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07/02/2006

CASE STUDY: preso por ter cão, preso por não ter

Há sempre quem critique os governos por tudo e por nada. Ora porque não investem, ora porque investem demais. Ora porque contribuem para o clima depressivo, só falando em sacrifícios, ora porque estimulam a «exuberância irracional» e levam o povo a correr atrás do écran de plasma para ver os alienantes derbies ou os canais pornográficos - o que é quase a mesma coisa.

A todos esses, o governo do engenheiro Sócrates cortou-lhes o pio. Porquê? Qual foi o governo, desde dona Maria II, que anunciou mais projectos do que este? Nenhum, nem de perto, nem de longe, ousou em menos de um ano anunciar TGV's, aeroportos, planos tecnológicos, refinarias, culminando com o anúncio de mais uma manada deles, na semana anterior às eleições.

O ímpeto continuou a semana passada com mais anúncios de dúzias de parcerias com a Microsoft, e um must - o programa Finicia.

Podemos criticar o governo por torrar a grana em projectos discutíveis? Não podemos. Até hoje o governo só gastou uns trocos com consultores para mostrar as coisas com aspecto decente. Corremos o risco do governo gastar o dinheiro do aumento dos impostos nesses projectos? Dificilmente. A grana já está a ser torrada na redução do desemprego.

Podemos criticar o governo por propagar o pessimismo? Não podemos. É difícil dar mais boas notícias em menos tempo. É impossível contribuir mais intensamente para a recuperação da confiança e da auto-estima dos portugueses, apesar da venda de veículos ainda não o evidenciar.

É certo que é sempre possível um mal intencionado invocar que o programa Finicia de financiamento a micro-empresas poderá torrar 114 milhões de euros em 1.300 novas iniciativas empresariais, nascidas do alfobre de inovação que são as nossas garagens. Poderá mesmo? Dificilmente.

Primeiro, porque as nossas garagens já estão ocupadas com carros (classe A) ou com a tralha que não temos coragem de deitar fora (classe B) - as restantes classes não têm garagem. Segundo, porque o governo tomou a precaução de entregar aos reitores a avaliação dos projectos e a sua aceitação. Ora estes, começam por estar mais longe do «empreendedorismo» do que o diabo da cruz, e, por via das dúvidas, pela boca do Conselho de Reitores, já tiveram o cuidado de esclarecer que não sabiam de nada, o que é meio caminho andado para se gastaram só umas dezenas de milhões a montar as «estruturas» e ficar por aí. Entretanto, o ministro Pinho é remodelado e azera-se outra vez o conta-quilómetros.

Em estado de desespero (passe a redundância), se levarmos à letra o ministro Costa, o estado descarta tudo e fica-se pelas "funções de segurança, as reguladoras e que asseguram a igualdade de oportunidades e a protecção social". Mas só depois dos portugueses recuperarem a auto-estima.

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