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22/03/2022

ARTIGO DEFUNTO: Da admiração pelo tirano e a simpatia pelas suas causas à co-fundação de um clube liberal (uma espécie de “NATO do pensamento”) em apenas cinco semanas?

O Dr. Miguel Sousa Tavares (MST), também conhecido como tudólogo, ainda hoje nos surpreende, na circunstância com uma série de peças na sua coluna no Expresso sobre a invasão da Ucrânia, peças que em seguida cito e comento.  

11 de Fevereiro “Esta guerra que nos querem vender”

MST garante que a “invasão iminente” é uma invenção dos “especialistas ocidentais” e do “círculo belicista NATO-Estados Unidos-Inglaterra” e questiona o que “teria Putin a ganhar com isso”, afinal seria “uma guerra que os russos pedem que evitem”.

18 de Fevereiro “A Rússia já invadiu?”

Apesar de todos os esforços de Biden, Johnson e desse incendiário imbecil que é o secretário-geral da NATO, aposto que até hoje a Rússia não Invadiu a Ucrânia”, escreveu numa altura em que era público, notório e documentado com imagens a preparação da invasão.

Para quem não saiba, o “incendiário imbecil” é Jens Stoltenberg. ex-primeiro-ministro da Noruega e líder do Partido Trabalhista, Noruega quem tem uma fronteira de 200 km com a Rússia e uma fronteira de 700 km com a Finlândia que resistiu à invasão em 1939 pela União Soviética que desistiu depois de imensas baixas, não sem anexar a região do lago Ladoga.

25 de Fevereiro “Guerra e Paz”

Sim, invadiu.” Reconheceu MST e em vez de se penitenciar pelo que escrevera antes ataca a suposta “satisfação intelectual de tantos que passaram semanas a anunciar a invasão, parecendo mesmo desejá-la” e criticava o “lado ocidental” por não ter feito “um esforço série de negociação”.

Recorde-se que na véspera Putin tinha assim anunciado o lançamento da “operação especial” sem qualquer condição negocial:

Neste contexto, de acordo com o artigo 51 (Capítulo VII) da Carta da ONU, com permissão do Conselho da Federação da Rússia, e em execução dos tratados de amizade e assistência mútua com a República Popular de Donetsk e a República Popular de Lugansk, ratificada pela Assembleia Federal em 22 de fevereiro, tomei a decisão de realizar uma operação militar especial.

O objetivo desta operação é proteger as pessoas que, há oito anos, enfrentam humilhações e genocídios perpetrados pelo regime de Kiev. Para isso, buscaremos desmilitarizar e desnazificar a Ucrânia, bem como levar a julgamento aqueles que cometeram inúmeros crimes sangrentos contra civis, inclusive contra cidadãos da Federação Russa.”

4 de Março “Tudo que parece é. Mas nem tudo o que parece é”

Cedendo à sua repulsa freudiana das redes sociais, MST lamenta que “nas redes sociais, Putin passou a ser um bandido e os ucranianos uns heróis”, “fazendo-o passar de vítima a agressor”. Acredita que “havia espaço para a negociação” e que há uma “boa notícia é que, ao contrário do que muitos vaticinavam, a estratégia não parece ser arrasá-la ou deixá-la de joelhos por muito tempo”, isto numa altura em que várias cidades ucranianas já estavam a ser devastadas pela brutalidade dos mísseis e da artilharia russa.

11 de Março “A coragem está na paz, não nos falsos heroísmos”

MST começa a engolir a prosápia e as razões indiscutíveis de Putin que o “círculo belicista” não aceitava evoluíram para “as razões que tinha ou que julgava ter por força da história ou do direito perdeu-as por força dos canhões e dos tanques”. Para compensar a perda atira-se “ao celebrado Volodymyr Zelensky, com a sua T-shirt militar e os seus discursos “patrióticos”, usando com mestria os seus dotes de actor e com indisfarçada vaidade … a fazer tweets e vídeos e a apelar à terceira guerra mundial”.

Só mais outro problema freudiano pode explicar esta prosa em relação a uma criatura que tinha a cabeça a prémio e sabe que com alta probabilidade a terá decepada pelas milícias de Putin.

Conclui, responsabilizando Zelensky por não ter negociado antes de ser invadido.

18 de Março “O clube liberal”

Se até aqui consegui perceber a evolução de MST debatendo-se com um difícil dilema entre o seu fascínio por homens-fortes (o caso de Sócrates é um exemplo doméstico) e a sua pesporrência opinativa, por um lado, e a realidade avassaladora, por outro, é nesta crónica que perdi o fio à meada, com o seu anúncio da fundação em que participou de um “Clube Liberal Português” uma espécie de “NATO do pensamento” (não a do “círculo belicista”, supõe-se) que tem “a guerra da Ucrânia (como) a causa fundadora” e que admite que “Putin é um bandido à solta, que a invasão é injustificável ou que os bombardeamentos de alvos civis são criminosos”.

Depois de quatro dias, ainda suspeito que o Dr. Tavares possa ter escrito esta peça enigmática com o propósito de mangar com a tropa dos seus leitores.

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Aditamento:

A propósito do "incendiário imbecil", já depois de ter escrito este post li este resumo da intervenção ontem na conferência da Fundação Gulbenkian do ex-primeiro-ministro finlandês Alexander Stubb, outro que o Dr. Tavares certamente classificaria como "incendiário imbecil", cuja leitura se recomenda vivamente.

1 comentário:

Bilder disse...

Entretanto quantas centenas de milhões por dia continua a Alemanha/europa a pagar à Russia em gás e oil?? https://novadesordemmundial.blogspot.com/2022/03/desordem-as-portas-da-europa.html