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15/11/2006

CASE STUDY: os equívocos do salário mínimo

A propósito do putativo aumento do salário mínimo para 400 euros, oportunamente anunciado pelo primeiro ministro/secretário geral do PS (cortar o que não interessa), a bloguilha liberal tem defendido a doutrina habitual dos efeitos negativos para o emprego (por vezes apresentados como desastrosamente negativos) da simples existência do salário mínimo, e ainda mais do seu aumento. Se não se importam, tenho sérias dúvidas que tal se possa concluir com essa facilidade.

Em primeiro lugar, os efeitos negativos (ou positivos) do salário mínimo dependem obviamente da relação deste com o segmento inferior da grelha de salários efectivamente praticada - se, por absurdo, com a actual distribuição estatística dos salários portugueses, os efeitos negativos (ou positivos) dum salário mínimo mensal em 100 euros seriam absolutamente irrelevantes.

Em segundo lugar, em muitos países onde existe, o salário mínimo abrange apenas uma pequena fracção dos activos: 5% no caso dos EU, em que representa cerca de 30% do salário médio (ver aqui) e, em Portugal, de 6,2% em 2003 baixou para 4,5% em 2005, representado cerca de 50% do salário médio (ver aqui).

Em terceiro lugar, porque essa pequena fracção dos activos é a menos qualificada. No caso português, muitos deles são empregadas domésticas, biscateiros, etc., têm empregos precários e na maioria dos casos produzem bens ou serviços não transaccionáveis. Protegidos da concorrência internacional, esses bens ou serviços não irão evidentemente ser produzidos ou prestados algures na China, no Vietname, ou elsewhere.

Em quarto lugar, porque a teoria divide-se: entre os 650 economistas americanos (na sua maioria de esquerda, esclareça-se, mas nem todos obviamente idiotas) que apoiaram recentemente o aumento do salário mínimo encontram-se 5 prémios Nobel (A blunt instrument).

Em quinto lugar, porque os estudos empíricos realizados mostram resultados contraditórios (A blunt instrument) e quase sempre limitados, quer nos seus efeitos negativos (redução do emprego), quer nos seus efeitos positivos (melhoria de vida dos trabalhadores com menores salários).

Em conclusão, no ponto em que as coisas estão, não vale a pena gastar muito latim, nem perder o sono. Acordem-me quando o senhor engenheiro anunciar, vibrante, poucos dias antes das eleições de 2009, que o salário mínimo vai ser aumentado para 600 euros.

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