Face ao coro de legalistas que divinizam a l’outrance o segredo de justiça e diabolizam a sua violação, será bom recordar em primeiro lugar que «o processo penal é, sob pena de nulidade, público, ressalvadas as excepções previstas na lei» (artigo 86.º do CPP). O segredo de justiça não é, portanto, a regra na instrução dos processos – é a excepção e, segundo parece a um analfabeto no juridiquês, para a regra ser afastada é preciso que o juiz considere que a publicidade prejudica os interesses da investigação ou os direitos do arguido, do assistente ou do ofendido.
Não nos pintem, por isso, o segredo de justiça como a quinta-essência dos direitos do homem. Há nesta matéria interesses contraditórios, a começar pelo eventual conflito entre o interesse público no conhecimento do crime, de garantir a imparcialidade na investigação e a transparência do processo, por um lado, e o interesse do arguido, por outro. Não vejo, por isso, como possa considerar-se que o arguido tenha um direito absoluto ao segredo de justiça.
Dito isto, voltemos ao mundo real. Imaginemos que em todos os processos mediáticos sujeitos ao segredo de justiça, este tivesse sido escrupulosamente cumprido. Qual a informação, se alguma, e quando teria chegado à opinião pública? Se com o escrutínio da comunicação social e da opinião pública conseguido pela violação do segredo de justiça as prescrições chovem e as condenações escasseiam, o que aconteceria sem essa violação? Sejamos realistas, no estado terminal em que se encontra a justiça neste país, o estado de inimputabilidade das corporações, os poderes fácticos dos aparelhos partidários e da maçonaria (e o imbricamento desta com o aparelho socialista) e a falta de accountability dos poderes legítimos, a violação do segredo de justiça é talvez a última linha de defesa da sociedade civil.
E a presunção de inocência, o direito ao bom nome e os julgamentos na praça pública? Uma vez mais, voltemos ao mundo real. Muitos, por boas e más razões, se preocuparão com os Pedrosos, os Varas, os Penedos. Quem, para além dos próprios Zés-Ninguéns, se preocupa com a presunção de inocência, o direito ao bom nome e os julgamentos na praça pública dos Bibis? O mundo não é perfeito. Se fosse perfeito não seria necessário violar o segredo de justiça.
Our Self: Um blogue desalinhado, desconforme, herético e heterodoxo. Em suma, fora do baralho e (im)pertinente.
Lema: A verdade é como o azeite, precisa de um pouco de vinagre.
Pensamento em curso: «Em Portugal, a liberdade é muito difícil, sobretudo porque não temos liberais. Temos libertinos, demagogos ou ultramontanos de todas as cores, mas pessoas que compreendam a dimensão profunda da liberdade já reparei que há muito poucas.» (António Alçada Baptista, em carta a Marcelo Caetano)
The Second Coming: «The best lack all conviction, while the worst; Are full of passionate intensity» (W. B. Yeats)
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Pensamento em curso: «Em Portugal, a liberdade é muito difícil, sobretudo porque não temos liberais. Temos libertinos, demagogos ou ultramontanos de todas as cores, mas pessoas que compreendam a dimensão profunda da liberdade já reparei que há muito poucas.» (António Alçada Baptista, em carta a Marcelo Caetano)
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22/11/2009
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