Com este post, inicio uma série dedicada a avaliar a futura obra de Costa no governo que agora tomou posse. Começo pelo ponto de partida que é a sua herança: a obra do governo PSD-CDS.
Muitos portugueses, para se dispensarem da maçada de fazerem escolhas, dizem que os governos são todos maus e são todos iguais. Concordo parcialmente com a primeira parte e discordo completamente da segunda. Concedo que os governos variam entre o sofrível e o mau, mas não são todos iguais ou, se preferirem, se são todos iguais há uns mais iguais do que outros, como no «Triunfo dos Porcos» de Orwell.
Na minha perspectiva, a obra mais importante que um governo pode fazer é deixar os cidadãos viverem as suas vidas com o mínimo de interferência possível. O que é o mínimo possível é matéria controversa mesmo entre os que defendem a redução do papel do Estado. Pela minha parte, o mínimo possível são as funções nucleares do Estado (soberania, defesa, segurança, administração da justiça), a gestão das externalidades, e, claro, a cobrança de impostos para pagar a máquina administrativa. A extensão a outras funções deve carecer de demonstração da sua vantagem.
Admito que isso seja contra-intuitivo. Contudo, se olharmos para as últimas décadas, foram os períodos em que os governos mais quiseram fazer obra aqueles em que a obra feita deixou o país falido e de rastos. Dois exemplos: o PREC, a que se seguiram duas intervenções do FMI, e o socratismo, a que se seguiu a terceira.
Em matéria de governação, o mais pode ser o menos e o menos pode ser o mais. Dois exemplos consecutivos no tempo: a governação socratista e a governação da coligação PSD-CDS. Quando não podem deixar de reconhecer que hoje estamos melhor do que há 4 anos (
até Costa o disse aos chineses), a esquerdalhada clama que os parcos resultados positivos não são obra do governo. Têm razão. São obra de uma parte dos portugueses – a parte que dá corda aos sapatos e não está pendurada no Estado. O que é obra do governo, neste caso do governo socratista, é a bancarrota em que deixou o país antes do animal feroz ir «estudar» para Paris.
No retrato do ponto de partida – a herança de Costa -, começo pela contas externas.
Os diagramas da balança comercial e da balança corrente mostram sem margem para dúvidas uma melhoria nítida, em particular da balança corrente (inclui a balança comercial, a balança de serviços, a balança de rendimentos e a balança de transferências corrente), cujos saldos trimestrais, pela primeira vez desde a II Guerra, foram positivos em vários trimestres desde 2012 e nos anos de 2013 e 2014 e provavelmente 2015.
Este é um resultado particularmente importante porque, mais grave do que os défices orçamentais são os défices das contas externas, cuja acumulação ao longo do tempo explica o nosso crescente endividamento ao exterior que só começou a estabilizar a partir de 2012 e, ainda assim, representa mais de duas vezes o PIB, enquanto a dívida pública representa 1,3, e uma parte da dívida pública é interna. A nossa perda de soberania como protectorado de Bruxelas resulta essencialmente da dívida externa.
Quando comparamos os dados do comércio internacional do início do governo PSD-CDS com o último trimestre completo, verificamos uma redução do défice superior a 1,6 mil milhões, conseguida, ao contrário da mitologia corrente, principalmente pelo aumento das exportações já que as importações apenas caíram 200 milhões. Assim, a taxa de cobertura melhorou mais de 10 pontos percentuais. O aumento das exportações verificou-se quase em partes iguais na UE e no resto do Mundo.
Outro mito corrente é a melhoria da balança comercial se ter devido às exportações de combustíveis. Os dados das últimas linhas do quadro mostram que isso é não é verdade – o superavit do segmento sem combustíveis aumentou 540 milhões. Isso mesmo se confirma no quadro seguinte onde se verifica que as exportações de combustíveis apenas aumentaram 168 milhões do 2.º trimestre 2011 para o 3.º de 2015, enquanto as de produtos alimentares e bebidas aumentaram 368 milhões, as de máquinas aumentaram 405 milhões e as de outros bens de consumo aumentaram 723 milhões.
Finalmente, um outro mito para desvalorizar os resultados nas contas externas é o de que a melhoria da balança corrente se ficou a dever ao turismo.
Como se pode ver no diagrama anterior de 2010 para 2014 o saldo de turismo (que é o que importa para medir o impacto na balança corrente) aumentou 2,4 mil milhões. Nesse mesmo período o saldo da balança corrente passou de um défice de 18,3 mil milhões para um superavit de 1,0 mil milhões ou seja teve uma melhoria de 19,3 mil milhões dos quais o turismo apenas representou 12%.
Esperamos para ver o que a obra de Costa irá fazer quanto contas externas cuja situação, podendo não ser risonha - há problemas que levarão muito tempo a resolver -, é a melhor em muitas décadas.
Fontes:
- Trading Economics - Diagramas de Balanças, Importações e Exportações, 2.º Trim. 2011 a 3.º Trim. 2015
- Pordata - Balança de viagens e turismo 2010-2014 e saldos anuais da balança corrente 2010-2014
- INE - Resultados Globais de Comércio Internacional, Destaques Junho 2011 e Setembro 2015