«Sucede que a evolução de uma guerra não determina apenas previsões e análises. Afecta também algo de mais fundamental: as visões do mundo. A derrota da Alemanha e da Itália em 1945 não acabou com os fascistas, nem o descalabro da União Soviética em 1991 acabou com os comunistas, mas depois dessas duas datas passou a haver respectivamente muito menos fascistas e muito menos comunistas. Para muita gente, como memoravelmente notou H. L. Mencken, as manifestações de poder são sempre mais persuasivas do que quaisquer argumentos. Por isso, as guerras foram um ponto final de muitos debates ideológicos: quem ganha, e enquanto ganha, passa a ter razão. (...)
É por isso que na Ucrânia está mais em causa do que a integração europeia ou a política energética alemã. Está em causa tudo isso, sem dúvida, mas estão também em causa as nossas preferências políticas e ideológicas. A ditadura neo-soviética de Vladimir Putin pretende ser uma alternativa existencial ao Ocidente, como foi a velha União Soviética. É quase certo que usaria uma vitória na Ucrânia para demonstrar que o é. E há já quem esteja preparado para nesse caso descobrir virtudes às suas ideias e métodos. Na Europa, comunistas e esquerdas anti-capitalistas mal disfarçam, atrás de uma cínica condenação genérica da guerra, a sua simpatia por um ditador determinado a abalar a ordem internacional em que estão ancoradas as democracias liberais e as economias de mercado. Nos EUA, algum conservadorismo, descrente em relação à possibilidade de fazer valer os seus valores através do debate, parece fascinado por um “regime forte” supostamente decidido a pôr termo à “decadência moral”. Se Putin ganhasse na Ucrânia, uns convencer-se-iam de que as democracias estão vulneráveis, e outros de que as ditaduras são muito mais eficazes. O neo-sovietismo de Putin, alinhado com o comunismo chinês, poderia aspirar a ser moda. Talvez a próxima década de 30 lembrasse os anos 30 do século passado.
Os soldados da Ucrânia estão a decidir, não só por onde vão passar as fronteiras, mas o que muita gente, sempre susceptível às causas bafejadas pelo sucesso, vai pensar amanhã. Esperemos que os factos ajudem as boas opiniões. Como dizia o general MacArthur, nada substitui a vitória.»
As nossas opiniões decidem-se na Ucrânia, Rui Ramos no Observador
5 comentários:
Continuais a ser um dos meus preferidos sites.
Agora com muitas notas de humor.
Abraço
Este anti-comunista "primário, secundário e universitário" ( desculpas elo plágio ), acha, usando a linguagem anglo-saxónica, que R.R. "should (must? ) know better"...
Faz bem, o sr Ramos. Dá sempre jeito alguém que combata o nazismo e o fassismo. E, já agora, o comunismo, o neo-comunismo e "um certo conservadorismo", que não aceita fraudes eleitorais e perseguições políticas.
O mundo precisa de ser higienizado. Não pode haver espaço para divergências.
Com pessoas como o sr Rui Ramos a vigiar, durmo mais descansado. Posso dedicar-me 100% a lutar contra o racismo, as alterações climáticas, a homofobia, a transfobia e contra o Trump e o Bolsonaro.
Venceremos, camaradas.
O governador Ronaldo dos Santos enviou 50 coitadinhos para a Vinha da Marta e parece que os Obamas, amigos do pobres e dos imigrantes, ficaram em polvorosa.
Dos Santos vai ganhar as primárias pela certa, para desgosto do sr Ramos.
O grande historiador da classe sinistra, pode ir limpar as mãos à parede.
Abraço
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