«Na quinta-feira, a máquina sindical do PCP no sector público fez, com o brio do costume, mais uma das suas provas de vida. E a pergunta é simples: porque é que o doutor Carvalho da Silva, convencido como está da iniquidade da atual situação, não aproveitou para fazer "outro 25 de abril"? Os meios da CGTP não chegam para paralisar o país, mas chegariam provavelmente, com o auxílio dos "indignados", para paralisar o Governo. Carvalho da Silva podia, por exemplo, cercar São Bento, como em 1975, e confrontar o regime com o mesmo problema de ordem pública que, no Egito, faz tremer a tutela militar. Talvez não resultasse. Mas porque é que nem tenta? Por muitas razões, mas também por esta: não há dinheiro.
A quem pede "outro 25 de abril" - querendo de facto dizer outro PREC, que é uma coisa diferente - convém explicar por que motivo o "processo revolucionário" deixou uma memória de violência, mas não de miséria. Porque, durante a maior parte do tempo, houve dinheiro para gastar - o dinheiro poupado, acumulado, entesourado pelo Dr. Salazar. Portugal não tinha o petróleo da Venezuela, mas depois de duas décadas de crescimento económico num quadro de equilíbrio orçamental, dispunha, em relação à sua economia, das maiores reservas de ouro e de divisas do mundo. Em 1974, segundo Abel Mateus, davam para o país pagar 14 meses de importações. Eram o equivalente do petróleo, sem o qual, como está provado, o socialismo é apenas uma receita para a pobreza.
Salazar foi o mecenas póstumo do PREC. O seu pé de meia permitiu algo nunca visto até então: uma "transição para o socialismo" que coincidiu, apesar do inevitável colapso da economia, com uma orgia de consumo. Terá sido essa a grande originalidade da revolução portuguesa de 1974-1975. Mas no verão de 1975, quando o povo do Norte começou a sacudir o controlo comunista do Estado, já o dinheiro ia acabando. O primeiro discurso de austeridade em Portugal depois de 1974 foi feito por Vasco Gonçalves, em 26 de julho de 1975. O "companheiro Vasco" explicou então aos trabalhadores que tinham de se deixar dessa mania burguesa de ter carro ou frigorífico. Aproximava-se o momento das prateleiras vazias, típicas do socialismo soviético. Por isso, no outono de 1975, houve que apelar, pela primeira vez, à ajuda financeira da Europa comunitária. Os nossos futuros parceiros europeus disponibilizaram 200 milhões de dólares. Mas com uma condição: o estabelecimento de uma democracia pluralista em Portugal. O nosso regime democrático deve alguma coisa aos antepassados da atual troika.
Se houvesse dinheiro para uns meses de férias venezuelanas, como por obséquio de Salazar havia em 1974, talvez Carvalho da Silva se abalançasse a acampar no poder com os seus funcionários públicos e os seus indignados. Mas não há. No governo, dificilmente o presidente-camarada Carvalho da Silva escaparia à sorte do seu correligionário Raul Castro, que este ano teve de anunciar o despedimento de umas centenas de milhares de funcionários em Cuba. Não são só os almoços: também não há revoluções grátis.»
Rui Ramos, no Expresso de 26-11
[Dedicado ao tele-evangelista Francisco Louçã que pediu outro 25 de Abril e a Mário Soares que pede uma revolução com 3 décadas de atraso em relação à intervenção do FMI pela sua mão]
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Lema: A verdade é como o azeite, precisa de um pouco de vinagre.
Pensamento em curso: «Em Portugal, a liberdade é muito difícil, sobretudo porque não temos liberais. Temos libertinos, demagogos ou ultramontanos de todas as cores, mas pessoas que compreendam a dimensão profunda da liberdade já reparei que há muito poucas.» (António Alçada Baptista, em carta a Marcelo Caetano)
The Second Coming: «The best lack all conviction, while the worst; Are full of passionate intensity» (W. B. Yeats)
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29/11/2011
TIROU-ME AS PALAVRAS DA BOCA: «Não há revoluções grátis»
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