Our Self: Um blogue desalinhado, desconforme, herético e heterodoxo. Em suma, fora do baralho e (im)pertinente.
Lema: A verdade é como o azeite, precisa de um pouco de vinagre.
Pensamento em curso: «Em Portugal, a liberdade é muito difícil, sobretudo porque não temos liberais. Temos libertinos, demagogos ou ultramontanos de todas as cores, mas pessoas que compreendam a dimensão profunda da liberdade já reparei que há muito poucas.» (António Alçada Baptista, em carta a Marcelo Caetano)
The Second Coming: «The best lack all conviction, while the worst; Are full of passionate intensity» (W. B. Yeats)

09/12/2006

CASE STUDY: quem dá o pão, dá o pau

Nas suas reflexões sobre o Estado Moderador, Rui Ramos responsabiliza a esquerda moderna pelo intervencionismo moralista do estado napoleónico-estalinista que invade o domínio privado dos cidadãos pretendendo iluminá-los para «os levar a valorizar o serviço» (nacional de saúde) ou querendo impor-lhes um contrato bilateral com o Estado, para os levar a aceitar o ónus dos seus putativos deveres face ao mesmo estado napoleónico-estalinista.

A primeira é a versão doméstica das taxas moderadoras do engenheiro Sócrates, inventada depois da falência inescapável do SNS. A segunda é a versão de Tony Blair, inventada vários biliões de libras depois despejados sobre o NHS.

A mim não me parece que a esquerda, seja a moderna ou a tradicional, tenha especiais culpas neste estado de coisa. Em Portugal, pelo menos, é especialmente evidente que, à parte pequenas miudezas, a direita propõe e tem aplicado a mesma medicina e nunca pôs em causa a panaceia do serviço nacional de saúde tendencialmente gratuito. A direita (e a esquerda, quanto está atascada no atoleiro das finanças públicas) discute, quanto muito, o que seja tendencialmente.

Na Grã-Bretanha, afora os tempos longínquos da Iron Lady, também não me parece que os tories se distingam especialmente dos trabalhistas a este respeito. Isso é especialmente evidente com o actual líder conservador David Cameron aka Dave the Chameleon, cujas propostas, neste domínio como noutros, não são muito diferentes das de Blair.

Também não me parece que as responsabilidades se esgotem nos políticos, das direitas ou das esquerdas, que foram livremente eleitos para aplicar tais políticas. Políticas que, reconheça-se, são as políticas que os cidadãos esperam que apliquem, mas cujos custos parecem pouco dispostos a suportar.

E esses custos vestem diferentes roupagens, todas elas bastante chocantes para os sujeitos passivos, por umas razões, e para as elites bem-pensantes, por outras. Se o peso da carga fiscal é já asfixiante (Portugal) ou começa a sê-lo (GB), o que incomoda a generalidade dos contribuintes, a intrusão do estado napoleónico-estalinista na vida sexual, nos hábitos de consumo e nos vícios privados incomoda sobretudo as elites. Incómodo que, se é hipoteticamente genuíno no caso das luminárias liberais, é repulsivamente hipócrita no caso das luminárias colectivistas, de esquerda ou de direita.

Sem comentários: