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18/02/2018

NÓS VISTOS POR ELES: O estuário do Tejo segundo Charles Sprawson

Charles Sprawson, nascido no Paquistão e educado em Dublin e em Londres, ensinou literatura na Arábia Saudita, esteve ligado às Belas Artes em Londres e viajou por todo o mundo fazendo obsessivamente o que mais gostava da fazer - nadar em qualquer sítio onde houvesse água, nas gélidas praias inglesas, no Canal da Mancha, no Tibre, no estreito de Dardanelos (Helesponto), na Antártica, no Niagara, em Gallipoli, etc., um grande etc.

Nos finais dos anos 80 Sprawson escreveu um artigo para a revista The London Magazine sobre escritores nadadores, incluindo Byron, Rupert Brooke, Jack London, Allen Poe, André Gide e Virginia Woolf (que nadava nua). Juntou assim dois dos seus temas favoritos: a literatura e a natação. A partir desse artigo escreveu a sua primeira e única obra Haunts of the Black Masseur: The Swimmer as Hero, um livro inspirado, publicado em 1992 com um enorme sucesso literário e de vendas.

Charles Sprawson nas Ilhas Virgens em 2010
Entre as experiências pessoais de natação relatadas por Sprawson no seu livro, incluiu uma no estuário do Tejo, imagine-se. Vale a pena ler o relato do episódio pela escritora irlandesa Iris Murdoch, ela própria uma nadadora exímia, na sua crítica na New York Review of Books:

«Having graduated in the Bosphorus, like Byron, Mr. Sprawson went on to tackle the Tagus estuary at Lisbon, a much more demanding swim as it turned out, and one endangered by giant tankers as well as unpredictable tides. Normally he is not fussy, as I am not myself, about the quality of the water he swims in; although all bathers would of course prefer a green pure foaming element to a stagnant one. But the pollution in the Lisbon estuary was too much for him, and together with the tides and the tankers it forced him to abandon the swim.»

Iris Murdoch não menciona que o abandono da travessia do Tejo não se ficou a dever apenas à poluição: Sprawson foi impedido pela polícia marítima portuguesa. Devia ter pedido a intervenção de Marcelo Rebelo de Sousa que no Verão de 1989 fez o seu mergulho no Tejo e sobreviveu. Sabe Deus se não foi infectado por um daqueles germes que pululavam naquelas águas conspurcadas, suspeita que ganha alguma verosimilhança pelo que se viu nas décadas seguintes.

Marcelo saindo das águas conspurcadas
Charles Sprawson, actualmente com 76 anos, pobre como Jó, com problemas mentais e a viver num lar de idosos em Londres, bem precisa que lhe comprem a reedição do Haunts que estará à venda ainda este ano.

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