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23/05/2017

Crónica da anunciada avaria irreparável da geringonça (84)

Outras avarias da geringonça.

Até um dos mais contumazes adeptos da geringonça concedeu que o tão celebrado crescimento da economia de 2,8% no 1.º trimestre ficou a dever-se às exportações e ao investimento e não à receita da Mouse School of Economics que faria o crescimento brotar do consumo resultante do aumento do rendimento pelas políticas de reversão. Também é prudente lembrar que a última vez que a economia cresceu num trimestre 2,8% foi em 2007, era governo o animal feroz, e nos trimestre seguintes a coisa foi minguando, voltou a crescer quase a esse nível em 2010 um pouco antes da bancarrota no 2.º trimestre de 2011.

Ainda que o investimento tenha tipo um papel no crescimento do 1.º trimestre devemos saber que, segundo dados do Eurostat (citados aqui), o investimento total em 2016 em Portugal foi o mais baixo da UE com excepção da Grécia e em 20 anos caiu mais de 10% em percentagem do PIB, tendo sido o quarto com maior descida. Não deveria surpreender ninguém que o mais elevado índice de investimento em 2016 seja o da Irlanda onde o investimento nos últimos 20 anos foi o segundo que mais cresceu.


Jornal Eco
É igualmente prudente lembrar que os custos do trabalho tiveram um aumento homólogo de 2,6% (resultante de 3% de aumento dos custos salariais e 1,4% dos outros custos), e o número de horas trabalhadas diminuiu 1,5% na administração pública e 2,9% no sector privado, apesar de o emprego ter aumentado em ambos. (fonte) Imagine-se o que terá acontecido à produtividade e é sábio não esquecer que sem aumento da produtividade não há aumento da riqueza.

Não haver aumento de riqueza não é uma razão para não haver aumento de consumo graças ao milagre da multiplicação do crédito a particulares que continua a aumentar atingindo 1,5 mil milhões de euros no 1.º trimestre, dos quais cerca de 600 milhões para compra de habitação, um aumento de 20% em relação ao ano passado. É claro que se o crédito às famílias aumenta não se pode esperar que a poupança aumente nem que aumentem as novas aplicações em depósitos bancários que, desde um máximo em 2013, diminuíram uma vez mais no 1.º trimestre secando o funding dos bancos.

Não obstante toda a conversa fiada sobre a redução do horário para 35 horas dos utentes da vaca marsupial pública, aí está o aumento de quase 7 mil novos utentes no 1.º trimestre (mais de 4 mil novos jobs for the boys só na administração central). Uma boa parte desses novos utentes foi para o ministério da Educação onde fazem imensa falta dada a queda do número de alunos e o fecho de mais de 5 mil escolas primárias nos últimos 15 anos.

As contratações de professores não foram suficientes para deixar feliz o ministro de facto Nogueira da Fenprof que mandou os camaradas pendurar as bengalas em frente do ministério, deixando o ministro factótum a borrar-se de medo à janela do seu gabinete, para exigir a aposentação aos 36 anos de serviço. Ainda assim, o camarada Nogueira revela bastante moderação ou teria exigido a reforma aos 53 anos como as cabeleiras e massagistas gregas cujas profissões eram consideradas «árduas e insalubres».

No que respeita à execução orçamental este governo herdou o know-how socialista de trafulhice contabilística e acrescentou inovação. A dar crédito à newletter do PSD (admitamos que tem algum para este efeito), para além das cativações e de outros expedientes, Centeno acrescentou o uso de fundos comunitários para pagar despesa corrente.

Assim, a melhoria das contas públicas fica dependente da cosmética e dos efeitos nas exportações de uma antecipada melhoria da economia europeia e internacional, Quanto à cosmética são conhecidos os resultados das sucessivas camadas de creme que quando estalam trazem agarrada uma nova bancarrota, aqui como na Grécia e em todo o lado.

Não obstante, a falta de razões para celebrar, é cada vez mais difícil encontrar gente ou instituição que digam que o rei está em cuecas. O Conselho das Finanças Públicas (CFP) é uma delas e por isso merece o devido castigo com a recusa do governo nomear os novos membros propostos. Faz o governo muito bem e deveria nomear quem o faça feliz e não gente como Teodora Cardoso que, apesar dos seus pergaminhos socialistas, insiste em dizer coisas desagradáveis ao Costa, como na análise de PEC onde concluiu que só um terço das reduções de despesa estão fundamentados, mais de quatro quintos resultam da ganhos de eficiências que ninguém conhece e a trajectória de consolidação «não se encontra suficientemente sustentada na evolução macroeconómica e nas medidas de política orçamental». Em conclusão, como titulou com bastante oportunidade o jornal Eco, «a acreditar em Costa basta ficar quieto para eliminar o défice em 2021»

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