«A escravatura é, ao contrário do que estes novos activistas do anti-escravismo procuram fazer crer, um dos assuntos mais mostrados, estudados e discutidos dos últimos 250 anos da história ocidental. Só por uma grande ignorância se pode pensar que o que se lhe refere esteve durante séculos escondido e em silêncio, e que só agora estará a chegar à superfície das consciências. Infelizmente é essa ignorância que os activistas que agitam esta questão nos dias de hoje vêm evidenciando a cada passo. Tudo se passa como se ainda vivessem em meados do século XVIII e não soubessem que o seu combate já foi combatido — e já foi ganho — pelos abolicionistas do século XIX. O que os referidos activistas trazem agora para a opinião pública é um remake, um déjà vu completamente artificial e fora de tempo. Fazem-no por várias razões, desde logo porque querem estabelecer uma oposição, uma dicotomia, entre uma história da escravatura narrada por brancos (que, supostamente, omitiria e silenciaria certas coisas) e uma história vinda de negros (que seria verdadeira e que iria finalmente revelar verdades incómodas). Ora a história da escravatura é só uma: a que se interessa pela verdade e tem um compromisso com ela. Não tem cor, não é branca nem preta, e há muito que está contada e bem contada. Do que ela não precisa é de narrativas que venham chover no molhado, e ainda menos precisa que lhe venham inventar mitos e falsidades.»
João Pedro Marques no Observador, a propósito da descoberta com 200 anos de atraso pela artista Grada Kilomba de «um sistema político que escraviza pessoas».
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