João Abel Manta |
Nas últimas duas semanas, a Revista do Expresso publicou duas peças (*) sobre Lima de Carvalho uma personagem relativamente conhecida, pelo menos de quem tivesse visitado a Galeria de Arte do Casino Estoril, mas com uma vida durante o Estado Novo desconhecida de quase todos - a de funcionário discreto do Serviço de Leitura Especializada da Direção dos Serviços de Censura encarregado das publicações não periódicas em acumulação com redactor anónimo do jornal "A Voz", uma das vozes do regime. Desconhecida de quase todos, mas não de todos. A célula local do PCP no Casino Estoril sabia do seu passado e manteve-se um prudente silêncio tirando vantagem dessa informação, como fazia habitualmente com "arrependidos" do regime.
O interessante desta estória é que Lima de Carvalho serviu com igual zelo, ou mesmo melhor, a democracia, que o condecorou com o grau de oficial da Ordem do Infante D. Henrique, e a ditadura que os jornalistas do Expresso, talvez para exorcizar os seus fantasmas, chamam "fascismo", o que o antigo regime nunca foi, como qualquer alma que conheça história saberá.
Moral
Quando Jesus disse (Mateus 6:24) «Ninguém pode servir a dois senhores; porque ou há de aborrecer-se de um e amar ao outro, ou se devotará a um e desprezará ao outro», referia-se, obviamente, a servi-los ao mesmo tempo.
Como o pintor e cartunista Abel Manta, muito bem retratou, os tempos que se seguiram à queda do Estado Novo foram pródigos em conversões maciças. Eu próprio já recordei várias vezes ter então descoberto que o país estava coalhado de democratas, socialistas e comunistas. Em cada empregado servil, venerador, de espinha dobrada e mão estendida, havia um heróico sindicalista pronto a lutar pelos direitos dos trabalhadores e pelo «saneamento» do patrão.
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(*) ‘Frei’ Lima de Carvalho e os seus dois regimes: a história secreta do censor que se tornou patrono das artes após o 25 de Abril e O camaleão: como o PCP ajudou a reabilitar um antigo censor do Estado Novo.
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