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17/12/2018

Crónica da avaria que a geringonça está a infligir ao País (166)

Outras avarias da geringonça e do país.

Num país normal seria insólito. Em Portugal, um país insólito, é normal as conclusões de uma auditoria à Caixa terminada o ano passado que identificam inúmeras operações ruinosas de crédito às empresas do complexo político-empresarial socialista, sobretudo no período entre 2005 e 2008, quando por lá passaram Santos Ferreira e Armando Vara, uns figurões nomeados pelo governo socialista de José Sócrates, serem reveladas no seu púlpito na SIC por um político disfarçado de comentador (outra luso-especialidade), por sinal sucessor de um outro político disfarçado de comentador, agora residente no palácio de Belém.

Se não é justiça de causas, bem parece a decisão do Tribunal Constitucional que arquivou o processo contra o amigo Siza Vieira, pela incompatibilidade de ser ministro e sócio-gerente de uma imobiliária, com o fundamento de «ser um cargo que já não ocupa». Isto é, a criatura que era ministro-adjunto do primeiro-ministro passou a ser ministro da Economia e... ministro-adjunto do primeiro-ministro.

Esta semana, sobre greves só vou citar um facto: até ao fim do ano há 47 pré-avisos de greve. E retirar duas conclusões: (1) se não faleceu, a tão celebrada paz social está moribunda, até ver; e (2) a tão celebrada habilidade de Costa, que consiste em chutar problemas para a frente, abriu uma caixa de Pandora (nome muito adequado, já que em grego antigo significa «a que dá tudo»), de onde já saíram legiões de corporações a exigir uma fatia maior na mesa do orçamento e hão-de sair as restantes até às eleições.

Na crónica da semana passada citei o episódio do coelho que Costa tirou da cartola para inchar o orçamento da Cultura transferindo para o respectivo ministério 244 milhões da RTP. Reincido apenas para recomendar a leitura deste artigo de Alexandre Homem Cristo que relata em pormenor a manobra.

Continuando a citar, desta vez um post cá da casa sobre as novas páginas que Costa abriu depois de ter virado a página da austeridade, páginas que consistem no aumento da carga fiscal e na queda do PIB per capita expresso em paridade de poder de compra, que desceu o ano passado 0,8 pontos percentuais para 76,6% da média da UE28.

Voltando à vaca fria da dívida - uma das vacas de Costa que não voam - desta vez não cito mas encaminho para o «Retrato de uma dívida ainda demasiado alta» de Helena Garrido que mostra bem o grau de entalanço em que nos encontramos, sobretudo no que respeita a dívida pública que aumentou 53 pontos percentuais entre 2008 e 2017. Sendo certo que as dívidas das empresas e das famílias diminuíram no mesmo período 14 e 20 pontos percentuais, respectivamente, continuamos num território extremamente perigoso onde nos afundaremos à primeira crise.

Se não fossem os ciúmes dos berloquistas não teríamos ficado a saber que o parlamento alemão está melhor informado sobre as condições (e até as votou) para o pagamento antecipado ao FMI da dívida portuguesa do que o parlamento português, a quem Costa e o Ronaldo das Finanças não se dignaram dar troco.

Sobre a opacidade do governo a este respeito e sobre o que ela esconde, recomendo a leitura deste artigo de Ricardo Cabral, onde também se refere «a decisão de emitir dívida a cinco anos em moeda chinesa (“pandabonds”) a uma taxa de juro que provavelmente será próxima de 5%». A decisão de pagar uma taxa mais do dobro da actual para o mesmo prazo terá um racional, mas o Ronaldo não se dignou explicar-nos qual.

E o que não foi informado inclui compromissos quanto ao prazo médio da dívida e à manutenção de almofada financeira correspondente a pelo menos 40% das necessidades de financiamento dos 12 meses seguintes. Compromissos que resultam da falta de confiança na magia financeira do Ronaldo, obrigando-o a não emitir dívida a curto-prazo para tapar buracos e baixar artificialmente os juros e a manter uma liquidez adequada - note-se foi exactamente isso que não aconteceu nos últimos tempos do governo Sócrates em que o agora muito celebrado ministro das Finanças Teixeira dos Santos emitia dívida todos os meses a curtíssimo prazo e chegou às vésperas do resgate sem dinheiro até para pagar aos funcionários públicos.

Não deixa de ter piada no país que tem o segundo rácio investimento público/PIB mais baixo do UE28, o ministro da Energia e da Transição Energética (como alguém escreveu, é um nome que é todo um programa) perorar sobre o investimento anual que «deverá aumentar de 30 para 2 mil milhões de euros, para tornar o país neutro nas emissões de dióxido de carbono até 2050».

No que toca às perspectiva de crescimento de uma economia que tem sido puxada pela procura externa e em particular pelo turismo, convirá saber quanto à primeira que a economia europeia continuou a desacelerar no 3.º trimestre e o FMI pela boca do director-geral adjunto David Lipton avisa-nos «vejo uma tempestade a formar-se nos céus e receio que o trabalho na prevenção de crises esteja incompleto». Quanto ao turismo há sinais que pode esmorecer também por causa do Brexit e das suas incertezas - até Outubro o número de dormidas desceu 0,5%.

O que não esmorece é o novo crédito ao consumo que subiu 14% até Outubro para 3,9 mil milhões de euros. Não espanta que, segundo o INE, nos três meses terminados em Outubro as exportações tenham subido 1,4 pontos percentuais abaixo das importações e em relação a Outubro de 2017 o défice da balança comercial tenha aumentado 39 milhões.

Por falta de tempo (e de espaço) não vou tratar da proposta de revisão da lei de bases que já foi apresentada ao parlamento e que tudo indica visa engrossar a clientela eleitoral da geringonça, engordando em efectivos do SNS e limitando o papel das empresas privadas de saúde mesmo quando, como é o caso do Hospital de Braga, entre outros, apresentam comprovadamente uma melhor qualidade com custos menores.

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