Em dois artigos (que continuarão) Patrícia Fernandes, professora da universidade do Minho, tratou com inteligência e sem pré-conceitos o tema incendiário das diferenças entre o masculino e o feminino. Os excertos seguintes são à laia de teaser para uma leitura dos artigos originais: «As mulheres mudam a política?» (1) e (2).
«A distinção entre sexo e género tornou-se aí evidente: parte substancial da rigidez das sociedades tradicionais no que diz respeito aos papéis sociais de homens e mulheres dissolveu-se e tornou-se mais claro o que era convencional e o que era natural. O problema é que se gerou uma tal obsessão com a igualdade que se absolutizou o género, levando à desconsideração da dimensão natural. Este é um aspeto fundamental para compreender a evolução da teoria e da prática políticas nas últimas décadas do século XX até aos nossos dias: o problema não está no reconhecimento do género enquanto papel social, mas está no passo seguinte de esquecer que o “sexo” também existe, ou seja, que existe uma realidade material, biológica e condicionada por mecanismos evolutivos e adaptativos que não podemos recusar.
(...)
Desafiando o paradigma liberal – que, na senda de Immanuel Kant, tende a universalizar o sentido do humano e a desvalorizar a dimensão da identidade –, seria possível afirmar que as mulheres podem trazer um fator de novidade para a política, oferecendo novas interpretações dos factos e condicionando as políticas públicas que são adotadas. Simplesmente, não podemos confundir novidade com bondade. Trata-se de um erro muitas vezes formulado nesta discussão: mas ser diferente não significa ser melhor.
Este argumento apresenta ainda uma especial vantagem interpretativa por nos tornar mais capazes de compreender um fenómeno que parece surpreender a maioria dos comentadores: por que razão existem tantas mulheres em partidos de direita radical, apesar de estes parecerem defender políticas desfavoráveis às mulheres? À esquerda, muitas feministas acusam estas mulheres de estarem submetidas à lógica do patriarcado, mas se considerarmos o modo como as mulheres foram desenvolvendo estruturas adaptativas para lidar com as suas particularidades biológicas, é possível reconhecer que discursos centrados na família e na segurança e que apelam a motivações menos individualistas e mais direcionadas para o grupo e para a pertença se tornam mais atrativos para as mulheres e mais próximos dos seus interesses. E elas encontram isso nos partidos mais identitários, quer à esquerda, quer à direita.»
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