Our Self: Um blogue desalinhado, desconforme, herético e heterodoxo. Em suma, fora do baralho e (im)pertinente.
Lema: A verdade é como o azeite, precisa de um pouco de vinagre.
Pensamento em curso: «Em Portugal, a liberdade é muito difícil, sobretudo porque não temos liberais. Temos libertinos, demagogos ou ultramontanos de todas as cores, mas pessoas que compreendam a dimensão profunda da liberdade já reparei que há muito poucas.» (António Alçada Baptista, em carta a Marcelo Caetano)
The Second Coming: «The best lack all conviction, while the worst; Are full of passionate intensity» (W. B. Yeats)

17/01/2025

Pro memoria (436) - A desconformidade dos factos da "operação especial" com a narrativa do pessoal avençado nas TV portuguesas

À laia de serviço público, aqui vão alguns factos objectivos e verificáveis citados por Henrique Cardoso em Não, a Rússia não está a ganhar a guerra (para ser honesto, contaminados com algum wishful thinking). 

«1. Uma “operação especial” que devia durar três dias já vai em três anos de guerra. A resistência de Kiev, logo nas primeiras semanas, é uma derrota russa que ficará para sempre registrada na história das sagas e lendas da guerra.

2. A Rússia já perdeu 760 mil homens na Ucrânia. É muito acima do preço que a Rússia comunista pagou no desastre que foi a invasão do Afeganistão nos anos 80. Aliás, não posso deixar de ver uma repetição histórica: o desastre do Afeganistão foi fundamental para a queda da URSS em 1989-91. Em 2025, podemos estar próximos desse cenário. Putin não aguenta outro ano como 2024. Só em 2024 estima-se o número de baixas russas em 420 mil. Para termos a dimensão deste número, devemos lembrar que os EUA, em quase 20 anos de guerra no Iraque, perderam apenas 4500 soldados. Repita-se: a Rússia em três anos perdeu 760 mil homens na Ucrânia; os EUA 4 mil e tal no Iraque em duas décadas.

3. A economia russa está tudo menos sólida. As taxas de juro são absurdas (23%), e a inflação está nos 9%. Mesmo com toda a propaganda, os russos têm medo de um novo colapso económico como aquele que viveram nos anos 90.

4. A Ucrânia até conseguiu invadir espaço russo, Kursk; algo altamente simbólico (é a primeira vez que a Rússia sofre uma invasão desde 1941) e altamente decisivo nas negociações de paz do futuro próximo.

5. Além da mediocridade da campanha em terra, a marinha russa foi humilhada no Mar Negro. As exportações ucranianas (sobretudo os cereais) não foram afetadas, o que foi fundamental para manter o preço do pão em níveis aceitáveis na Europa. Recorde-se que a estratégia de Putin passava por asfixiar o cabaz de bens essenciais da Europa, liderado pelo pão obviamente. Falhou por completo: pelo menos 15 dos seus navios foram afundados ou danificados por drones ucranianos.

6. A reviravolta na Síria é outra humilhação: Moscovo foi incapaz de proteger o seu aliado, Assad. Putin não tem tropas suficientes para derrotar a Ucrânia e defender a integridade da Rússia, quanto mais para defender aliados no Médio Oriente.

7. Registe-se ainda aquela que será porventura a humilhação mais risível: a convocação de soldados norte coreanos. Seria o mesmo que os EUA pediram ajuda a países como Honduras e Panamá.

8. As sanções ocidentais levaram a Rússia para a dependência da China, o que não está a ser salutar para as relações entre Moscovo e Pequim.

9. A NATO cresceu na resposta, ou seja, entraram novos países que tinham mantido até 2022 a sua neutralidade, Suécia e Finlândia, dois velhos inimigos de Moscovo no Báltico. O poder militar (e a indústria militar) da Suécia é particularmente formidável.

10.Outros países da NATO estão a recuperar ou a reforçar a tradição do serviço militar para rapazes e raparigas. Até Portugal, na outra ponta da Europa, está a reagir

Sem comentários: