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20/03/2024

Não sei se o Chega vai ou não desaparecer como o PRD... ou como a APU

Concordei que o Chega não desaparecerá como um PRD que surgiu em 1985 na política portuguesa como um meteoro, elegeu 45 deputados os quais dois anos depois na eleição seguinte, resultante da moção de censura apresentada pelo PRD, se reduziram a 7 e desapareceram na eleição de 1991.

Também escrevi que o Chega, como qualquer outro partido, poderá desaparecer quando as suas causas se esvaziarem. Quando? Não sabemos, mas se o que se está a passar com o poder local for um indicativo não precisaremos de esperar décadas. Nas eleições autárquicas de 2021 o Chega elegeu 19 vereadores dos quais já perdeu metade e 173 deputados municipais dos quais perdeu dezenas, segundo as contas do JN.

Também não devemos esquecer que a APU, coligação do PCP com o MDP/CDE, obteve 18% dos votos dos descontentes nas eleições de 1983 elegendo 40 deputados. Nas eleições seguintes a CDU caiu para 12,4% e 31, nas eleições de 1995 obteve 8,6% e 15, em 2002 6,9% e 12, resultados que com algumas oscilações foi mantendo até que nas duas últimas obteve 4,3% e 6 (em 2022), 3,3% e 4 (em 2024).

A história não se repete, dizem uns, ou repete-se passando de tragédia a farsa, dizem outros, e o Chega nada tem a ver com as coligações do PCP, dirão os simpatizantes do Chega e os comunistas concordarão. Ainda assim, uma observação clínica leva a concluir que têm em comum serem partidos que vivem do descontentamento e propõem soluções salvíficas inconciliáveis entre si e geralmente inaceitáveis pelas maiorias de eleitores, excepto em situações de rupturas sociais extremas. Soluções salvíficas inspiradas no pensamento milagroso (mais uma característica comum com a extrema-esquerda) que as torna quase sempre inviáveis, como por exemplo que seria possível financiar o aumento das pensões com 80 mil milhões de euros obtidos da economia "paralela" (o autor do estudo da FEP que estimou esse número considera que em termos práticos não seria possível aumentar a receita fiscal em mais de 2 mil milhões por ano).

Escrito isto, deveria ser evidente que não se podem desprezar ou mesmo minimizar o milhão de votos do Chega, a maioria deles provenientes de outros partidos, incluindo um número significativo do PCP, do mesmo modo que não se deviam ignorar o milhão de 1983 da APU ou os actuais 675 mil de 2024 da extrema esquerda. É menos evidente se as diferenças ideológicas, programáticas e de estilo permitirão um governo viável com a participação do aparelho do Chega, sendo certo que sempre serão possíveis entendimentos sobre acções ou medidas concretas. Escrevi "aparelho do Chega" porque uma coisa são os eleitores e outra o partido que não é proprietário dos seus eleitores, coisa que os dirigentes do Chega já perceberam que se aplica aos outros partidos mas ainda não entenderam que também se aplica a eles próprios.

1 comentário:

Anónimo disse...

As cartas foram distribuídas. Os jogadores têm 4 anos para mostrar o jogo.