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16/08/2011

DIÁRIO DE BORDO: A Clockwork Orange, Gilda e o banditismo à luz do cinema

Comentando o banditismo dos jovens ingleses que vandalizaram Londres e outras cidades inglesas, Filomena Mónica evocou há dias na SIC «A Clockwork Orange», o romance de Burgess (não li) e o filme nele inspirado de Kubrick (vi duas vezes). Pareceu-me uma evocação com bastante sentido no que respeita à falta de propósito e ao grau de violência, mas sem nenhum sentido no que respeita à resposta das autoridades inglesas que não aplicaram a Ludovico's Technique. De facto, que se saiba, estas ainda não pensam usar uma terapia baseada em drogas para gerar a aversão à violência. Poderão não estar longe de recorrer a essa terapia, se não fizerem algumas reformas indispensáveis. E não, não se trata de mais subsídios ou mesmo de medidas para reduzir o desemprego.

Vou passar em revista alguns comentários e análises que mais me impressionaram, por boas e más razões, a respeito de certos aspectos do banditismo, das suas presumíveis causas e das reacções geradas.

O jornalista Ed West assimilou no Telegraph a reacção de medo da sociedade a esses jovens bandidos à síndrome de Estocolmo e considera que muitos jovens professores responsabilizam as instituições e as autoridades pelo comportamento marginal dos seus alunos por razões que, no entender de West, radicam no medo físico de serem eles próprios vítimas da sua violência.

Katharine Birbalsingh, uma professora que tem denunciado o sistema da chamada «comprehensive school» construído pelo Partido Trabalhista, salienta o papel da tolerância da escola, dos professores e de vários sectores da sociedade aos comportamentos que não deveriam ser tolerados em nenhuma circunstância.

Theodore Dalrymple, médico e antigo comentador de The Spectator e durante anos traduzido no Independente, caracterizou os tumultos como «a backhanded tribute to the long-term intellectual torpor, moral cowardice, incompetence and careerist opportunism of the British political and intellectual class».

David Lammy, deputado do partido Trabalhista por Tottenham, bairro onde tudo começou, considera ter sido a «ausência de pais», fruto da decomposição da família (ela própria vítima da intervenção do nanny state, acrescento) e a consequente falta de modelos comportamentais positivos, um factor decisivo para despoletar os comportamentos irresponsáveis e criminosos dos jovens bandidos.

Porém, a mais impressionante de todas as reacções foi sem dúvida a de uma criatura que escreve no blogue 5 dias (não frequento por razões sanitárias – cheguei lá via Insurgente) exortando à insurreição não sei quem (o proletariado? o povo? as massas? os estudantes pobres? os marginais? a esquerda radical chic?). O título é todo um programa: «Transformemos Portugal numa nova Inglaterra». É nestas alturas que o berloquismo, à míngua de causas fracturantes, como o aborto como método anticoncepcional, o casamento gay, o divórcio na hora, revela distraidamente a sua verdadeira natureza, em geral dissimulada para não espantar os papalvos.

Termino, como comecei - com o bom cinema. Entre nós, Helena Matos denunciou com humor os delírios irresponsabilizantes da esquerdalhada e do jornalismo de causas com um artigo no Público aqui reproduzido - Put the blame on Mame, o mesmo título de uma canção irresistível de Allan Roberts e Doris Fisher interpretada pela Haywoth no Gilda de Charles Vidor.

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