Continuação de (1)
Gita Gopinath, actualmente professora de economia de Harvard, foi entre 2019 e 2022 economista-chefe e de 2022 a 2025 vice-presidente do FMI, escreveu recentemente na Economist um texto onde defende que a bolha actual será diferente da DotCom - terá um impacto muito maior. Aqui vai um extracto:
«O mercado de ações americano tem oscilado ultimamente em meio a um aumento nas tensões comerciais, mas permanece perto de seu recorde histórico. O aumento, alimentado pelo entusiasmo em torno da inteligência artificial, atraiu comparações com a exuberância do final dos anos 1990, que culminou no crash das DotCom de 2000. Embora a inovação tecnológica esteja inegavelmente remodelando as indústrias e aumentando a produtividade, há boas razões para nos preocuparmos com o facto de que o "rally" actual possa estar a preparar o terreno para outra dolorosa correção do mercado. As consequências de tal acidente, no entanto, podem ser muito mais graves e globais do que as sentidas há um quarto de século. (...)
Em suma, é improvável que um crash do mercado hoje resulte na breve e relativamente benigna desaceleração económica que se seguiu ao estouro da DotCom. Há muito mais riqueza em jogo agora - e muito menos espaço político para suavizar o golpe de uma correção. As vulnerabilidades estruturais e o contexto macroeconômico são mais perigosos. Devemos preparar-nos para consequências globais mais graves.»
Às almas que eventualmente sonhem que isto nada tem a ver com o que se passa no Portugal dos Pequeninos, recomenda-se que façam uma retrospectiva rápida às circunstâncias que se seguiram a algo que ainda teria menos a ver com o que se passava na Ditosa Pátria - a chamada crise do subprime de 2008. A quem já se tenha esfumado na memória e preferir rever a coisa numa perspectiva divertida, em alternativa a ler alguns das dezenas de posts deprimentes que na época publicámos, recomendo que visionem este vídeo da época.
(Continua)
4 comentários:
Mantenho o que escrevi na primeira parte desta posta. As crises são inevitáveis porque os períodos de contracção económica são inevitáveis. É como a noite seguir-se o dia, pelo que não é apenas insensato não se preparar para este tipo de eventos, é suicidário. É transformar uma oportunidade num suplício. A maior parte das pessoas, infelizmente, não se prepara antecipadamente e não sabe o que fazer quando os mercados caem… mas há quem saiba. A até há quem faça fortunas obscenas quando isso acontece.
Quanto aos profetas da desgraça, há-os para todos os gostos e desde o arranque do presente Bull Market. O Peter Schiff, por exemplo, anda há pelo menos doze anos a dizer que os mercados bolsistas norte-americanos vão cair como nunca caíram. Quem lhe tivesse dado ouvidos, teria perdido as subidas incríveis que se registaram desde 2013.
A propósito, desde que a Prof. Gopinath escreveu esse artigo, o Nasdaq e o S$P 500 já superaram o seu máximo histórico várias vezes. Não estou a dizer que a festa vai continuar para sempre, mas querer antecipar crises é perder oportunidades. Sobretudo em bolhas, quando as cotações sobem de forma exponencial. A excepção, como referi na primeira parte desta posta, são os grandes investidores que, por terem milhões investidos não podem livrar-se das suas posições rapidamente, tendo de acautelar a chegada da crise mais antecipadamente do que nós.
A excepção são os grandes investidores
Pois, mas essa exceção pode lixar toda a gente, porque são too big to fail.
Se um grande investidor se vir à rasca, é preciso o Estado socorrê-lo, sob o risco de as perdas desse grande investidor se transformarem em perdas para uma data de gente que lhe emprestou dinheiro.
Ora, os Estados estão quase todos, neste momento, muito à rasca de massa.
«mas essa exceção pode lixar toda a gente, porque são too big to fail.»
Isso, infelizmente, tem feito parte do processo. Até a "nossa" CGD já passou por isso. Ou melhor, nós, os contribuintes portugueses, passámos por isso. E os clientes da CGD continuam a passar, porque as comissões e as taxas nunca mais foram as mesmas.
Só há uma solução para isso, que requer coragem política e um eleitorado informado: exigir que as instituições financeiras sofram as consequências da sua irresponsabilidade. O Estado não tem nada que salvar quem corre riscos excessivos.
«sob o risco de as perdas desse grande investidor se transformarem em perdas para uma data de gente que lhe emprestou dinheiro»
Lá está, eu aí seria peremptório: quem se endivida para investir não merece ser salvo. Eu não peço dinheiro emprestado para investir em bolsa, recorro exclusivamente às minhas poupanças. Da mesma forma, nenhum banco ou instituição de crédito deveria poder emprestar dinheiro para além do limite do valor dos seus activos totais. Mas pode, pode ir muito para além desse valor-limite. E é aí que reside o problema. Quando a bolha estoura, sobra sempre para os outros.
Infelizmente, o Ocidente está cheio de economistas e “cientistas” económicos que acham tudo isto muito bem porque “não se pode criar riqueza sem incorrer em risco”. Só que depois tem de vir sempre alguém pagar a factura e esse alguém normalmente somos nós, a classe média contribuinte.
«Ora, os Estados estão quase todos, neste momento, muito à rasca de massa.»
Verdade. E porquê? Porque, regra geral, os estados gastaram muito em cima das suas possibilidades sem, contudo, terem investido em políticas criadoras de riqueza. Portugal é um exemplo paradigmático dessa incompetência(?), infelizmente para todos nós.
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