«Podemos ver e ouvir online a vaia monumental quando os jogadores observaram um minuto de silêncio pelos mortos de Paris. O jogo era amigável e histórico, entre os velhos inimigos Turquia e Grécia. Na assistência, estavam o primeiro-ministro turco, Ahmet Davutoglu, e o primeiro- ministro grego, Alexis Tsipras. O estádio era em Istambul, a cidade mais cosmopolita e europeia da Turquia, e estava cheio de fãs turcos. E de nacionalismo. Quando o minuto de silêncio começou, uma vaia brutal saiu das gargantas à mistura com gritos de Allahu Akbar. Convém ouvir esta vaia quando começarem a falar em invadir a Síria e o Iraque com tropas e proceder à remoção do Daesh e de Assad. Convém ouvir esta vaia quando repetirem pela milionésima vez que o terrorismo do século XXI nada tem a ver com o Islão. E que o Islão é uma religião de paz. A expansão do islamismo, a mais rápida da História, nunca teve nada a ver com a paz. Foi uma expansão militar. E não terminou com a morte do profeta. Ao contrário de outras religiões, que entraram na modernidade abandonando a catequização e conversão forçadas e o missionarismo militar (característico da expansão colonial portuguesa e espanhola), o islamismo retomou o Islão como bandeira política e processo identitário. Digo o islamismo, que tem várias seitas e fações e interpretações, e não apenas o islamismo radical. O islamismo está, para recuperar prestígio, numa fase de proselitismo que a guerra entre sunitas e xiitas acentua. É neste contexto que aquela vaia deve ser entendida. E antes de o Ocidente e as democracias liberais pensarem em sacrificar soldados nos campos explosivos do Médio Oriente devem planear e antecipar.»
Clara Ferreira Alves, a Pluma Caprichosa, a fazer esquecer a entrevista do «chefe democrático que a direita sempre quis ter» e outros delírios, na Revista do Expresso
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