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03/11/2025

Crónica da passagem de um governo (22)

Outras Crónicas do Governo de Passagem

Navegando à bolina
Não sabemos se um mercado ultra-regulado e com incentivos errados como o da habitação ainda poderá funcionar…

Sem surpresa, salvo para os distraídos, as facilidades do crédito jovem e das garantias estatais estão a puxar pela procura e o valor do stock de crédito para compra de habitação (somatório dos saldos totais do crédito hipotecário) bateu em Setembro um novo recorde com o maior crescimento mensal (8,9% desde 2008), atingindo 108 mil milhões.

Não sabemos se são sinais de reessureição do mercado da habitação, mas o certo é que até Agosto o número de licenças para construção e reabilitação teve um aumento de 9%. Como quer que seja, depois de duas décadas com a construção agonizante, o défice acumulado de oferta é tão grande que serão precisos muitos anos para a oferta cobrir a procura.

O que sabemos é que só por milagre a insistência na utilização de imóveis públicos para “arrendamento acessível” resolverá o problema, como mostraram as experiências dos programas socialistas. Por várias razões, sendo a mais óbvia que são pouquíssimos os imóveis públicos com condições para habitação, condições que só existirão com obras dispendiosas que poucos senhorios privados estarão dispostos a suportar. Duvida-se que resulte o expediente deste governo de usar programas PPP – em que se espera que o terceiro “P” seja um bando de filantropos.

A propósito deste tema não resisto a dar um exemplo da mistura de ignorância e inclinação doutrinária com que a imprensa aborda este tema. Trata-se do artigo do Público – aka o Avante da Sonae – «Regiões com maior aumento da construção são onde os preços das casas mais sobem» para cuja desmontagem remeto para este post de HPS que diz o essencial sobre o assunto.

Banco de Fomento é «torrar dinheiro em coisas que não valem pevide»

Recordemos outra vez que o Banco de Fomento sucedeu a um banco de fomento que fora privatizado por um governo PS, ressuscitado em 2018, só viu a luz do dia em 2021, depois de dois anos a ser anunciado pelo então ministro da Economia. E entre outros desastres desde a sua fundação em 2012 registou perdas de 124 milhões nas cerca de 300 startups em que participou. Desde então já teve mais de uma dúzia de administradores.

Não surpreenderá ninguém saber que o resultados líquidos do 1.º semestre e do 3.º trimestre do Banco de Fomento são os montantes pífios de 8.9 milhões e 10 milhões, respectivamente, e que o stock de empregados continua a crescer a bom ritmo (16% do ano passado), não obstante os activos totais terem sido reduzidos de 4%. O que, por agora, ainda poderá surpreender é que o banco já conseguiu registar mil milhões de imparidades por crédito mal parado.

Podia ser pior, mas precisava de ser muito melhor

Segundo o INE, um tanto surpreendentemente, no 3.º trimestre o aumento homólogo do PIB em volume foi de 2,4% e, segundo os dados provisórios do Eurostat, o PIB português corrigido de sazonalidade registou nesse mesmo trimestre o quarto aumento dos 15 países da UE em que já existem esses dados.

Não ajuda à festa que o crescimento do 3.º trimestre se deva em boa parte à aceleração do consumo privado, como não ajuda a poupança das famílias estar muito abaixo da média da UE e em grande parte estacionada em depósitos bancários (197 mil milhões em Setembro), porque a aversão ao risco dos portugueses é um dos pilares da alma lusitana.

Hoje há cadelinhas, amanhã não sabemos

Não fora o turismo, cujas receitas até Setembro cresceram 5,6%, e entrada de subsídios da bazuca, outro galo cantaria. Com uma produtividade estagnada, uma despesa pública fixa em constante crescimento, o Portugal dos Pequeninos está muito mal preparado para enfrentar uma possível evolução negativa da conjuntura internacional.

Os portugueses «vão ter razões para confiar no SNS»

Valha-nos Deus. A mesma CIP que patrocina um estudo do ISEG publicado há dias que concluiu que a despesa do SNS aumentou 72% em 10 anos, vem uns dias depois lamentar que o OE 2026 não preveja despesa suficiente, subscrevendo o método lusitano de atirar dinheiro para cima dos problemas. Enquanto isso, passa ao lado do pequeno pormenor do SNS gastar com tarefeiros por dia 727 mil euros ou 265 milhões por ano e dos custos expediente das “cirurgias adicionais” – uma oportunidade de negócio para cirurgiões que dão prioridade às cirurgias mais simples e lucrativas, como explica o médico Luís Teixeira.

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