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30/04/2018

Crónica da anunciada avaria irreparável da geringonça (133)

Outras avarias da geringonça.

Abro a crónica desta semana com um delírio de grandeza da secretária de Estado da Modernização Administrativa, Graça Fonseca, cujo maior feito até à data foi ter partilhado connosco uma informação irrelevante para a governação do país. Agora partilhou connosco outra informação, se possível ainda mais irrelevante, e disse em entrevista que «nos 5 milhões de euros do Orçamento do Estado para propostas dos cidadãos (uma construção de marketing chamada Orçamento Participativo Português) nem o ministro das Finanças pode tocar».

Em resumo, fazendo as contas aos 83 mil milhões da despesa orçamentada, temos a seguinte repartição entre governantes que podem tocar no orçamento:

Graça Fonseca 5/83.000 = 0,006% / Ronaldo das Finanças 82.995/83.000 = 99,994%

Tratemos brevemente da «contra-reforma da habitação» como lhe chamou António Costa, não o padrinho da reforma mas o jornalista com o mesmo nome. É um tema a que voltarei quando tiver tempo. Por agora, saliento apenas as consequências imprevistas e certamente indesejadas de algumas das principais medidas. Começo pelo delírio burocrático que é imaginar o governo a colocar no mercado dez mil habitações em tempo útil e a custos comparáveis aos dos mercado - no final podemos esperar que, uma vez mais, os contribuintes paguem a factura da ineficácia e ineficiência da máquina administrativa.

Prolongar a manutenção dos contratos congelados é como prolongar para esses contratos o regime de arrendamento republicano de 1919 - que o salazarismo manteve - responsável pela degradação dos centros urbanos e o êxodo para a periferia. Os constrangimentos contratuais aos inquilinos com mais de 65 anos irão levar compreensivelmente os senhorios a evitarem esses arrendamentos. Pelo lado dos incentivos aos senhorios as fantasias não são menores - alguém acredita que um senhorio se disponha a alugar por metade do preço de mercado dos novos arrendamentos para ter uma redução de 14% do IRS, como resulta das estimativas que foram publicadas relativamente ao desconto de 20% sobre a mediana das rendas no local?

Talvez o único incentivo que resulte seja o tiro no pé do fisco que reduz a metade o IRS para os arrendamentos superiores a dez anos com um ganho imediato para o senhorio que não garante que o prazo venha a ser cumprido. De facto, nada obriga o inquilino a cumprir o prazo e pode até incentivar o senhorio a propor um contrato a dez anos a inquilinos que só pretendem um arrendamento de curto prazo.

Voltando à vaca fria do défice, as celebrações estão a revelar-se demasiado exageradas. O défice de 2017 foi o segundo mais elevado da UE e mesmo sem a recapitalização da Caixa seria o décimo mais elevado.

Défices 2017
Dirão os opinion dealers que em 2018 as coisas continuam a melhorar e que no primeiro trimestre o défice desceu. Sim, desceu a insignificância de 14 milhões, a despesa aumentou 3,5% (quase um ponto percentual acima do crescimento da economia) e o défice só desceu porque a receita aumentou 3,5% incluindo um aumento de 8% do IVA (bendito consumo) e de 6,6% das contribuição para a Segurança Social (bendita redução do desemprego). Como a despesa é quase toda estrutural e a receita em grande parte conjuntural, se a economia desacelerar e, se há coisas certas na vida é que desacelerá mais cedo do que tarde, as receitas fiscais cairão e o défice voltará ao costume.

Ainda poderia haver a desculpa de a despesa ter aumentado 3,5% devido ao investimento público, mas acontece que o investimento orçamentado é de apenas 2,3% do PIB, ou seja o terceiro mais baixo dos 23 países que comunicaram a Bruxelas. E estamos a falar do orçamentado, porque o executado com as cativações do costume poderá ainda ser menor.

Quanto à dívida pública em 2017, a terceira mais elevada, ainda há menos razões para celebração.

Dívida pública 2017
E em relação a 2018 nem os opinion dealers poderão dizer que em 2018 as coisas continuam a melhorar porque no final do 1.º trimestre a dívida pública atingiu 241,1 mil milhões (124,9% do PIB) tendo aumentado 0,4% em relação 1.º trimestre de 2017.

Onde as coisas indubitavelmente melhoram é no crédito ao consumo onde a banca antecipa a aceleração da procura de crédito. E onde atingem o paraíso é no crédito automóvel cujo stock de dívida subiu 20% em 2017 e, citando o que um concessionário disse ao Observador neste inquérito, «é aquilo que quiser: crédito, ALD, ‘leasing’, ‘renting’? No crédito, pode ser até 100%. Pode ser até 120 meses, 10 anos. Taxa fixa ou variável. É o que quiser. Consigo fazer tudo».

Em consequência, no trimestre terminado em Fevereiro de 2018 as importações de automóveis de passageiros, de peças e acessórios e de outros bens de consumo duradouros e semi-duradouros atingiram no total 3.871 milhões, e poderão atingir este ano uns 15 mil milhões, ou mais de 7,5% do PIB. Já vimos este filme no passado e não acabou bem.

4 comentários:

Anónimo disse...

Quem for Caetano é descendente de indiano

Unknown disse...

Evocação involuntária do grande Vasco...mas esta avariada sexual é fonseca...

Anónimo disse...

Vá ver o seu nome completo

Pertinente disse...

Corrigido o lapso freudiano de Graça "Moura" em vez de Graça Fonseca para designar uma criatura cujo nome completo é Graça Maria Fonseca Caetano Gonçalves e que deixou cair o "Caetano" e o "Gonçalves" sabe-se lá porquê.