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21/05/2020

De volta ao Covid-19. Colocando a ameaça em perspectiva (20) - Porque aumentou a taxa geral de mortalidade? (1)

Este post faz parte da série De volta ao Covid-19. Colocando a ameaça em perspectiva e é o primeiro de uma subsérie que pretende verificar o aparente aumento da mortalidade coexistindo com os óbitos atribuídos ao Covid-19 e as suas possíveis causas.

Um pouco por todo o lado, assiste-se a um "excesso" de mortalidade superior ao das mortes pela pandemia, proporcionando um argumento aos adeptos do catastrofismo para tentarem concluir que nem todas as mortes pela pandemia estariam a ser identificadas. Ora, a evidência mostra precisamente o contrário: às mortes "por" Covid-19 estão a ser adicionadas as mortes "com" Covid-19, independentemente da pandemia não ser a "causa adequada" do óbito, para usar um conceito jurídico.

O que explicará então esse excesso? Várias razões, entre elas o stress causado pelo confinamento, sobretudo nos idosos, e o adiamento de consultas e cirurgias, quer devido à insuficiência de recursos disponíveis mobilizados para o tratamento da pandemia, quer devido ao receio dos pacientes de serem infectados ao comparecer num hospital.

O quadro seguinte mostra que uma proporção elevada das cirurgias em todo o mundo foram canceladas, mesmo nos casos de cancro, e até mais de 20% das cesarianas foram canceladas.

Fonte

O mapa seguinte mostra, no caso particular do cancro, que proporções significativas das cirurgias foram canceladas por todo o mundo e sobretudo nos países em desenvolvimento.

Fonte

Foi estimado em 28 milhões o número de total de cirurgias que foram ou serão adiadas (ver este paper), entre as quais mais de 2 milhões relacionadas com cancros. Estima-se que o adiamento de 3 meses afectando 95 mil pacientes conduzirá a cerca de 4.800 mortes (fonte).

Também em Portugal esse adiamento se verificou com a queda de 40% nas cirurgias em Março (em Abril terá sido necessariamente muito maior) e o excesso de mortes foi estimado em três a cinco vezes superior à atribuída ao Covid-19, sendo uma parte significativa causada pelo adiamentos de cuidados de saúde (Acta Médica Portuguesa).

Um parêntesis neste tema para citar mais um estudo em complemento do post Qual é afinal a taxa de letalidade do Covid-19? (3): segundo um paper do prof. John P.A. Ioannidis da Universidade de Stanford, publicado há dois dias e baseado em doze estudos com dados considerados utilizáveis, as taxas de letalidade variaram entre 0,02% e 0,40%, ou seja, mais uma vez, num intervalo semelhante ao da gripe comum.

(Continua)

1 comentário:

Nelson Gonçalves disse...

Cuidado com o estudo do Ioannidis: https://arstechnica.com/science/2020/04/experts-demolish-studies-suggesting-covid-19-is-no-worse-than-flu/