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11/11/2018

Para a corporação dos intermediários só devem existir os mídia em que a corporação tem o monopólio

... a internet nos proporciona a liberdade de expressão numa espécie de mercado onde concorrem as ideias (e as idiotices, claro) pela atenção dos consumidores de ideias e dos analistas de ideias, dos opinion dealers e toda a parafernália de intermediários sempre presentes em todos os mercados e que neste caso opinam sobre a opinião. Sem essa liberdade precisaríamos de uma comissão que decretaria a opinião oficial, a opinião oficiosa e as opiniões toleradas. Qual seria o resultado? Não precisamos imaginar, basta ver o que se passa na China, na Coreia do Norte, na Venezuela, em Cuba, na Rússia, etc.
Henrique Monteiro, uma alma tresmalhada da corporação dos intermediários, escreveu no mesmo sentido no Expresso deste fim de semana o artigo «A falácia das redes sociais como culpada dos males do mundo» que é uma ilha de lucidez no oceano de obscuridade dos escritos dos membros da corporação. Aqui vai ele integralmente.

«Sinceramente estou farto de ouvir inteligências várias culpar as redes sociais pela explosão do populismo, pela radicalização de posições políticas ou pela existência de extremismos vários. Mesmo que possa concordar com tal tese (no que não caio tão facilmente), interrogo-me: e depois? O que pretendem fazer? Censurá-las? Limitá-las a pessoas que as sabem usar? Adotar uma licença de utilização das redes? 

Se olharmos para as redes como uma democratização da opinião, porque qualquer pessoa a elas tem acesso e pode, em teoria, espalhar a sua opinião de forma global, teremos de concluir que não gostamos dessa democratização sociológica que permite o acesso de todos a todos. O fim da intermediação, seja nas notícias (jornalistas), seja na ciência (cientistas), seja nos negócios do Estado (políticos) é um facto adquirido. Não existe! A mensagem é o que o emissor quiser. Este, por muito idiota que seja, está nas redes em quase pé de igualdade com especialistas. Os recetores deixaram de estar na sala de uma conferência ou fazer parte da elite que comprava jornais. São, literalmente, toda a gente. Enfim, não gostamos (também não gosto) do que vimos.

E o que estamos sempre a ver, a ler e a ouvir vem de todos os lados. Notícias falsas sempre existiram, como teorias estranhas de conspiração ou perseguições e bullying. Podemos recordar a tradução do latim para línguas correntes da Bíblia e o problema que isso trouxe à Igreja ao pôr em causa a sua intermediação, ou o episódio das 'bruxas' de Salém (ver filme). O que era mais ou menos local passou agora a global. Pensemos na praça de uma pequena vila e no que a multidão chamava ao detido por qualquer crime; em tamanho minúsculo temos o que o hoje é macro.

As redes sociais, impõem soundbites pela limitação de carateres (como no Twitter) e levam à radicalização? A mim basta pensar-me no que se dizia - enforquem-no! matem-no! encham o tipo de alcatrão e penas - para não ser tão taxativo. Aliás, basta um estádio de futebol para ver que se pode ser muito mais ofensivo em muito menos carateres.

Antes das redes, dirigentes bárbaros, sanguinários, estúpidos ou perversos foram adorados pelas massas. É muito melhor e útil analisarmos as vagas de irracionalidade próprias dos seres humanos do que culparmos o meio (e já não só o mensageiro, porque foi este que, em suma, tem vindo a desaparecer).

Culpar as redes dá um certo ar elitista; pode, até, ser chique, mas não parece ter· base sólida. O mundo global e as suas ferramentas permitem-nos viver lado a lado com ignaros. O mundo sempre assim foi, apenas o conhecemos melhor.»

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