Continuação de (1), (2), (3), (4), (5) e (6)
Lendo «O Fundo da Gaveta» de Vasco Pulido Valente, dei comigo a pensar que, mudando a época, as modas e os protagonistas, o Portugal do século XIX me faz lembrar o Portugal da III República. Nos posts desta série cito algumas passagens que mais intensamente evocam essa ideia.
As reformas e os interesses
As reformas de Viseu e Sá foram mal recebidas até pelo
seu campo. Os funcionários ameaçados ou prejudicados, especialmente os
engenheiros, reuniram-se, associaram- se, protestaram. A opinião progressista
mudou pouco a pouco de tom. Deixou de clamar, em abstracto, contra o simples
excesso de funcionários e dirigiu as suas imprecações unicamente às prebendas,
sinecuras e acumulações. Depressa acusava o Governo do mesmo erro de Ávila, o
de «não distribuir igualmente os sacrifícios», esquecendo os «poderosos» e
trazendo «lágrimas» aos «humildes». Em Setembro, já declarava, sem disfarce,
que não existia excesso de funcionários, enquanto o Estado central se não
libertasse das suas «vastíssimas» e «complicadas» funções. No ministério do
Reino, por exemplo, quatro escreventes ocupavam-se a conceder licenças para
«touradas, exposições de cabeças falantes e mulheres gordas ou magras»; como
dispensá-los? Daqui se seguia que os esforços de Viseu e de Sá poupariam, na
melhor das hipóteses, algumas dezenas ou centenas de contos, mas não desatariam
o «nó», que «apertava» o país. Isto punha uma descentralização mítica como
condição prévia a qualquer reforma da burocracia do Estado e, como se admitia,
acessoriamente, que um Estado descentralizado não seria por força mais barato,
negava os fundamentos do programa radical.
De volta ao défice, como sempre…
Na prática, esse programa já falhara. Em Outubro, o
Governo encontrava-se perante as soluções tradicionais para financiar o défice
e satisfazer os encargos da dívida: contrair mais um empréstimo; subir os
impostos; aumentar a circulação fiduciária.
(…)
… e ao aumento dos impostos
A Câmara dos Deputados aprovou a Loulé parte dos aumentos
de impostos que recusara a Samodães, incluindo o de 20% da contribuição
predial. Votou igualmente uma nova lei de desamortização e o acordo final com a
companhia de Caminhos de Ferro de Sul e Sueste, para fortalecer o crédito
externo. Como de costume, os ministros anunciaram dezenas de reformas dos
serviços, destinadas a diminuir a despesa do Estado.
[Do capítulo Ressurreição e morte do radicalismo (1864-1870)]
(Termina aqui esta série)
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