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26/12/2016

Crónica da anunciada avaria irreparável da geringonça (63)

Outras avarias da geringonça.

Um dos resultados das reversões levadas a cabo pela geringonça é o aumento do custo horário da mão-de-obra. No 3.º trimestre esse custo aumentou 1,5% na Zona Euro, 1,9% na UE e 3,6% em Portugal. Como a produtividade não tugiu nem mugiu, é fácil antecipar os efeitos sobre a competitividade da economia portuguesa.

Entretanto, as outras peças da geringonça preparam-se para extorquir mais concessões ao PS, perdão concessões ao país. Jerónimo de Sousa inaugurou a campanha do PCP para saída do Euro e a renegociação da dívida. Alguém deveria explicar à criatura que uma fracção considerável da dívida pública é detida pelos bancos que operam em Portugal, pelo Fundo de Estabilização da Segurança Social e por uns milhares de sujeitos passivos que aplicaram as suas economias nas emissões recentes de OT.

Para compensar a falta de investimento público (em infraestruturas produtivas, porque quanto ao resto já tivemos que chegasse), o governo faz anúncios. Desta vez anunciou um investimento de 2,5 mil milhões de euros para duplicar a capacidade portuária em 10 anos. Pergunto-me: se em dez anos precisamos do dobro da capacidade portuária, espera-se que a economia portuguesa com o comércio externo a representar quase metade do PIB se dedique na totalidade às exportações e importações?

Talvez a maior realização da aliança geringonça-MRS seja ter convencido os portugueses que os deuses do socialismo lhes estão a conceder uma época de prosperidade sem fim. Isso explica que na 1.ª quinzena de Dezembro as operações Multibanco tenham aumentado 4,2% no número e 3,0% no montante, relativamente ao mesmo período do ano anterior. Sem esquecer o volume de tráfego nas auto-estradas que voltou a aumentar em Setembro e atingir os volumes de 2010, a 6 meses da declaração de falência. Ainda assim, talvez os portugueses não sejam completamente tontos e por isso, pelo sim pelo não, gastaram nos primeiros 10 meses do ano 2,3 mil milhões de euros - quase mais 500 milhões do que o ano passado - a comprar lotaria e raspadinhas. Deve ser o que a inocência popular considera investimento...

Lembram-se do embandeiramento em arco com as contas externas do 3.º trimestre? Pois bem, segundo os dados do BdeP, o saldo acumulado até Outubro das balanças corrente e de capital baixou de 2,7 para 2,3 mil milhões.

Já o embandeiramento em arco com a descida do défice até Setembro para 2,5% continua com o governo a autofelicitar-se apesar das manobras (cativações redução drástica do investimento e das despesas de capital) e de, ainda assim, os 0,5% de redução face ao défice de 2015 (sem Banif) serem uma gota de água no oceano das reduções conseguidas em 4 anos de governo «neoliberal», como se pode ver no diagrama seguinte.

Ecoonline

Falando de investimento, reduzido a amendoins para o governo poder «devolver» os rendimentos à sua clientela eleitoral (funcionários públicos e pensionistas), Costa teve a suprema lata de dizer que «foi um erro (…) a diabolização que se fez do investimento público» (ver este diagrama para se ter uma medida da extensão da falta de vergonha). Para quem, como ele, reduziu até Setembro os gastos de capital em 32,7% e o investimento em 28,4%, é preciso ser completamente desprovido de vergonha para dizer tais coisas.

E se alguém pensa que o problema do investimento se vai resolver exclusivamente com a chuva dos fundos europeus, como o Portugal 2020, é melhor esquecer. Mais provavelmente será uma chuva que flui para piscinas privadas como aconteceu com o FEDER e outros fundos no período pós-adesão. Alguém acredita que das 250 mil operações aprovadas, sabe-se lá com que critérios, pelo Portugal 2020, totalizando 8 mil milhões de euros, resulte um impacto proporcional na economia? A esta dúvida acrescente-se que só uma percentagem ínfima desses projectos não estarão inquinados com facturas fictícias para justificar o investimento.

Nem a congratulação anima a economia: o indicador de actividade económica do INE para Setembro e Outubro continuou a tendência descendente. Até o Acção Socialista Expresso escreve que «o crescimento da economia está a perder gás», como se Costa tive conseguido antes disso dar-lhe gás - recorde-se que o crescimento de 2016 não chegará a metade do anunciado pelos 12 sábios da Mouse School of Economics.

Ao se ter proposto assaltar os sujeitos passivos em 280 milhões de euros para comprar os votos dos embarretados do GES, o governo socialistas abriu uma caixa de Pandora e já tem à perna os «lesados» do Banif que exigem uma receita igual. Só falta a reestruturação da dívida para virar de pernas para afundar os outros bancos que ainda flutuam e multiplicar os «lesados». E, por falar em Banif, registe-se o bónus que a geringonça deu na negociação à pressa num dos últimos fins de semana de 2015, ao Santander ao emitir obrigações da Oitante  para garantir a resolução do Banif a uma taxa um ponto percentual acima do yield a 10 anos da dívida pública.

Depois de ter diabolizado (com razão) os perdões fiscais, a geringonça engoliu mais um com o PERES para ajeitar o défice (em contas públicas) com um encaixe de 400 milhões pagos por 80 mil contribuintes.

Para terminar a semana de Natal, o governo colocou no sapatinho o aumento para 557 euros do salário mínimo, um dos aumentos mais significativos nos últimos anos (de 5% desde 2016 e 31% desde 2008!), «compensado» com a redução de 1,25% na TSU (isto é compensado com a antecipação da insustentabilidade da segurança social) com a oposição de berloquistas e comunistas que depois de fazerem a sua rábula habitual voltarão ao redil da geringonça  Como se fosse pouco, o governo prometeu aumentos semestrais do salário mínimo a partir de 2018.

Para se perceber os impactos negativos sobre a economia e o emprego quando, como agora, o salário mínimo abrange quase 40% dos novos contratos e mais de 20% dos trabalhadores e o rácio entre salários mínimo e mediano atinge 66% é o terceiro mais alto da UE (em Espanha o rácio é 37%), leia-se este artigo de Aguiar-Conraria (um dos pouco economistas de esquerda que a maioria das vezes não pratica a ciência de causas).

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