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17/07/2017

Crónica da anunciada avaria irreparável da geringonça (92)

Outras avarias da geringonça.

Uma vez ou outra Costa deixa cair a máscara e deixa ver os seus tiques autocráticos, como a semana passada em que ameaçou veladamente a Altice e, assumindo a sua faceta de tele-evangelista, anunciou que já tinha feito a sua escolha do operador, não sem antes com um enorme descaro classificar de «irresponsável» a privatização da PT começada e acabada por governos do PS em que participou.

Depois de ter garantido que a solução para os «lesados do BES» do amigo Lacerda Machado não teria custos para os contribuintes, a semana passada o governo acabou a admitir o que antes tinha negado. Por falar em sem custos, já repararam que um dos milagres favoritos do socialismo indígena é criar soluções que não são pagas pelos que dela beneficiam mas por outros? Lembram-se como começaram e acabaram as SCUT?

Um exemplo de manobrismo que ameaça ser um tiro no pé é o caso da candidatura à Agência Europeia do Medicamento. Depois de um processo vergonhoso em que foi defendida a localização em Lisboa (por razões óbvias de dourar o brasão ao sucessor na câmara) e acabou no Porto, talvez porque pode ter-se percebido que a agência iria provavelmente parar a Lille, pelo que propor Lisboa ou Porto seria igual ao litro. Em qualquer caso, um inquérito aos 900 funcionários da Agência mostrou ser Lisboa a cidade preferida.

Incompreensivelmente, os enfermeiros parecem não se ter apercebido do fim da austeridade e do novo ambiente de afectos e continuam a seguir o conselho do antigo primeiro-ministro neoliberal, saindo da zona de conforto para longe das suas mãezinhas e tentando emigrar para o Reino Unido. Enquanto isso, os enfermeiros de obstetrícia que ficam por cá dedicam-se aos «protestos de zelo».

Falando de greves, o pessoal de limpeza do aeroporto do Porto que trabalha para a Euromex, uma empresa privada, fez uma greve contra o «assédio moral e sexual». Pelo menos o leitmotiv é original (por agora).

O crédito às famílias atingiu em Maio 1.265 milhões de euros, dos quais dos quais 728 milhões de euros (58%) para aquisição de habitação, o valor mais elevado desde Dezembro de 2010, a quatro meses do resgate. Não sei se isto tem algum significado para além de comprovar o desvelo que os patrícios têm com as suas casinhas.

À medida que vão emergindo números das fossas abissais da gestão orçamental socialista vão-se tornando mais visíveis os malabarismos do Ronaldo das Finanças e do seu treinador Costa. O investimento público (FBCF) cresceu no 1.º trimestre 10,3% comparativamente com 1.º trimestre de 2016, um ano em que desceu para 1,5% do PIB, abaixo da austeridade neoliberal. Mas o aumento de 10,3% é um quinto do crescimento orçamentado (49,2%). Em conclusão: mais uma vítima das cativações. Entenda-se que não se dá porrada na geringonça por diminuir a despesa pública, como alguns comentadores do regime insinuam que passa pelas meninges dos críticos das cativações. Dá-se porrada porque o governo está a cortar no investimento mínimo indispensável para manter a operacionalidade da administração pública, ao mesmo tempo que aumenta a mesada da sua clientela eleitoral de funcionários públicos.

Falando de cativações, até Manuela Arcanjo, uma socialista ex-secretária de Estado do Orçamento do PS considera o expediente preferido do Ronaldo das Finanças, demasiada «densidade dessa cativação» (deste governo e dos últimos governos, acrescenta). Entenda-se também que não se dá porrada na geringonça por fazer cativação em abstracto mas por estas cativações não serem um instrumento de gestão orçamental, mas antes um expediente para fazer passar o pseudo-fim da austeridade perante os parceiros da geringonça e uma opinião pública ignara formatada pelos mídia arregimentados.

Outro número que emergiu pela mão da UTAO: o impacto negativo da reavaliação de activos das empresas nas contas públicas a partir 2019 e durante 8 anos absorverá todo o encaixe da receita fiscal de 2016 a 2018 e terá um saldo negativo de 242 milhões de euros. Dito de outra maneira, para ajudar ao milagre de 2016 e aos de 2017 e 2018, o governo da geringonça empurra com a barriga para a frente 242 milhões a menos nos orçamentos para quem vier a seguir. Feitas as contas pela UTAO, é como se o Estado se financiasse junto das empresas a uma taxa de juro de 15%. Percebe-se assim o desconforto de Costa com estes organismos independentes (UTAO e CFP) e antecipa-se o esforço que fará para os anular ou encher de apparatchiks. Enquanto não puder fazê-lo, boicota a informação, como no caso do Instituto de Informática da Segurança Social que não está a prestar a informação prevista na lei ao CFP - CFP outra borbulha no rabo de Costa.

Já aqui evocámos o caminho que a balança comercial está a percorrer, falta acrescentar que o défice comercial até Maio é o quarto maior da Zona Euro. Não se estranha que ninguém no governo tenha reparado. Afinal eles especializaram-se em boas notícias e quando há más vão de férias.

O investimento captado pelos vistos gold subiu 17% no primeiro semestre depois de ter caído o ano passado. Convirá não esquecer que este investimento consiste essencialmente em transferências para compra de imobiliário: desde Outubro de 2012 até Junho deste ano entrou um total de 3,16 mil milhões de euros dos quais mais de 90% para compra de imóveis. É como a família falida a vender as pratas aos novos-ricos e lembremos o que faziam as famílias falidas com esse dinheiro. Vem a propósito citar a estimativa de João Duque no Expresso do montante pantagruélico da venda de activos a estrangeiros desde 2009: 14 mil milhões de euros! Lembram-se da saga da defesa dos centros de decisão nacional que acabou com muitos dos seus promotores a venderem empresas à estranja?

A espoliação fiscal continuou a aumentar em 2016 (sobretudo por via dos impostos indirectos), como se pode ver no diagrama seguinte (via Insurgente) que mostra a evolução dos impostos per capita.

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Quem pensar que a espoliação fiscal vai aliviar, é melhor pensar duas vezes. Primeiro, porque o expediente das cativações será cada vez mais difícil sem paralisar o que resta da capacidade da administração pública. Segundo, porque a dívida pública continuará a aumentar porque, ainda que os défices contabilísticos possam ser ligeiramente inferiores ao crescimento nominal do PIB, os défices reais incluirão as despesas one-off, como a capitalização da Caixa que não contará para défice de 2017 (recorde-se que Costa incluiu no défice de 2015 as perdas com a venda do Banif ao Santander decidida num fim de semana). Terceiro, porque ainda estamos no princípio dos one-off  - Paulo Macedo já avisou «todos os bancos vão precisar de mais capital daqui a seis meses» (o todos neste contexto é uma figura de retórica e significa a Caixa) e podem ser necessários mais 270 milhões na TAP. Quarto, porque os yields da dívida pública irão gradualmente aumentar, acompanhando a tendência geral, e a compra de dívida pelo BCE cessará a breve prazo. (Ler a respeito do previsível aumento da dívida pública este artigo de André Abrantes Amaral)

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