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18/11/2020

Um Rio cada vez mais parecido com um socialista (9) - Podem agradecer-lhe ter criado o Chega e o IL

Outras parecenças.

«Quando Rio chegou a líder do PSD, a sua maior preocupação foi afastar-se da herança de Passos Coelho. Para isso, quis mostrar que o PSD não era um partido de direita. Mas confundiu o apelo a eleitores do centro com uma tentativa de purificação ideológica do partido. Ou seja, quis fazer do PSD um partido apenas “social democrata”, esquecendo que a vocação dos grandes partidos de poder é incluir várias famílias políticas e até militantes com tentações populistas, que existem em todos as famílias políticas. (...)

A questão central não é o PSD ter militantes como Ventura. Como disse, todos os partidos têm populistas e demagogos. Um populista no PSD, ou no CDS, está limitado pelas doutrinas, pela história e pelas heranças ideológicas. Ou seja, os partidos tradicionais servem de limites institucionais às tentações populistas dos seus militantes. O problema é deixar um populista talentoso, como Ventura, à solta a explorar os piores instintos dos eleitores mais insatisfeitos (e há muitos em Portugal). Como mostrou enquanto foi líder do PSD, Passos sabia unir toda a direita. Primeiro, uniu o partido. E depois, uniu o PSD e o CDS. Com ele na liderança do PSD, não teria havido o Chega nem, como diz um amigo meu, a IL. Rio deixou o PSD e a direita dividirem-se. Já terá percebido o erro que cometeu, porque agora sabe que é muito mais difícil lidar com uma direita dividida do que com um partido com várias tendências. (...)

Rui Rio preocupou-se tanto em afastar-se de Passos que permitiu o aparecimento de um partido radical à sua direita. Um dia, no futuro, os historiadores olharão para a segunda década do século XXI como aquela em que um líder moderado, sério e decente, foi afastado para abrir o caminho aos radicais.»

Com Passos, não havia o Chega, João Marques de Almeida no Observador 

1 comentário:

Bilder disse...

Se fosse apenas uma questão de personagens seria menos mau,mas vejamos a questão de fundo(ou como alguém disse e bem,olhemos para a floresta e não apenas para as árvores).No "Livro VIII", de A República, Platão expõe sua teoria da degenerescência dos regimes políticos. Se a cidade perfeita é aquela onde a razão governa o homem e o Estado, as cidades imperfeitas são aquelas onde a razão é suplantada por um vício. Na hierarquia da corrupção dos regimes, a timocracia ocupa o lugar mais invejável pois ela não é senão o governo da honra. A regressão prossegue com a oligarquia, cidade do dinheiro e da busca descabida da riqueza. A avareza aí é a paixão dominante conduzindo à concentração da riqueza e ao empobrecimento de uma parte dos cidadãos. Não é senão neste momento que aparece a democracia sob o golpe de uma revolução conduzida pelos decepcionados, estes "marimbondos" cujo rancor os armou de um dardo e que reagrupam a oligarquia empobrecida, o político que busca fortuna pela política, o demagogo e o filho do oligarca emancipado da tutela de seu pai. "Considero [...]", escreve Platão, "que a democracia aparece quando os pobres, tendo obtido a vitória sobre os ricos, massacram uns, e banem os outros e partilham igualmente com aqueles que sobram, o governo e os cargos públicos" (557b). Em outros termos, a democracia se caracteriza a princípio por um gosto excessivo pela liberdade que se encontra convertida em licenciosidade. Esta última engendra um sucumbir do reino das leis sob os golpes de uma tolerância excessiva generalizada. Ainda pior, ela conduz a uma reviravolta da ordem moral: à busca da virtude se substitui uma demanda insaciável do prazer. Daí resulta uma espécie de inversão da ordem social: os mestres temem os alunos, que os gozam; os velhos querem agradar aos jovens e mesmo os animais, como os asnos, tomam a liberdade de ferir os transeuntes nas ruas. Eis porque Platão conclui que a democracia é "um governo agradável, variegado e desordenado, que provê uma espécie de igualdade tanto ao que é desigual quanto ao que é igual" (558b). Ela é o fruto da demagogia, que é seu vício primeiro. Daí decorre sua propensão à anarquia que a faz desembocar na tirania, governo da vaidade e do crime.