Continuando os comentários ao relatório dos 12 sábios «Uma década para Portugal», vou abordar tanto quanto possível sequencialmente os seus cinco capítulos: 1. Princípios de governação económica pela confiança no futuro; 2. Diagnóstico económico e social; 3. O cenário macroeconómico; 4. Medidas para transformar as condições de crescimento da economia portuguesa e 5. Cenário final.
1. Princípios de governação económica pela confiança no futuro
Continua com a exaltação da obra socrática das infra-estruturas que «colocariam o país numa posição privilegiada para fazer face às dificuldades» (seria exportando kms de auto-estradas?) e só não colocaram porque «as políticas adotadas foram erradas», isto é «face a um problema de oferta» não estimularam a procura com o investimento público e privado. Não explicam os crânios socialistas com que dinheiro se continuaria a fazer auto-estradas, a terceira travessia do Tejo e lançar o TGV e como é que, supondo que os credores o emprestassem, isso resolveria o problema da oferta – enfim, talvez resolvesse o problema da oferta dos países que exportam os bens que importamos, como no passado.
À boa maneira dos bourbons, de quem se dizia que nada aprendiam nem esqueciam, os 12 sábios lá vêm com a lengalenga do governo ter ido «mais além do que estava acordado no Memorando de Entendimento» - a este propósito releia-se este post.
Para tentar elevar a água ao seu moinho, os sábios adulteram os factos. Como se a «redução do investimento em capital físico e humano» que tem mais de uma década se tivesse iniciado em 2011 com a austeridade. Comparem-se as médias da Formação Bruta de Capital Fixo a preços constantes (Fonte: Pordata) em 2000-2002 – 43.352 e 2009-2011 - 36.331 (milhões de euros).
E avançam as mesmas receitas de sempre do «aumento de recursos para área de transferência de tecnologia» para reforço das «instituições de ensino superior e dos centros de transferência de tecnologia existentes», recursos que, supõe-se, estariam disponíveis porque a «sustentabilidade orçamental só pode ser avaliada num quadro de médio e longo prazo» (do you know what they mean? don’t you?). Nesses amanhãs que cantarão o ajustamento orçamental será prosseguido escrevem: respeitando os direitos e a Constituição; como parte de uma estratégica de crescimento económico; num quadro que garanta estabilidade; com autonomia e responsabilidade às instituições públicas e, last but not least, com o «respeito pelos compromissos internacionais (...) em conjunto com uma pressão negocial», ou seja uma espécie de estratégia grega, com boas maneiras e sem o Alexis e o Yanis.
Este capítulo termina com a lamúria também habitual sobre «os jovens, os desempregados de longa duração, os trabalhadores precários e independentes e as famílias de rendimentos médios e baixos suportaram a maior parte dos custos da crise». Lamúria que passa por cima de alguns factos, como seja o de que as pessoas menos afectadas pelas medidas foram as de menores rendimentos (veja-se aqui o mito desmistificado com os dados da OCDE), mas a lamúria é precisa para camuflar a defesa da base eleitoral do partido do Estado em Portugal: funcionários públicos e pensionistas a quem a austeridade atingiu com mais dureza. Ou mistura evoluções de médio e longo prazo com supostos efeitos das medidas de austeridade: há 20 anos, em 1994, havia 345 mil trabalhadores com contrato a termo, menos do que os 390 mil em 1984; em 2008, antes da crise financeira, os contratos a termo já tinham mais do duplicado para 708 mil e, curiosamente, comprometendo a demonstração da tese, em 2014 descerem para 644 mil.
(Continua)
1 comentário:
Só hoje reparei. O Messias até tem auréola!
Cor-de-rosa...
Abraço
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