Contextualizando: o Imperial College COVID-19 Response Team publicou no dia 16 de Março o relatório «Impact of non-pharmaceutical interventions (NPIs) to reduce COVID-19 mortality and healthcare demand», aqui citado dias depois, onde concluiu, com base nos números até então conhecidos, que da estratégia do governo de não recorrer ao confinamento poderia resultar uma carga excessiva para o NHS e seu provável colapso. Essas conclusões levaram o governo inglês a alterar a estratégia e decretar o confinamento.
No melhor pano cai a pior nódoa. Neste caso o pano é o jornal Observador que, não tendo acesso a Neil M. Ferguson, vice-reitor da School of Public Health do Imperial College e primeiro signatário daquele relatório, adoptou o luso-método de quem não tem cão caça com gato e resolveu entrevistar Francisco Veloso, ex-director da Católica Lisbon School of Business and Economics até 2017 e actual reitor da Imperial College Business School.
A prestação de Francisco Veloso durante os 13 minutos que durou a entrevista foi o que se poderia esperar de um reputado académico com um excelente currículo: objectiva e informada (e politicamente correcta, esta não era necessária, mas nos tempos actuais é difícil fazer carreira de outro modo). Teve ainda o bom senso de não entrar pelo campo da medicina e da epidemiologia, visto que é um economista e nada teve a ver com o relatório da School of Public Health.
So far so good. E qual foi o título escolhido para a entrevista?
«O português que ajudou Trump e Boris Johnson a desviar-se da "situação extrema" de Itália»
E, para que não restassem dúvidas sobre quem seria o português que fez tal coisa, acrescenta-se: «(...) Francisco Veloso explica como influenciou os dois governos.» É claro que Francisco Veloso está inocente de ter feito e de ter explicado uma coisa que não fez.
Quem não está inocente é o Observador que adoptou o pior do jornalismo de causas lusitano, especialista em alimentar a necessidade patética, infantil e doentia de se construírem ficções para fingir que «somos muito bons, somos dos melhores dos melhores», enquanto desperdiçamos as oportunidades para ir fazendo o que podemos fazer e elevar a fasquia para fazermos mais e melhor. Sim, eu sei que já escrevi isto várias vezes, mas apenas porque aquilo está sempre a ser feito.
Entretanto, actualizei a pesquisa no Google da expressão "português no topo do mundo" que há 5 anos tinha 5.900 resultados e agora apresenta 10.700, o que mostra que com idade não ganhamos necessariamente sabedoria, apenas ficamos mais velhos.
1 comentário:
«(...) apenas ficamos mais velhos.»
E não é tão só. Ficamos mais gagás.
Abraço
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