UM SNS PUBLICO
(Um exercício irónico de João Duque no Expresso sobre a obsessão esquerdista de engolir os «privados»)
«Parece que a ”geringonça” quer o Serviço Nacional de Saúde exclusivamente público, sem espaço para que gulosos interesses privados o desvirtuem e desfrutem. Têm toda a razão.
Fui ao Centro de Saúde. À entrada, o segurança de uma empresa privada falava com uma senhora da limpeza de outra empresa privada que concluía a sua tarefa à luz de lâmpadas fornecidas por uma empresa privada e alimentadas por eletricidade fornecida por outra empresa privada. O ambiente estava agradável, pois o aquecimento a gás fornecido por uma empresa privada, mantinha a sala numa temperatura ame- · na. Retirei uma senha de uma máquina comprada e alimentada por uma empresa privada e dirigi-me a uma funcionária administrativa simpática que estava sentada numa ·cadeira fornecida por uma empresa privada e se apoiava numa secretária fornecida pela mesma empresa privada enquanto concluía uma chamada telefónica estabelecida através de um contrato que o Centro de Saúde tem com uma empresa privada. Fiquei à espera, sentado em cadeiras fornecidas por empresas privadas, até ser alertado para a minha consulta por um equipamento moderno instalado por uma empresa privada. Antes porém, tinha ido comprar uma garrafa de água a uma máquina dispensadora instalada e abastecida por uma empresa privada. Entrei no consultório e, como era de esperar, o médico tinha ao pescoço o seu moderno estetoscópio desenvolvido e adquirido a uma empresa privada. Depois de me ter mandado deitar na marquesa hospitalar adquirida a uma empresa privada e devidamente revestida por uma folha de papel provida por uma empresa privada mandou-me sentar frente à sua secretária numa cadeira vendida por uma empresa privada. Ele mesmo se sentou depois à secretária fornecida igualmente por uma empresa privada e começou a preencher a minha ficha e prescrições num computador produzido e fornecido por empresas privadas. Todo o sistema agora está informatizado, tendo este sido desenvolvido por uma empresa privada. No final imprimiu a prescrição numa impressora de marca privada em papel fornecido por uma empresa privada.
Saí do Centro de Saúde e fui à farmácia privada comprar o medicamento prescrito, o qual foi desenvolvido e produzido por uma empresa privada.
A ida ao Centro de Saúde correu bem. Saí satisfeito e seguro que, se a organização de todo este processo tivesse tido a mais leve intromissão de um privado teria corrido muito mal.»
4 comentários:
Faltou a privada. O Duque não deve ter passado pelo Brasil.
Quase sempre concordo com o que publica. Mas hoje não. Naturalmente que num regime democrático não compete ao estado produzir equipamentos que possibilitem a prestação de um serviço, como o serviço nacional de saúde.
Que João Duque escreva o que escreveu, não me surpreende. Mas repeti-lo neste blog, sim.
Caro Mário,
A economia é, com razão, chamada ciência sombria ou triste (dismal science). Isso não impede que alguns economistas sejam divertidos e João Duque é um deles.
Por isso, João Duque - um sujeito com um costela liberal - faz no artigo citado ironia um pouco retorcida sobre a obsessão da esquerda em engordar o monstro estatal.
Daí que, também neste caso, pode estar de acordo com o (Im)pertinências onde se preconiza não a engorda mas o emagrecimento do Estado.
Se formos a ver as fotos desta geringonça, são raros os magros. A maioria ou é 'cheínha' ou é anafada, gorda. Viva o Impertinências e as suas dietas.
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