Concluo, por hoje, o folhetim orçamento com dois episódios freudianos. Um de Centeno durante a discussão no parlamento que, pretendendo negar a evidência de novos impostos, disse «read my lips: no new taxes», esquecendo que Bush senior também disse isso um tempo antes de aumentar os impostos. Outro, de comunistas e bloquistas que, ao mesmo tempo que juram estar na geringonça por amor ao povo, engoliram mais um sapo que sempre vomitaram no passado: a iniquidade de mais um perdão fiscal - um outro nome para prémio a evasão fiscal.

O outro folhetim a transmitir em todos os canais, o da Caixa, continuou à volta de questões menores, como a publicidade das declarações fiscais dos administradores e a remuneração de António Domingues. Nem o governo se questionou, nem a oposição questionou o governo, sobre o fundamento de a Caixa ser capitalizada em 5 mil milhões de euros. Por falar em Caixa, o financiamento de La Seda, um negócio promovido por José Sócrates e o seu ministro dos corninhos e executado pela dupla Santos Ferreira-Armando Vara, vai custar uns 900 milhões de euros. Desta vez será diferente, dirão pela enésima vez os defensores do banco público.

Seja por causa da capitalização da Caixa, seja para manter a tesouraria a flutuar, o governo chutou a antecipação do pagamento de 4 mil milhões de pagamento ao FMI para o fim da legislatura, ou para o próximo governo, com um custo bruto de 510 milhões e líquido de 126 milhões nas condições actuais de financiamento,

Ainda que isso não tenha que ser debitado à geringonça, a poupança das famílias continuou a cair desde 1995, em que atingiu 12,5% do rendimento disponível, descendo uma vez mais de 5,2% em 2014 para 4,4% em 2015,

Das catacumbas escuras e húmidas da geringonça voltou a emergir o monstro da dívida ou, mais precisamente, a transformação a dívida num calote, a que eufemisticamente chamam renegociação ou reestruturação. O compadre Jerónimo lamenta ter de pagar os juros e a comadre Catarina diz que tem de desatar o nó da dívida pública.

Para ir para a vida além do orçamento, vale a pena registar que Costa, talvez obnubilado pelos folhetins em que tem andado envolvido, se lembrou de anunciar que vai propor a Bruxelas a livre circulação de pessoas na CPLP. É um prodígio de realismo político e sentido de oportunidade, agora que a pressão dos refugiados e dos emigrantes está a deixar uma série de povos e governos à beira de um ataque de nervos.

1 comentário:

Unknown disse...

O perdão fiscal vai,segundo o Governo, valer 1,1MM€, ou seja 0,6% do PIB, isto é reconhecer que vai ser superior a 3% do PIB sem medidas On Off.A esperança do Governo e com o Brexit,eleições em França e Alemanha e a fragilidade dos governos Italiano e Espanhol, a UE simplesmente ignore este desvio.O mau e que basta uma brisa mais forte e vamos de novo ficar de braço estendido.O pior e que vamos ficar pelo menos um quarto de século a patinar...