«A liderança maligna também se nutre de características dos liderados, o segundo vértice da malignidade. Pessoas ressabiadas, desprovidas de empatia, entusiasmadas com uma liderança “forte” que decide por elas próprias — eis as características potenciadoras da emergência de lideranças malignas. Estas pessoas podem entregar-se acriticamente aos ditames do líder messiânico, legitimando-lhe malfeitorias e dislates morais. No processo, também emergem seguidores oportunistas. Estes, cientes de que, para se manterem no círculo do poder, precisam de mostrar lealdade pessoal ao líder messiânico, acabam também por apoiar, mais ativa ou mais passivamente, a malignidade. Retaliando contra qualquer sinal de discordância, este tipo de líder rodeia-se de sicofantas que lhe dizem o que deseja ouvir. Com o decurso do tempo, a tomada de decisões baseia-se em informação incompleta — e o isolamento do líder perante a realidade agrava-se.
Este processo é reforçado pela paranoia crescente. Num quadro de violência contra qualquer sinal de discordância, confundida com deslealdade, a desconfiança passa a imperar. Os que se sentem injustiçados desejam vingança — e tentam o golpe palaciano. Quando o golpe fracassa, a vingança sanguinária reforça-se. A paranoia coletiva emerge. A violência transforma-se num trunfo sempre à mão, com consequências trágicas para os liderados e, por vezes, o próprio líder.
O terceiro vértice é o contexto. A liderança maligna emerge mais provavelmente quando a situação conduz os liderados a depositarem esperanças num líder salvífico. Quando a autoestima ou a identidade de um povo está ameaçada por reais ou imaginários inimigos externos, é mais provável que esse povo se entregue nas mãos do líder ungido e redentor. Alguns líderes são dotados de um faro particular para estes descontentamentos — o que os leva a cavalgar a onda de frustração dos liderados e a prometer-lhes um futuro que resgate o orgulho perdido.
Quando o entusiasmo com estas promessas ganha tração, desenvolve-se uma espécie de combustão que, a médio longo prazo, se revela tóxica. Perante obstáculos provindos dos “inimigos” e “desleais”, líder e liderados diabolizam a discordância. Para vencer essas “escumalhas”, o líder propõe e os liderados aceitam a remoção de pesos e contrapesos institucionais — libertando o líder e o seu círculo dos constrangimentos que sustentam as liberdades e o processo democrático. Instituições como os tribunais ou o parlamento são progressivamente empobrecidas — ainda que, na aparência, a separação de poderes se mantenha. É então que o líder dispõe das condições para se perpetuar no poder e, se necessário, mudar a Constituição. Esta mudança está à mão de semear — pois as instituições já perderam poder de vigilância e são meras correias de transmissão da vontade do todo-poderoso líder. Eis que se concretiza a resplandecente fórmula: L’état c’est moi!»
Excerto de Putin e o triângulo da liderança, Arménio Rego e Miguel Pina e Cunha
1 comentário:
Patranhas. Analisar geoestratégia desta forma enviesada, diz tudo dos pobres pensadores académicos deste país. Os vociferadores do "Abril sempre" e outras patacoadas. Pertencem à tribo que presta vassalagem ao políticamente correcto e à oligarquia que leva o Ocidente ao desastre e à decadência.
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