Our Self: Um blogue desalinhado, desconforme, herético e heterodoxo. Em suma, fora do baralho e (im)pertinente.
Lema: A verdade é como o azeite, precisa de um pouco de vinagre.
Pensamento em curso: «Em Portugal, a liberdade é muito difícil, sobretudo porque não temos liberais. Temos libertinos, demagogos ou ultramontanos de todas as cores, mas pessoas que compreendam a dimensão profunda da liberdade já reparei que há muito poucas.» (António Alçada Baptista, em carta a Marcelo Caetano)
The Second Coming: «The best lack all conviction, while the worst; Are full of passionate intensity» (W. B. Yeats)

31/10/2005

AVALIAÇÃO CONTÍNUA: uma carta com magma

Secção Still crazy after all these years
As associações empresarias portuguesas nas suas diferentes encadernações (CIP, AEP, AIP), foram a semana passada à assembleia da República apresentar aos deputados o Relatório da Competitividade e confessar o seu objectivo de conseguir que Portugal seja um dos países «mais desenvolvidos e atractivos da União Europeia» até 2015.

Se ser dos «mais desenvolvidos» significar ter um dos PIBs per capita mais elevados, umas contas de merceeiro mostram que tal só seria possível se a economia portuguesa crescesse 5 a 6% acima da média dos outros países «mais desenvolvidos» a que iríamos fazer companhia. É obra, mas não é coisa para assustar os nossos empresários, que já em 2003 na apresentação da Carta Magna da Competitividade tinham prometido o mesmo para 2013.

Podemos talvez explicar o wishful thinking empresarial pelo ambiente delirante do parlamento, potenciado pelos eflúvios de maconha procedentes do gabinete dos bloquistas - não é verdade que o camarada profeta Anacleto confessou à TSF ter experimentado a erva nos seus tempos loucos da juventude, enquanto cometia atrevidas infracções ao código da estrada?

Com eflúvios ou sem eflúvios, os nossos empresários ganharam o direito a 4 chateaubriands, por tomarem a nuvem dos eflúvios por Juno, e 3 bourbons pela reincidência da Carta Magna.

30/10/2005

AVALIAÇÃO CONTÍNUA: ver um argueiro no olho próprio e não ver uma tranca no alheio

Secção George Orwell
A semana passada, 30 representantes de pais, professores, autarquias e partidos políticos, certamente também pais a maioria deles, consideraram-se incompetentes para educar os seus filhos numa matéria nuclear ao seu papel de pais: a teoria e a prática da perpetuação da espécie, assegurada por meios gratificantes.

Suspeito que ao reconhecerem a incompetência terão tido carradas de razão. Nada os autorizava, contudo, a falar em nome das outras centenas de milhar de pais dos cachopos que frequentam as nossas escolas secundárias, pedindo ao governo para adoptar a educação sexual como matéria obrigatória.

Acresce que o módico de lucidez que os membros do Conselho Nacional de Educação mostraram ao reconhecerem-se incompetentes, foi prontamente posto em causa pelo facto de reconhecerem competência a um corpo de profissionais reconhecidamente incompetente para instilar nas meninges dos cachopos os rudimentos da língua pátria, da matemática e de outras matérias áridas e comprometedoras da felicidade que as escolas devem proporcionar.

Atribuo 3 afonsos aos conselheiros pelo reconhecimento da incompetência própria e 5 chateaubriands pelo não reconhecimento da alheia.

SERVIÇO PÚBLICO: o private banking sob o foco do vasculhar em curso

Os episódios já vistos do vasculhar que a Judite e o DCIAP estão a levar a efeito nalguns bancos pertencem a uma novela que é um exemplo dos piores costumes que minam este nosso Portugal das mentes pequeninas.

Pela banda da banca a novela mostra a sobranceria e expectativa de impunidade com que montaram e mantiveram durante anos um serviço de evasão fiscal para os seus clientes do private banking. Isto é conhecido de muita gente há demasiado tempo.

Pela banda do BdeP mostra que está mais preocupado em produzir sound bites e em fazer fretes ao governo, do que levar a cabo genuínas acções de inspecção e fiscalização como lhe competiria como autoridade de supervisão.

Pela banda da face visível da Judite e do DCIAP, o vasculhar caótico de milhares de contas e a incúria exuberantemente evidenciada (segundo o presidente da APB disse na televisão, há informação confiscada aos bancos nos elevadores do DCIAP), mostram a sensibilidade de um hipopótamo numa perfumaria, o pouco escrúpulo legal e um completo desprezo pelo direito ao sigilo.

Pela banda da face invisível da Judite e do DCIAP, o trombetear para os mídia das acções policiais mostra como também esta parte do aparelho do estado napoleónico-estalinista está infiltrada e ao serviço dos lóbis partidários e corporativos.

Pela parte dos mídia, mostra a mal disfarçada satisfação de ver o «capital financeiro» a escorregar na sua própria lama, aflorando debaixo daquele respeitinho reverencial com que, por diversas razões sobre as quais agora não tenho tempo de discorrer, tratam os senhores da finança, sempre tão educados, elegantes e bem-falantes.

Pela parte do populacho, mostra o profundo gozo de ver entalados aqueles «ricos» que levam as «grandes fortunas» de outros «ricos», uns e outros «gatunos», «lá para fora», enquanto os pobres contam as patacas para as esticar até ao fim do mês.

Pela parte do governo, mostra os primeiros sinais de duplicidade. Por um lado, a facção dos vingadores, quer, não tanto a punição exemplar dos culpados, mais o seu opróbrio público. Por outro lado, a facção «pragmática», deseja que tudo isto se resolva deixando o embaraço escorregar para dentro das gavetas da incompetência policial e judicial.

E pela banda dos clientes? Esses fizeram o que lhes competia, adoptando os comportamentos adequados à situação de pilhagem fiscal laxista e incompetente, com tanto escrúpulo como todos os outros. It's just business.

28/10/2005

SERVIÇO PÚBLICO: simplificação administrativa

O Decreto-Lei n.º 178-A/2005 hoje publicado cria o «Documento único automóvel». É um paradigma do que o governo entende como simplificação administrativa.

«Especificações do certificado de matrícula em papel:
2.1 - As dimensões totais do certificado de matrícula não devem exceder as dimensões do formato A4 (210 mm x 297 mm) ou de um desdobrável de formato A4.
2.2 - Sem prejuízo da possibilidade de a entidade emissora introduzir elementos de segurança adicionais, o papel utilizado para o certificado de matrícula deve ser protegido contra a falsificação por meio da utilização de, pelo menos, duas das técnicas seguintes:
a) Grafismos;
b) Marca de água;
c) Fibras fluorescentes; ou
d) Impressões fluorescentes.
2.3 - A primeira página do certificado de matrícula deve conter as informações seguintes:
a) A menção «República Portuguesa»;
b) A letra «P», em maiúscula, como sinal distintivo de Portugal;
c) A indicação das autoridades competentes;
d) A menção «Certificado de matrícula», em corpo grande, podendo esta menção apresentar-se a uma distância adequada, impressa em corpo pequeno, noutras línguas da Comunidade Europeia;
e) A menção «Comunidade Europeia»;
f) A indicação do número do documento.
2.4 - O certificado de matrícula deve igualmente conter as informações seguintes, precedidas dos respectivos códigos comunitários harmonizados:
(A) Número de matrícula;
(B) Data da primeira matrícula do veículo;
(C) Dados pessoais:
(C.1) Titular do certificado de matrícula:
(C.1.1) Apelido(s) ou denominação comercial;
(C.1.2) Outro(s) nome(s) ou inicial(ais) (quando aplicável);
(C.1.3) Morada em Portugal na data de emissão do documento;
(C.4) Se as informações do n.º 2.5, código (C.2), não constarem do certificado de matrícula, referência do facto de o titular do certificado de matrícula:
a) Ser o proprietário do veículo;
b) Não ser o proprietário do veículo;
c) Não estar identificado no certificado de matrícula como proprietário do veículo;
(D) Veículo:
(D.1) Marca;
(D.2) Modelo:
Variante (se disponível);
Versão (se disponível);
(D.3) Denominação(ões) comercial(ais);
(E) Número de identificação do veículo;
(F) Massa:
(F.1) Massa máxima em carga tecnicamente admissível, excepto para motociclos;
(G) Massa do veículo em serviço com carroçaria e, no caso de um veículo tractor de qualquer categoria que não a categoria M1 (quilograma), com dispositivo de engate;
(H) Validade da matrícula, caso não seja ilimitada;
(I) Data da matrícula a que se refere o certificado;
(K) Número de homologação do modelo (se disponível);
(P) Motor:
(P.1) Cilindrada (em centímetros cúbicos);
(P.2) Potência útil máxima (em kW) (se disponível);
(P.3) Tipo de combustível ou fonte de energia;
(Q) Relação potência/peso (em kW/kg) (apenas para os motociclos);
(S) Lotação:
(S.1) Número de lugares sentados, incluindo o lugar do condutor;
(S.2) Número de lugares em pé (se aplicável).
2.5 - O certificado de matrícula pode ainda incluir os seguintes dados, precedidos dos respectivos códigos comunitários harmonizados:
(C) Dados pessoais:
(C.2) Proprietário do veículo (repetir o número de vezes correspondente ao número de proprietários):
(C.2.1) Apelido(s) ou denominação comercial;
(C.2.2) Outro(s) nome(s) ou inicial(ais) (se aplicável);
(C.2.3) Morada em Portugal na data de emissão do documento;
(C.3) Pessoa singular ou colectiva autorizada a utilizar o veículo em virtude de um direito legal que não a propriedade do veículo:
(C.3.1) Apelido(s) ou denominação comercial;
(C.3.2) Outros(s) nome(s) ou inicial(ais) (se aplicável);
(C.3.3) Morada em Portugal na data de emissão do documento;
(C.5) (C.6) (C.7) e (C.8) Se a alteração dos dados pessoais a que se referem os n.os 2.4, código (C.1), 2.5, código (C.2), ou 2.5, código (C.3), não der lugar à emissão de um novo certificado de matrícula, os novos dados pessoais correspondentes podem ser inseridos com os códigos (C.5), (C.6), (C.7) ou (C.8). Neste caso devem ser desagregados de acordo com as referências constantes dos n.os 2.4, código (C.1), 2.5, código (C.2), 2.5, código (C.3), e 2.4, código (C.4);
(F) Massa:
(F.2) Massa máxima em carga admissível do veículo em serviço em Portugal;
(F.3) Massa máxima em carga admissível do conjunto em serviço em Portugal;
(J) Categoria do veículo;
(L) Número de eixos;
(M) Distância entre eixos (em milímetros);
(N) No caso dos veículos com massa total superior a 3500 kg, distribuição entre os eixos da massa máxima em carga tecnicamente admissível:
(N.1) Eixo 1 (em quilogramas);
(N.2) Eixo 2 (em quilogramas), quando aplicável;
(N.3) Eixo 3 (em quilogramas), quando aplicável;
(N.4) Eixo 4 (em quilogramas), quando aplicável;
(N.5) Eixo 5 (em quilogramas), quando aplicável.
(O) Massa máxima rebocável tecnicamente admissível:
(O.1) Reboque com travão (em quilogramas);
(O.2) Reboque sem travão (em quilogramas);
(P) Motor:
(P.4) Regime nominal (em min-1);
(P.5) Número de identificação do motor;
(R) Cor do veículo;
(T) Velocidade máxima (em km/h);
(U) Nível sonoro:
(U.1) Estacionário [em dB(A)];
(U.2) Regime do motor (em min-1);
(U.3) Em circulação [em dB(A)];
(V) Gases de escape:
(V.1) CO (em g/km ou g/kWh);
(V.2) HC (em g/km ou g/kWh);
(V.3) NO(índice x) (em g/km ou g/kWh);
(V.4) HC + NO(índice x) (em g/km);
(V.5) Partículas no caso dos motores diesel (em g/km ou g/kWh);
(V.6) Coeficiente de absorção corrigido no caso dos motores diesel (em min-1);
(V.7) CO(índice 2) (em g/km);
(V.8) Consumo de combustível em ciclo combinado (em l/100 km);
(V.9) Indicação da classe ambiental de homologação CE; referência da versão aplicável por força da Directiva n.º 70/220/CEE ou da Directiva n.º 88/77/CEE;
(W) Capacidade do(s) depósito(s) de combustível (em litros).
2.6 - As entidades emissoras podem incluir no certificado de matrícula informações complementares, designadamente acrescentando, entre parêntesis, aos códigos de identificação, conforme estabelecido nos n.os 2.4 e 2.5, códigos nacionais adicionais.»

SERVIÇO PÚBLICO: as coisas nunca estão tão más que não possam piorar

Comentei aqui a euforia que me assaltou, contaminado por inúmeras luminárias, que celebraram a nossa subida ao 22.º lugar do ranking do Word Economic Forum.

Confessei então que essa minha euforia durou menos do que as bolhas virtuais do champanhe (que não chegou a ser aberto), esvaziada pela Joana do Semiramis, essa jeremias da Bloguilha, com este seu post derrotista.

Uma outra peça ainda mais derrotista, publicada no Público pelo doutor Medina Carreira (pode ser lido aqui nos maçónicos do Grande Loja), despertou-me a atracção pelo abismo e lá fui desenterrar a confirmação pelo ranking do Doingbusiness do World Bank. Quando esquecemos alguns dos indicadores usados pelo World Economic Forum em que a nossa excelência brilha a grande altura, tais como os “custos do terrorismo” (1º lugar), “liberdade de imprensa” (4º), “acesso aos telemóveis” (9º), baixa influência do “crime organizado” (7º) e “independência dos tribunais” (15º), e nos concentramos no business as usual, não podemos esperar grande coisa.

Podemos, contudo, consolar-nos da miséria de ficarmos atrás do Bostwana, com a glória de ficarmos à frente do panteão europeu do culto de l'État.


Ainda assim, a nossa medíocre performance na «facilidade de fazer negócios» e convencer os bancos a emprestar a grana, não é acompanhada pela facilidade de começar um novo negócio, quer a tratar da papelada quer a contratar o pessoal (para não mencionar despedi-lo).

27/10/2005

BLOGARIDADES: ainda é cedo para deitar foguetes

Há sinais, sim senhor, mas ainda é cedo para anunciar a emergência do liberalismo.

Por enquanto trata-se apenas da desorientação da mente das luminárias do colectivismo. Daí até à sua conversão vai uma eternidade, talvez apenas ligeiramente mais curta do que eternidade requerida para enxugar o colectivismo que impregna o nosso bom povo até ao osso mais recôndito.

Talvez se possa começar a anunciar a inversão do ónus da prova. O que não é nada mau.

CONDIÇÃO MASCULINA: o macho conformista

«It may be small comfort to evolutionists, but my wife assures me that I am evidence against intelligent design»
(David Unger, leitor de Toronto de The Economist, a propósito deste artigo)

TRIVIALIDADES: descoberto o prião de Creutzfeldt-Jakobs num urinol do palácio de Belém

Deve ser por isso que um antigo inquilino, que lá passou 10 anos a conspirar, quer voltar e jura que é «um factor de estabilidade e de concórdia nacional».

O bicho ficou lá amodorrado e atacou 10 anos depois o actual inquilino que, para fechar 4 anos a mastigar sound bites contra a intervenção ianque no Iraque, descobriu (depois de saber disto) que «é do interesse de toda a comunidade internacional que os Estados Unidos e seus aliados sejam bem sucedidos naquele país».

Ainda vamos a ver o novo inquilino, contaminado pelo prião, converter-se ao neo-liberalismo.

26/10/2005

LA DONNA E UN ANIMALE STRAVAGANTE: «Não é bom, nem mau. É assim.»

«A minha teoria é que são necessárias quatro condições para se chegar ao topo, seja-se homem, seja-se mulher: os genes, a educação, a oportunidade e a ambição. Quanto a mim, o que falta às portuguesas é a última condição. Uma executiva de topo ou uma política de topo tem poder, e é preciso gostar-se do poder. O poder acarreta responsabilidade e protagonismo, e é preciso ter-se gosto por isso.
Não é bom, nem mau. É assim.
»
(Vera Nobre da Costa, uma executiva bem sucedida, na sua coluna de opinião «Do homem a praça, da mulher a casa?», no Caderno Economia do Expresso de 22-10)

O que falta às portuguesas também falta aos portugueses. Não me refiro à ambição - afinal somos nós que temos aquele ditado popular «sol na eira e chuva no nabal». Não me refiro ao protagonismo - todos gostamos dos 15 minutos de fama que o McLuhan disse que temos direito. Refiro-me à responsabilidade.

25/10/2005

CASE STUDY: l'État c'est nous

Porque se enfurecem os sindicatos franceses com a envergonhada privatização de 15% desse colosso chamado Electricité de France?

Percebe-se que receiam a perda de privilégios da legião de empregados do colosso, ainda que à custa dos 60 milhões de consumidores. Mas como perceber o eco que as suas palavras de ordem previsivelmente encontrarão em milhões desses consumidores? É o culto de l'État entranhado há séculos nas meninges daquelas criaturas. Uma relação de dependência e ódio que ciclicamente levanta as pedras da calçada para descobrir praias imaginárias que lá não existem. É um culto que por estas bandas também contamina bastantes almas a que, porém, não chega a convicção para levantar as pedras da calçada.

SERVIÇO PÚBLICO: porventura capital

O suplemento de Economia de O Independente de 21-10 fez referência ao peso que o estado napoleónico-estalinista numa área que se esperaria imune à intervenção do Monstro do doutor Cavaco: as sociedades de capital de risco (SCR).

Como se sabe, essas criaturas são uma tosca adaptação do venture capital à realidade do nacional-colectivismo doméstico. Em muitos casos que pessoalmente tive conhecimento, as SCR entraram no capital de empresas inviáveis, por vezes tecnicamente falidas, em sectores tradicionais, com produtos sem qualquer inovação, frequentemente após intensa actividade de lobbying, geralmente canalizado pela via larga do bloco central (que é uma coisa que os distraídos julgam já não existir).

Por curiosidade, fui dar uma olhada ao sítio da Associação Portuguesa de Capital de Risco e de Desenvolvimento. Vale a pena, em particular este relatório. Dele extraio o gráfico seguinte que dá uma bela ideia da presença sufocante do estado napoleónico-estalinista num domínio em que seria suposto estar completamente afastado, por absoluta, definitiva, demonstrada e irrevogável incapacidade para avaliar e assumir riscos.

24/10/2005

BLOGARIDADES: é o odor corporal que divide a esquerda e a direita

Se alguma coisa divide a esquerda e a direita, será o odor corporal. Esta é a versão galhofeira deste inspirado e historicamente fundamentado post blasfemo, a não perder sob nenhum pretexto (de esquerda ou de direita).

ARTIGO DEFUNTO: não havia necessidade

Para quem tenha lido no caderno Economia & Internacional do Expresso de 22-10 a peça de Luísa Meireles «O modelo em questão» e lhe tenha soado vagamente familiar, não tanto as palavras, mas a abordagem e a «modelização», fique a saber que não foi o único. Aconteceu-me o mesmo. Ainda procurei alguma referência a fontes, mas nada.

Se a coisa lhe pareceu familiar, é muito provável que seja um assinante ou pelo menos um leitor regular de The Economist, que publicou no número de 1-10 na secção Charlemagne uma peça com o título «Choose your poison» que foi certamente a fonte não citada do «estudo» da jornalista.

Reconheço que, face aos paradigmas vigentes no jornalismo doméstico, não é especialmente grave escrever uma peça colada a outra. Já por cá vimos coisa infinitamente mais vergonhosa. Mas não havia necessidade - a gente lia na mesma, até com mais confiança, se a peça original fosse referenciada.

23/10/2005

AVALIAÇÃO CONTÍNUA: demais para as corporações, de menos para as reformas

Secção Tiros nos pés
O que se pode dizer deste orçamento? Que é o orçamento possível? Que é o melhor orçamento dos últimos anos? A mim parece-me que é um tiro no pé do governo. Porque já se ouve o rufar dos tambores das corporações, que a seu tempo se maninfestarão, mas não se vislumbra um módico de reformas do estado napoleónico-estalinista, de dietas impostas à voracidade vaca marsupial pública. Onde estão as medidas de reorganização, de emagrecimento das estruturas redundantes e improdutivas que enxameiam a administração pública?

Que este governo ainda não tem responsabilidades na ruptura anunciada da sustentabilidade do sistema de segurança social aceita-se, mas não se compreende que «a mesma equipa que há cinco anos, no governo de António Guterres, garantiu, através de um estudo, que o sistema de previdência em repartição era sustentável até 2100, diz agora que o saldo foi negativo em 2004 e admite utilizar o Fundo de Estabilização da Segurança Social já em 2007. Apesar de tudo, no orçamento para o próximo ano, adia a prometida introdução da capitalização do regime.» (Semanário Económico)

Alguém acredita que as oportunidades que agora se estão a perder para introduzir as reformas necessárias voltarão a surgir à medida que se aproximar o fim da legislatura?

Dois afonsos é uma magnanimidade do Impertinências para premiar o orçamento, na parte que vai chatear os interesses instalados, e quatro chateaubriands porque chatear é quase tudo o que sobra do orçamento, descontado o business as usual.

22/10/2005

BREIQUINGUE NIUZ: o texano tóxico, segundo Bono

«You went from friend of Bill Clinton to flashing a peace sign in a photo op with George W Bush.

I was in a photo with President Bush because he’d put $10 billion over three years on the table in a breakthrough increase in foreign assistance called the Millennium Challenge. I had just got back from accompanying the president as he announced this at the Inter-American Development Bank.

I kept my face straight as we passed the press corps, but the peace sign was pretty funny. He thought so, too. Keeping his face straight, he whispered, “There goes a front page somewhere: Irish rock star with the Toxic Texan.”

I think the swagger and the cowboy boots come with some humour. He is a funny guy. Even on the way to the bank he was taking the piss. The bulletproof motorcade is speeding through the streets of the capital with people waving at the leader of the free world, and him waving back.

I say: “You’re pretty popular here!”

He goes: “It wasn’t always so . . .” — Oh really? — “Yeah. When I first came to this town, people used to wave at me with one finger. Now, they found another three fingers and a thumb.”

So you liked this man?

Yes. As a man, I believed him when he said he was moved to also do something about the Aids pandemic. I believed him. Listen, I couldn’t come from a more different place, politically, socially,geographically. I had to make a leap of faith to sit there. He didn’t have to have me there at all. But you don’t have to be harmonious on everything — just one thing — to get along with someone.
»

(entrevista, já com barbas, de Bono ao Sunday Times - via ¡No Pasarán!)

aqui escrevi que, não sofrendo de bushfobia, também não sou exactamente um admirador de George Bush, quer da pessoa quer do político. Apenas sinto «uma simpatia mitigada, como contrapartida ao ódio doentio que lhe devotam os crentes do politicamente correcto e a esquerdalhada em geral.»

Ao ler a entrevista de Bono, personagem que me deixa indiferente quando o ouço e me irrita ligeiramente quando o vejo, concluí que ficava a dever-lhe uma (ao Bono, não ao Bush): afinal o homem existe por trás daqueles chapeuzinhos e daqueles óculos ridículos e foi capaz de olhar o George W. por trás do estereotipo que os seus compagnons de route inventaram.

In dubio pro Bono.

21/10/2005

AVALIAÇÃO CONTÍNUA: Zé Mourinho, um macho alfa

Secção Res ipsa loquitor
Não é preciso (mas ajuda) frequentar A Causa Foi Modificada e ler o que escrevem os jornais ingleses para perceber o génio de José Mourinho como treinador.

Para ser o melhor treinador do mundo, o homem tem que ser notável a vários títulos. Inteligência espacial (o olho da águia que sobrevoa o campo de batalha e vê por cima o que os outros só vêem por baixo), flexibilidade e rapidez mental, génio táctico, etc., etc. e etc. E, claro, liderança - uma visão (vamos comê-los vivos) e uma influência magnética para a transmitir aos 11 fanatizados que têm a incumbência de destroçar e demolir as tropas inimigas.

Como é que um espécime destes poderia continuar a treinar o FêCêPê, os lampiões ou os lagartos? Não podia.

Como é que ele resistiu aos paradigmas de frouxidão que as mães portuguesas, com a cumplicidade apática dos frouxos pais, inculcam nos filhos? Como sobreviveu ao culto da mediocracia que as escolas alimentam nos alunos e ao caldo cultural fermentado em séculos de decadência? Como não foi derrotado pelos grupos de influência invejosa e medíocre que ensopam o futebol português?

É um num milhão. Só pode ser. Outro qualquer, bem parecido e bem falante como o Zé, e com jeito para os futebóis, já estaria transformado em cabide dos armanis, já seria um metrossexual (que coisa é esta, hem?) a falar futebolês caro e a empertigar-se para as TVs.

Zé, por tudo isto, e outras coisas de que não falo porque me falta o engenho, levas 5 merecidos afonsos.

20/10/2005

CASE STUDY: como conseguir que todos os proprietários de florestas sejam imprudentes e negligentes

«A proposta técnica para a definição de um Plano Nacional de Protecção de Defesa da Floresta contra Incêndios (PNDCFI), encomendada pelo Ministério da Agricultura e executada pelo Instituto Superior de Agronomia, prevê» que os proprietários de florestas (possivelmente com a excepção do maior de todos eles - o Estado) serão obrigados a dividir entre si os prejuízos resultantes dos incêndios florestais, pagando adicionalmente à quota parte proporcional nesses prejuízos cargas para suportar os custos de gestão. Deste modo, os proprietários prudentes e diligentes passarão a contribuir para os proprietários imprudentes e negligentes. Espera-se que, após alguns anos, todos os proprietários sejam imprudentes e negligentes.

(Jornal de Negócios)

SERVIÇO PÚBLICO: Oil for food - the french connection

Por alguma razão que me escapa, não encontrei na Bloguilha vestígios de comentários a esta notícia que já tem uma semana.

Jean-Bernard Mérimée, antigo embaixador de França na ONU está a ser acusado por um tribunal francês (hélas) de ter concedido favores a Saddam em troca de «direitos sobre a venda de dois milhões de barris de petróleo». Este escândalo pode estar ligado por pipeline ao outro que envolve o filho de Kofi Annan, visto que essa venda foi feita por uma empresa acreditada na ONU.

Escreve o Público, com alguma ingenuidade, que «o caso constitui um embaraço para as autoridades francesas, acusadas por Washington de não terem apoiado a guerra contra o regime de Saddam devido aos interesses económicos que tinham no Iraque». Na verdade as autoridades francesas há muito que deveriam estar embaraçadas - por exemplo desde que se sabe isto.

19/10/2005

BLOGARIDADES: Freud explicaria

O doutor Mário Soares, talvez para compensar a ausência da famosa vaga de fundo, a notória falta de entusiasmo das gerações que lhe estão mais próximas, tem investido nos jovens através dos seus putativos procuradores.

Ao invés de «rentabilizar» a sua notável experiência como homem e como político, procura seduzir esses jovens mostrando o seu monumental ego, o seu pós-modernismo, frescura e irreverência a que podemos chamar irresponsabilidade.

A coisa está a ir bastante longe. Veja-se o símbolo escolhido por alguns dos seus jovens procuradores para o novo blogue SUPERMÁRIO.


A 2ª infância do doutor Mário

DIÁRIO DE BORDO: o homo sinister não é homo sapiens sapiens

Esta insurgência do insurgente 3A, a propósito duma conferência de Johan Norberg, levou-me a reflectir sobre um tema que me é caro. Caro porque acredito que está no centro da especificidade do homo sapiens sapiens, e caro porque paguei imenso por ele em várias fases da minha vida.

Trata-se da livre escolha e da responsabilidade individual. É aqui também, neste campo ético, que a visão liberal, em qualquer das suas variantes, se distingue claramente da visão colectivista, seja ela da direita dinossáurica ou da esquerda totalitária (incluindo nesta algumas facções bloquistas travestidas, por razões tácticas, de respeitadoras das liberdades democráticas).

Os pressupostos éticos do colectivismo decorrem duma visão monstruosa do género humano. O colectivismo, de direita ou de esquerda, vê os humanos como seres irresponsáveis incapazes de fazerem pela sua vida, carecendo constantemente do colo do moloch estatal e da endoutrinação das luminárias ao seu serviço.

A unicidade (est)ética do colectivismo (*)

(*) Um cartaz neo-realista do PCUS? Do PCP? Do MRPP? Da UDP? Da LCI? Veja a resposta aqui. Também pode ler aqui um ensaio impertinente sobre o homo sinister.

18/10/2005

SERVIÇO PÚBLICO: os esqueletos espreitam nos armários

«O povo judeu, não ascendendo a 0,2% da população mundial, granjeou 19% dos Nobel da Química, 26% dos Nobel da Física, 28% dos Nobel da Medicina, 39% dos Nobel da Economia, 13% dos Nobel da Literatura e 10% dos Nobel da Paz. Nenhum outro povo contribuiu tanto para a cultura, a ciência e a tecnologia. Portugal entrou em decadência desde que os portugueses sefarditas foram expulsos ou compelidos a abnegar a sua cultura e religião, diluindo-se na mediocridade coeva. Não é por acaso que o islamismo, o nazismo e a extrema-esquerda, hostis ao conhecimento e à liberdade, convergem no anti-semitismo.» (post de Ninno do Grande Loja do Queijo Limiano)
Será por acaso que “Paradise Now” («is the first openly anti-Semitic film I’ve seen in the German cinema», nas palavras do DavidsMedienkritik), foi financiado pelo governo alemão e por outros governos europeus numa co-produção europeia?

No clima de decadência económica, social e política da Europa continental, os esqueletos duma outra época de profunda crise espreitam dentro dos armários.

17/10/2005

ESTÓRIA E MORAL: uma lição de direito do coronel Chávez ao advogado Sampaio

Estória
Um presidente da República, que noutra encarnação foi advogado, ao interceder por um cidadão do país a que preside, que por um acaso costuma manter um stock de milhares de cidadãos em regime de prisão preventiva, para não estragar o remanso das sestas da polícia e dos tribunais, fez um pedido a outro presidente duma outra República, que alguns chamam das bananas, mas que mais apropriadamente se poderia chamar do pitról.

E que pediu o primeiro ao segundo, que noutra encarnação foi um militar golpista? Pediu para intervir no caso do tal cidadão arguido num caso de droga e ouviu como resposta uma lição de direito: essa questão é da “competência dos tribunais”. (Público)

Moral
Em casa de ferreiro, espeto de pau (ditado popular).

16/10/2005

AVALIAÇÃO CONTÍNUA: zurzindo as vacas sagradas

Secção Frases Assassinas
«O senhor Manoel de Oliveira tem o seu público. Serão cerca de 9 mil fiéis em Portugal e outros 10 mil em França. Se conseguir chegar a todos atinge 100 por cento do seu público-alvo.»

«Paulo Branco conseguiu moldar o sistema em seu próprio proveito. Tiro-lhe o chapéu. Só fez o que o deixaram fazer.»

«Se o mercado, funcionando livremente, não financiar o senhor Manoel de Oliveira, o Estado deve subsidiá-lo. É preferível que seja assim. Manter a farsa dos concursos é que não faz sentido.»

«Enquanto o senhor Manoel de Oliveira conseguir filmar, o Estado deve apoiá-lo, até porque é a maneira de Portugal entrar no "Guiness".»

«João César Monteiro não podia ter feito um filme preto pago com o dinheiro do Estado. Não podia ter concorrido a um financiamento dizendo que o filme ia custar 260 mil contos de forma a receber 130 mil.»
Disse, com lucidez, em entrevista a O Independente de 14-10, António-Pedro Vasconcelos, provavelmente o nosso realizador menos subsídio-dependente. Merece por isso 3 afonsos.

Infelizmente tenho que dar-lhe também 3 chateaubriands por se continuar a afundar no pântano dos «apoios», manifestando tão pouca fé no mercado, como pouca inclinação mostra o mercado pelos delírios senis do senhor Oliveira ou os devaneios onanistas do senhor Monteiro.

15/10/2005

DIÁRIO DE BORDO: eu também não, mas

«Não vejo qualquer diferença entre fazer sexo em público ou entrar num filme pornográfico e dar um concerto ou gravar um disco. Ambas são ocupações artísticas.» Palavras de Pilar, citadas por O Independente, para comentar a performance sexual do seu filho Eloy com uma porno-profissional perante um plateia de milhares de pessoas no Festival Internacional de Cinema Erótico de Barcelona.

Eu também não vejo grande diferença entre a performance do Eloy e as performances de muitos outros artistas, com vantagem para o Eloy que deve ter demonstrado uma firmeza que em muitos tem a consistência da gelatina.

Contudo, a história parece evidenciar uma relação estes eventos «fracturantes», que os moralistas consideram exemplos de decadência moral, e a decadência civilizacional das sociedades que os promovem. Pode ser coincidência, mas.

13/10/2005

SERVIÇO PÚBLICO: ó senhores doutores dos Santos e Pinho

Façam-se o favor de ler a entrevista do vosso homólogo Gordon Brown, que não é exactamente um liberal, neo ou qualquer das outras variantes, ao Financial Times, aqui sumariada pelo Diário Económico.

Já é um pouco tarde, mas talvez ainda vão a tempo de perceber o beco sem saída em que se estão a meter (já lá se-atolaram-se e de só de lá saem com tracção às 4-rodas-4).

BLOGARIDADES: exílio interior

«Como um espectro, regressa. Para quem se lembra, os próximos três meses serão dolorosos. Quem não se lembra provavelmente voltará a lembrar-se. Pensei, pensámos muitos, que há dez anos teríamos superado de vez esta fase - a constante invocação do superior «interesse de Portugal» para cobrir todas as suas conveniências (como voltámos já a ouvir por estes dias), aquele farisaísmo, aquele paternalismo antipolítico e antidemocrático. Mas, em dez anos, a direita não descobriu outro chefe, e a esquerda hipotecou o seu tempo com António Guterres, que até há poucos meses conseguiu deixar o PS ainda suspenso de uma putativa candidatura presidencial.
Há razões para a depressão, e não é só o défice. Mas também há razões para a acção.»


Substitua-se «interesse de Portugal» por «ética republicana», «dez anos» por «trinta anos», «direita» por «esquerda», «esquerda» por «direita», Guterres por Cavaco, PS por PSD e teremos o Ivan de A Praia a perguntar-se se não deveria trocar a promoção da candidatura do doutor Soares pela do doutor Cavaco. Teremos? Teríamos, se a esquerda, incluindo a esquerda inteligente, não vivesse num irredutível exílio interior e não fosse portadora duma insuperável dificuldade de conviver com a realidade.

12/10/2005

SERVIÇO PÚBLICO: sem emenda

«O presidente da República, Jorge Sampaio, defendeu publicamente, pela primeira vez, que a política de restrição orçamental seguida pelos últimos governos está a ter efeitos nocivos e contraproducentes na economia portuguesa.

A tomada de posição consta de um prefácio assinado pelo Chefe de Estado no livro do Nobel da Economia, Joseph E. Stiglitz, intitulado "Os loucos anos 90". Jorge Sampaio assume posições inéditas sobre a política de austeridade orçamental e até contraditórias com discursos seus proferidos até aqui.»
(Jornal de Negócios)

E tem toda a razão. Se o engenheiro Guterres ainda por cá estivesse, se o governo dele continuasse a aumentar a pletora de funcionários públicos, a torrar grana em expos e em estádios, se o governo central e as autarquias continuassem a endividar-se para aumentar e torrar, se os particulares continuassem a endividar-se, se a banca continuasse a endividar-se para que os particulares se endividassem, viveríamos hoje muito melhor. Infelizmente temos a globalização, o neo-liberalismo, ou, para abreviar, a dura realidade de que é cada vez mais difícil encontrar quem nos financie uma vida acima das posses.

BLOGARIDADES: back to business

O Jaquinzinhos, um sulista, liberal (*) e emérito impertinente sucumbido ao síndrome de Agosto, ressuscitou como jcd, reencarnando como blasfemo.

O Blasfémias tende cada vez para uma posição monopolista na Bloguilha, em flagrante contraste com o seu credo liberal (aquela treta do «confirmando a teoria marxista da concentração capitalista» merece a pena capital).

(*) Há um 3.º atributo do Jaquinzinhos, que por pudor omito enquanto o senhor Peseiro fizer de conta que toma conta dos lagartos.

11/10/2005

DIÁLOGOS DE PLUTÃO: andam com o gajo ao colo

- Quanto é que o gajo tem?
- O gajo?
- Sim, o
gajo das finanças.
- Ah. Mais de 45.
- Mais de 45? Pode lá ser. Quarenta e cinco quê?
- Por cento.
- E o Alegre?
- Um pouco mais que o senhor doutor.
- A imprensa anda com o gajo ao colo. Só pode ser.
- Com o senhor Manuel?
- Não. Estou a falar do outro. E eu?
- O senhor doutor é muito pesado.
- Não é isso, porra. E eu, quanto é que tenho?
- Não chega a 16.
(inspirado nos desabafos do doutor Mário e nesta sondagem)

10/10/2005

DIÁRIO DE BORDO: cem anos de perdão

Pode-se imaginar muitas outras razões dialécticas para explicar porque são eleitos aquelas senhoras e aqueles senhores que têm mais processos em tribunal que anos de vida. Sim, pode-se imaginar. Mas não vale a pena. O povo vota neles porque sempre desconfiou (com boas razões) do Terreiro do Paço e prefere um ladrão que rouba ladrão (e tem cem anos de perdão) a um procurador (possivelmente também ladrão) da trupe estacionada no ou em trânsito para o Terreiro do Paço.

O povo rejeita os procuradores e escolhe os robins dos bosques (ou quem ele pensa que são) que irão sacar a grana ao Terreiro do Paço para torrar nas rotundas, nos polivalentes e em outras merdas que não servem para nada. Ou servem para usar meia dúzia de vezes por ano, como sejam os 21-«equipamentos»-21, a fingir de teatros, com que o ministério da Cóltura salpicou este ano o país «real», derretendo na obra 94,1 milhões de euros. (ver a peça «Teatromania» no caderno Actual do Expresso).


O major Valentim dirigindo a palavra ao povo num bosque em Gondomar

09/10/2005

DIÁLOGOS DE PLUTÃO: em palavras e actos

- «Quero fazer um apelo ao voto dos gays em Manuel Maria Carrilho, que é um candidato que nos apoia, não só em palavras mas em actos», disse, de cima dos seus saltos altos.
- Actos? Quais actos?, perguntou, tímido, o estagiário.
- Ora, filho. Actos.
- Poderia especificar.
- Essa pergunta é homofóbica e impertinente. Queres que fale com o teu director?, perguntou em surdina com o olho de goraz muito aberto e levemente ameaçador.
(diálogo imaginado entre o doutor António Serzedelo, presidente dum qualquer sindicato de bichas, e o estagiário da Lusa)

08/10/2005

DIÁRIO DE BORDO: vou ali votar e já volto

Marco de Canavezes? Felgueiras?

Fucking, Áustria

06/10/2005

SERVIÇO PÚBLICO: e se um furacão distraído varresse o Eliseu ou o Bundestag?

Os media europeus, e em especial os franceses, trataram o Katrina como um castigo divino para demonstrar a incompetência da administração federal (já agora esquecendo, convenientemente, a total inépcia das administrações democratas, estadual e local).

Bert Latour, um escritor que vive em França, recorda no «People Political» aos distraídos que a área atingida pelo Katrina é equivalente à do Reino Unido e pergunta-se o que teria acontecido às autoridades francesas se uma catástrofe dessa magnitude tivesse atingido a França, autoridades que, recordou, em 2003 deixaram morrer 15.000 pessoas (aproximadamente 15 vezes o número de vítimas do Katrina) durante um período de canícula. (lido em ¡No Pasarán!)


E se um furacão distraído varresse a Europa social? (imagem do Davids Medienkritik)

05/10/2005

PUBLIC SERVICE: one of them, both of them

«An eye-witness account of the talks between EU Commissioner Peter Mandleson and his Chinese counterpart, held in Beijing at the height of the textiles trade dispute:

"One of them was an unaccountable, unelected politician from a sprawling bureaucracy who was promoting protectionism," says the Confederation of British Industry Director, Sir Digby Jones. "And the other was Chinese."»

(Adam Smith Institute's quote of the week via Dissecting Leftism)

DIÁLOGOS DE PLUTÃO: ser singular é cada vez mais plural

- Filho, você já pensou o que vai fazer na vida?
- Já. Quero trabalhar pouco e ganhar muito dinheiro.
- ?
- O que achas, pai?
- Acho que é um programa popular.

04/10/2005

SERVIÇO PÚBLICO: a derrapagem continua

Os números referentes a Agosto divulgados pela direcção-geral do Orçamento, além de evidenciarem a contínua derrapagem das contas públicas, mostram também o seu incontornável resultado: o crescente nível de endividamento do Estado que aumentou para 61,8% do PIB estimado para 2005.

Dos 3 critérios de Mastricht só nos falta violar o da inflação. Podemos agradecer aos bens transaccionáveis que nos chegam da Alemanha, Espanha, França, etc., sem esquecer a China, sob a forma de componentes incorporados nos bens que importamos desses e outros países.

SERVIÇO PÚBLICO: o exílio interior da esquerdalhada

Para se perceber a angústia autista dum esquerdalho, o melhor é ter sofrido do síndrome na juventude e regressado ao mundo real com as meninges (mais ou menos) intactas. A segunda melhor maneira é ser filho de dois deles.
«My parents (God Bless my Father's memory and God Bless my Mother) were leftists, and her leftist friends think the NYTIMES is RIGHT-WING (or at best "centrist")! AND TO THEM ... IT IS! I tell them that this ONLY proves that they are so far left that even when they are looking right... they're still looking left!

I believe that the key to getting leftists change is to get them to open their eyes and get them off their left-wing media addiction (which leads them to EXCLUDE reading or watching anything that is right-of-center; in other words: their self-censorship - THEIR INNER EXILE). I believe that once reasonable people start to look at events from both sides, they will begin to "see the light."

The leftists in the USA and Europe - (and in the academy and in the MSM) - live in a self-imposed totalitarian regime of their own minds; whereas tyrannies like the USSR actively censored all media and prevented their trapped citizenry from reading any real news, and from reading any real history (of Communism or anything else), or from reading Hayek - or anything that opposed their rigid ideology, contemporary post-modern leftists voluntarily censor themselves and restrict their reading and viewing of news and commentary to the left-of-center media (which is still MOST of the media, so they don't FEEL like their censoring themselves).»

(ver mais neste post de The Astute Blog, via Dissecting Leftism)

03/10/2005

BLOGARIDADES: Há vida para além do pessimismo jeremíaco e doentio dos liberalóides

Sim. Há vida para além disso. Isso que, além de infundado, é nocivo à auto-estima nacional.

Pela pena do doutor Vital Moreira repõem-se as coisas no sítio. «Definitivamente, ao contrário dos dogmas neoliberais, um elevado grau de fiscalidade, de despesas públicas e de garantias sociais constituem um incentivo ao crescimento. (A propósito, Portugal ocupa um honroso 22º lugar...)», escreve esta prodigiosa luminária no causa nossa.

Estamos, portanto, no bom caminho. Já temos um elevado grau de fiscalidade e de despesas públicas, mas ainda há muito a fazer, para além de aumentar o IVA. Já temos uma constituição que garante os direitos adquiridos. É só um pouco mais de paciência e esperar a chegada do crescimento. Enquanto esperamos, podemos ler a produção teórica do causa nossa, como se sabe abrilhantada pela nossa pasionaria doutora Ana Gomes.

(O distraído Impertinências não frequenta causa nossa. Desta vez chegou lá por uma via herética)

DIÁRIO DE BORDO: Give me a break! Will you?

Estava eu a planear comemorar com a patroa o fim da depressão, da crise, da recessão, seja lá o que for o que nos consome a auto-estima - consumição cultivada com desvelo por essa corja de liberais de todos os matizes. Tinha a patroa recomendado abrirmos uma viúva, entontecer-nos com as bolhinhas, fazermos um brinde à nossa subida no ranking do Word Economic Forum. A ocasião justificava tudo isso. Não é todos os dias que nestes campeonatos em que nos batemos com estranja ficamos à frente da Irlanda, da Espanha (da Espanha), da França, da Bélgica, e deixamos a Grécia (a Grécia) e a Itália a perder de vista.

Antes de tirar a viúva do frigorífico resolvi dar uma volta por esses blogues liberalóides que enxameiam a Bloguilha. Azar. Comecei por bater à porta do Semiramis e ler o horripilante post. Corri a devolver a viúva à dispensa.

Afinal, segundo escreveu a Joana, o 22º lugar explicava-se pelos “custos do terrorismo” (1º lugar), “liberdade de imprensa” (4º), “acesso aos telemóveis” (9º), baixa influência do “crime organizado” (7º) e “independência dos tribunais” (15º).

E daí? Não falo do resto, que é evidente para todas as almas, salvo para esses liberalóides caseiros, mas não é verdade que a independência dos tribunais é um must entre nós? Quem se pode gabar de ter tribunais que se estão borrifando para os políticos, os criminosos, os inocentes, os arguidos, as testemunhas, os cidadãos, os prazos e a justiça?

É vontade de dizer mal. Give me a break! Will you?

02/10/2005

ESTÓRIA E MORAL: la putain de la Republique

Estória
O doutor Soares que tinha ganho até então tudo quanto havia para ganhar, incluindo uma página na história portuguesa do século XX, já foi traído pelo seu ego quando se dispôs a candidatar-se a presidente do parlamento Europeu e veio a perder contra uma «dona de casa», como ele lhe chamou, acabando sentado anonimamente na bancada.

Sem querer exagerar as notícias sobre a sua morte política antecipada, tudo indica que o seu apego ao palco o pode atraiçoar uma vez mais. E desta vez não se arrisca só a perder uma eleição. Arrisca-se a ser apagado da memória dos portugueses.

Se eu acreditasse que o engenheiro Sócrates é um príncipe maquiavélico, diria que manobrou as eleições autárquicas e as presidenciais para lhe limpar o terreno dentro do PS, matando duma só cajadada vários coelhos (e metendo eventualmente uns chumbos no doutor Jorge). A oposição liríco-esquerdista, simbolicamente encabeçada pelo poeta Alegre, a muito mais perigosa facção da família Soares (pai, filho e espíritos santos) e, de brinde, a cabeça da luminária enfatuada que dá pelo nome de professor Carrilho.

Moral

O doutor Soares, como aquela outra velha senhora, tem muito passado, pouco presente e nenhum futuro.

(Vá-se lá saber porquê, saiu-me para título desta edificante estória este. Suspeito que terá sido pela estranheza com que me soou «ética republicana» para caracterizar a vulgata moral vigente durante a baderna que durou de 1910 a 1926, que inspira ainda hoje parte da nossa dinossáurica esquerdalhada.)