Our Self: Um blogue desalinhado, desconforme, herético e heterodoxo. Em suma, fora do baralho e (im)pertinente.
Lema: A verdade é como o azeite, precisa de um pouco de vinagre.
Pensamento em curso: «Em Portugal, a liberdade é muito difícil, sobretudo porque não temos liberais. Temos libertinos, demagogos ou ultramontanos
de todas as cores, mas pessoas que compreendam a dimensão profunda da liberdade já reparei que há muito poucas.
» (António Alçada Baptista)
The Second Coming: «The best lack all conviction, while the worst; Are full of passionate intensity» (W. B. Yeats)

05/12/2025

TIROU-ME AS PALAVRAS DA BOCA: "Quando a América actua às ordens de Putin"

«O comportamento americano é verdadeiramente assombroso. Revela uma América controlada por aqueles “homens-massa” de que falava Ortega y Gasset, homens sem valores, sem um dentro, incapazes de reconhecerem algo maior do que eles. E por isso dividida contra si mesma, moralmente deslocada do seu antigo eixo, incapaz de reconhecer o sentido profundo da sua própria posição histórica. É uma nação que, num só gesto, dispara sobre os próprios pés e abdica da posição de núcleo da Civilização Ocidental, para se converter, sem transição, em administradora dos interesses de Moscovo. Os inimigos do Ocidente não poderiam sonhar com um enredo mais providencial.

No centro deste processo surgem as figuras de Trump e Witkoff, homens cujas biografias se entrelaçam com interesses russos e que ora aparecem, não como figuras ao serviço da sua pátria, mas como conselheiros oficiosos do Kremlin, indicando a um adversário declarado dos Estados Unidos o caminho mais eficaz para alcançar os seus desígnios. Não se trata de diplomacia, mas talvez de algo mais grave: uma deserção interior, uma traição da própria ideia de responsabilidade pública.

E enquanto isto se desenrola, o Partido Republicano mergulha na discórdia. Vance inclina-se para Moscovo com a naturalidade de quem perdeu o sentido da circunstância; Rubio tenta preservar um último vestígio de racionalidade; e outros senadores levantam a voz, conscientes de que a Administração Trump se tornou uma autêntica correia de transmissão das ambições russas. E só isso explica que o plano americano coincida, ponto por ponto, com as exigências acumuladas pelo Kremlin ao longo de anos.

É o drama clássico das nações que perderam o seu propósito: acabam a servir o projecto de outros.

Nada neste “processo de paz”, tem a ver com qualquer desejo de paz por parte de Rússia que, de resto, seria fácil de alcançar, bastando retirar-se de território alheio, coisa que pode fazer quando quiser.

Toda esta encenação foi “maskirovka”. Manipulação de percepções, fumo e espelhos. O objectivo real de Putin (e pelos vistos de Witkoff e Trump) era outro: matar no útero o projecto bipartidário no Senado americano, capaz de impor sanções verdadeiramente devastadoras à economia russa.

Lamentavelmente conseguiu.

A pergunta deixa, pois, de ser polémica e passa a ser inevitável: quem e porquê está realmente a determinar a estratégia americana?

A Europa, em choque, conseguiu suavizar o indecoroso ultimato americano, rasurou os pontos mais humilhantes e impediu que o documento final fosse uma mera acta de rendição.

Tudo para que no dia seguinte, os EUA fizessem saber (?) que têm intenções de reconhecer os ganhos territoriais russos.

Ou seja, a intervenção europeia não altera o essencial: a ordem internacional baseada em regras, deixou de existir, a NATO está em coma, o divórcio transatlântico parece iminente, e a Europa está hoje no papel de quem por temer lutar, se vê na condição servil de ter de aceitar o diktat dos outros.

Neste ocaso do Ocidente, Kiev, tornou-se tragicamente, o campo de batalha onde colidem dois mundos. Aquele que ainda acredita vagamente em regras e um outro para o qual só existe a força.

E se o divórcio entre os parceiros da Civilização Ocidental se consolidar, só esta perderá.  Ou seja, nós!

Os EUA caminham para um futuro amargo. Isolados na sua ilha, sem aliados, uma entidade política amoral, cujos compromissos valem o mesmo que os da Rússia: nada!

Putin continuará, triunfante, a testar fronteiras, a explorar divisões, a aproveitar cada hesitação, para caminhar paulatinamente em direcção ao seu almejado “Império Euroasiático”

A China observa. Toma notas. Cada concessão feita a Moscovo transforma-se numa lição sobre Taiwan. O choque com a Rússia será inevitável, mas até lá ainda vai algum tempo.

Os restantes países extraem a única conclusão possível: na selva hobbesiana, sem armas nucleares, sem garantias credíveis, haverá sempre alguém disposto a rifar o nosso território quando lhe apetecer.»

José António Rodrigues do Carmo no Observador

03/12/2025

Europeans have been warned. Beware.

«We are not planning to go to war against Europe. I have said that a hundred times. But if Europe wants to wage a war against us and suddenly starts a war with us, we are ready. There should be no doubt about that. The only question is if Europe suddenly starts a war against us, I think very quickly… Europe is not Ukraine. In Ukraine, we are acting with surgical precision. You see my point, don’t you? It is not a war in the direct, modern sense of the word. If Europe suddenly decides to go to war against us and actually follows through with it, then a situation may arise very quickly where we will be left with no one to negotiate with.»

Vladimir Putin at a press conference yesterday in Moscow


In theory, the Russian Empire, a great power with the second-largest army in the world, that failed to successfully invade a country with less than a third of its population and less than a fifth of its armed forces, an Empire with an economy smaller than Italy's, would have no chance of defeating the EU. In practice, a dictatorship, where there is no such thing as freedom of expression or public opinion, ruled by a despot with a price on his head, represents an existential threat to a collection of states managed by Eurocrats who are only risking their jobs.

02/12/2025

Sequelas da Nau Catrineta do Dr. Costa (78)

Continuação das Crónicas: «da anunciada avaria irreparável da geringonça», «da avaria que a geringonça está a infligir ao País» e «da asfixia da sociedade civil pela Passarola de Costa» e do «Semanário de Bordo da Nau Catrineta». Outras Sequelas da Nau Catrineta do Dr. Costa.

A obra empresarial socialista

Em boa verdade, a responsabilidade pela persistência do sector empresarial do Estado (SEE) e pelas perdas pantagruélicas, que acabam a ser pagas pelos contribuintes, não é exclusivamente socialista. O PSD, ou mais exactamente a fracção PS-D, partilha essas responsabilidades, mais pelas omissões do que pelas acções. Ainda assim, devemos assacar ao PS a maior quota de responsabilidade, quer por mais anos que governou quer, sobretudo, pela promoção activa do papel do Estado na economia.

O estudo “Sector Empresarial do Estado e Regional 2023-2024” do Conselho das Finanças Públicas traça um retrato arrasador do SEE. Só 36 empresas das 88 analisadas tiveram resultados positivos. No total o SEE ocupa quase 190 mil trabalhadores (quase 4% da população activa). De 2023 para 2024 o volume de negócios e o investimento cresceram e o prejuízo total aumentou de -766 milhões para -1.312 milhões e o número de empresas com capitais próprios negativos (o que de acordo com o Código das Sociedades faria delas empresas falidas) aumentou de 29 para 35. O caso das entidades do SNS é particularmente grave. Mais de 70 dessas entidades tinham capitais próprios negativos em 2024. Pior é difícil.

O PS apagou as “linhas vermelhas” que o separam do partido do Dr. Ventura?

Os dois partidos chumbaram uma actualização de menos de 2% das propinas do ensino universitário. Possivelmente não perceberam que isso não ajuda o alunos pobres que merecem ser ajudados, os quais deveriam ser parcialmente ou totalmente dispensados de propinas e/ou terem bolsas. Isso significa que terá de aumentar o financiamento das universidades pelo Estado à custa dos impostos pagos de todas as famílias, mesmo pelas que não têm estudantes universitários. E esses impostos para substituir o aumento das propinas representam uma fracção maior precisamente nas famílias de menores rendimentos,

Como se fosse pouco, os dois partidos aprovaram a eliminação de portagens de onde terão de ser aumentadas as compensações aos concessionários, uma vez mais pagas com impostos regressivos e também por quem não utiliza essas portagens.

01/12/2025

Crónica da passagem de um governo (26)

Outras Crónicas do Governo de Passagem

Navegando à bolina
Será o Dr. Matias um metafísico?

A dúvida resulta de ao ler a entrevista do Dr. Matias ao Jornal Sol em que ele, sem explicar como, garante que «o potencial impacto da reforma do Estado na economia é de cerca de 10 mil milhões de euros», e confirma, uma vez mais, que «a reforma do Estado não é para fazer cortes», me ter ocorrido uma citação cujo autor se perdeu no meu cansado hipocampo «A metafísica!... Num deserto de ideias, um dilúvio de palavras».

Partilho, por isso, com Luís Marques «a dificuldade de explicar o efeito que o exercício do poder exerce no cérebro de pessoas inteligentes, bem preparadas e aparentemente sensatas, oriundas da chamada sociedade civil» e o conselho de «deixar para Marcelo o monopólio do “somos o melhor povo do mundo”, estamos “entre os melhores do mundo”, ou de qualquer coisa que se faça “estar entre o melhor que se faz no mundo”».

Canários na mina de carvão

[Como já escrevi, nas minas de carvão usavam-se canários que são muito sensíveis ao monóxido de carbono e ao metano para alertar os mineiros de um perigo iminente.]

O número de trabalhadores em “lay-off”, um regime legal a que as empresas podem recorrer em determinadas circunstâncias de dificuldades, aumentou 22% em Outubro.

O governo queixa-se dele próprio

O presidente do IAPMEI justifica o atraso na execução do PRR (a bazuca do Dr. Costa) e confessa-se preocupado «com o licenciamento de alguns projetos», licenciamente que, como é sabido, depende do governo.

Hoje há conquilhas, amanhã não sabemos, nem queremos saber

Segundo a Comissão Europeia o OE2026 português é o quinto mais expansionista da UE, ou seja, é o quinto com mais fé que a economia cresce com o governo a torrar mais dinheiro dos contribuintes europeus através da bazuca. É claro que a economia cresce quando se despeja dinheiro nas empresas e nas famílias, o problema é onde o dinheiro se aplica e qual o efeito sustentado a longo prazo.

Fazer a mesma coisa e esperar resultados diferentes pode mostrar fé, mas não mostra clarividência

Em resultado dos incentivos que o governo adoptou, o montante do crédito concedido para compra de habitação até Agosto aumentou 15% ultrapassando 18 mil milhões de euros. Como o número de novas habitações continua insuficiente para a procura, ninguém se deveria admirar que os preços por m2 tenham aumentado em Outubro 17,7% face ao mesmo mês de 2024.

Os portugueses «vão ter razões para confiar no SNS»

mais liberdade

Este é o resultado de anos de governação socialista sob os lemas «Em defesa do SNS, sempre» e «O SNS é um tesouro», um SNS cada vez mais capturado pelas corporações, a começar pelos médicos que têm conseguido limitar a oferta de cursos de medicina e usar as cirurgias adicionas e outros expedientes, como atribuir ao cirurgião a classificação do grau de complexidade da intervenção o que leva a remoção de um quisto sebáceo seja classificada como o incentivo máximo (fonte). A saúde privada agradece, ou, se quiserem, os melhores amigos da iniciativa privada são os defensores da expansão do Estado sucial.

30/11/2025

DEIXAR DE DAR GRAXA PARA MUDAR DE VIDA: Portugueses no topo do mundo (76) - Líder mundial na IA? No desperdício alimentar ninguém nos bate

Outros portugueses no topo do mundo.

O nosso Portugal dos Pequeninos não terá «as condições para se tornar um líder mundial na IA», como garantiu o Dr. Matias, ministro da Reforma do Estado, excitado pela numerosa plateia internacional que o escutava na Web Summit, mas ninguém lhe tira o lugar no topo do despercício alimentar, segundo os dados do Eurostat citados pelo Expresso.


É extraordinário que os cidadãos de um país onde ainda hoje há quem tenha fome e ainda estão vivos os que há não muitas décadas conviviam com uma frugalidade a que hoje se chamaria fome, deitem para o lixo em média quase 300 gramas de comida por dia.

29/11/2025

You can't fool all of the people all the time (9)

Other "You can't fool all of the people all the time"

YouGov (Source)

Going deeper.


In many of the states that voted for Trump, polls already show a majority of disapproval. Only 10 loyal states remain.

28/11/2025

Bons exemplos (143) - Passos Coelho, o enigma

«É neste reino de descontentamento que a figura severa de Passos Coelho reina. Ao contrário de quem governa, não precisa de uma maioria ou de meios. Pode manifestar a insatisfação com um simples gesto ou uma frase. Há muita gente em Portugal que gostaria que regressasse e há muita gente, os insiders do costume cheios de informação privilegiada, que conspiraria para que regressasse. São boutades de salão que só Passos Coelho poderá concretizar ou confirmar. A força, e poderia dizer-se força moral, de Passos Coelho tem outra fonte que não o campo de intriga do PSD ou o ninho de vespas da política. Ninguém no partido dele levantará a mão contra ele, por temor e fraqueza.

A força de ter-se mantido, desde que foi afastado do poder pela coligação de esquerda de António Costa, invisível e incorruptível. Não deslizou para os quadros de uma grande empresa, não faz parte de assembleias gerais ou conselhos de administração, não fugiu para um cargo internacional, não enriqueceu sem causa. Não aceitou ser comentador num canal de televisão, e tenho a certeza de que muitos o contratariam por quantias superiores às de um primeiro-ministro. Mantém uma casa nos subúrbios, teve perdas pessoais que encaixou sem lamento, não controla a figura pública com a obsessão das figuras públicas, não escreveu livros confessionais ou outros. E decerto o convidaram a escrever as memórias da troika. Não está nas redes, a aparafusar indignações. Não vai às televisões explicar-se. Não dá entrevistas. Não se lhe conhecem crimes ou comportamentos desviantes, muito menos onde o dinheiro estaria envolvido. Escreve uns prefácios, faz umas apresentações de livros, diz umas coisas, não muitas. É breve e conciso e, pasme-se, coerente. É um enigma.»

O enigma Passos Coelho, Clara Ferreira Alves no Expresso

____________

Registo que esta peça, que faz justiça a Pedro Passos Coelho, foi escrita pela mesma jornalista que escreveu há uma dúzia de anos, a pedido do Dr. Mário Soares por quem ela tinha devoção, um artigo de limpeza do cadastro do Eng. José Sócrates, artigo que dissequei em quatro verrinosos posts: (I), (II), (III) e (IV). É um exemplo de que a maioria das pessoas é capaz do pior e algumas vezes também do melhor.