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23/01/2018

Crónica da anunciada avaria irreparável da geringonça (119)

Outras avarias da geringonça.

Esta crónica é a 119.ª a anunciar desde 19 de Novembro de 2015 a avaria irreparável da geringonça. Adivinho que alguns dos leitores poderão pensar que o anúncio é manifestamente exagerado. Mas não, não é. A geringonça está irreparavelmente avariada há algum tempo, desde que uma das suas três pernas (para efeito do notário são quatro, contando com a perna-de-pau de Os Verdes) declarou que só anda se lhe apetecer.

Um sintoma de que a perna comunista da geringonça já anda por ela própria é a profusão de greves marcadas ou ameaçadas, como no caso dos oficiais de justiça, dos professores e dos médicos.

Se houvesse dúvidas, deixou de haver com a eleição de Rui Rio, candidato a substituir a perna comunista, o que desde logo suscitou um aviso do camarada Jerónimo contra o regresso ao Bloco Central e uma denúncia do CC do PCP do «desenvolvimento de projectos reaccionários que, quer a partir das forças do grande capital e dos sectores políticos a elas associados no PSD, no CDS mas também no interior do PS.»

Aviso e denúncia ecoados pela camarada Catarina, preocupada com o risco dos berloquistas, com os olhos postos num ministériozinho, terem de regressar às associações de estudantes, à ILGA and all that jazz. Aviso e preocupação que Carlos César, com o seu maquiavelismo de pacotilha, aproveitou para incentivar antecipando um PS-D que deixará de ser «errático, indefinido e ausente das grandes decisões» e será promovido a interlocutor «seguro, com continuidade e previsibilidade».

Um indicador de como os comunistas hierarquizam o seu interesse de controlar os sindicatos face ao interesse do país é o peso do sector automóvel que vale 6% do PIB português, sector onde os comunistas foram os directos responsáveis pelo fecho da Opel da Azambuja e agora dão o seu melhor para esvaziar a Auto-Europa. Felizmente com pouco sucesso como demonstrou a enorme multidão composta por «cerca de 20 pessoas em vigília contra novo horário na Autoeuropa», contando com a filha de um dos vigilantes.

A RTP que, além de paradigma de empresa pública, acumula com máquina de manipulação disputada pelos partidos, mas sobretudo dominada historicamente pelo PS, atravessa o que o semanário de reverência apelida de guerra dos tronos na RTP onde a pretexto da recondução da administração a comissão de trabalhadores se engalfinha com a administração e grupos de trabalhadores. Os conflitos de interesse existentes seriam suficientes num país decente para pôr na rua a administração em peso, quanto mais reconduzi-la.

Uma «fonte governamental», segundo o insuspeito Expresso, considerou «excelente» para o futuro da Europa e o «mais europeísta de sempre» o acordo entre CDU e SPD, querendo dizer quem sabe se agora que caminhamos para as próximos eleições vamos poder extorquir mais uns cobres. E, falando de Europa, atentemos ao desdobramento de personalidade de Costa, sempre  presente no convívio da sua persona europeísta com a outra persona esquerdista, desdobramento que lhe permite um comportamento esquizofrénico: como secretário-geral do PS nega ter dado acordo à criação de um círculo transnacional para as eleições do PE, enquanto o Costa primeiro-ministro considera uma boa ideia a criação desse círculo. A esquizofrenia chega até ao Ronaldo das Finanças que em casa diz ter acabado a austeridade, ao mesmo tempo que faz cativações, e em Berlim o ministro alemão das Finanças diz que Centeno está «comprometido totalmente com a linha política defendida» por Schäuble.

Enquanto à superfície o défice diminui, a dívida diminui, e tudo parece correr bem, nas profundezas do zingarelho público as empresas públicas gastaram mais 53 milhões em juros do que o orçamentado, o défice da ADSE aumenta e a almofada financeira pode desaparecer este ano, o ministério da Educação já tinha gasto em salários até Novembro mais do que o orçamento do ano, escolas não têm dinheiro para o aquecimento, as urgências dos hospitais ameaçam colapsar, muitos hospitais estão subequipados (entrevista do bastonário), etc.

Tudo isto não impede que consumidores, plenos de afectos, gastem como se nunca acabassem os amanhãs que cantam de Costa. O crédito para compra de automóveis aumentou 25% e atingiu 2 mil milhões em 2017. Os preços das casas tiveram no 3.º trimestre a terceira maior subida homóloga (10,4% contra a média de 4,6% na UE28) .

Não fossem as exportações e o turismo, já se poderiam ver no horizonte as nuvens do quarto resgate. O excedente da balança comercial até Novembro foi de 2,8 mil milhões o que deve ter chegado para pagar os automóveis que importámos. Note-se, contudo, que esse excedente foi inferior em 360 milhões ao do mesmo período de 2016, ao contrário do excedente comercial da zona euro que aumentou 10,5% até Novembro. As receitas do turismo também ajudam à festa crescendo o dobro do número de turistas e contribuindo com 28% do crescimento das exportações, quase tanto como o contributo de 33% da metalomecânica, máquinas, automóvel e química (fonte).

Jornal Eco
O diagrama acima contraria o foguetório do governo, que em nada contribuiu para as exportações, que pela boca do ministro da Economia disse 2017 iria ser o ano com maiores exportações de sempre.

Enquanto por um lado o governo se vangloria com os resultados da economia rebocada pela conjuntura internacional, por outro, naquilo que de si depende, continua a empurrar o problema da dívida pantagruélica com a barriga. A redução do défice está a ser conseguida por aumento da receita (5,5%) e a redução das despesas foi insignificante (0,4%) e quase totalmente devida à redução dos juros. Se numa conjuntura internacional excepcionalmente favorável o governo não resolve os problemas estruturais, o que podemos esperar quando, mais tarde ou mais cedo, tivermos uma desaceleração ou mesmo uma recessão?

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