Our Self: Um blogue desalinhado, desconforme, herético e heterodoxo. Em suma, fora do baralho e (im)pertinente.
Lema: A verdade é como o azeite, precisa de um pouco de vinagre.
Pensamento em curso: «Em Portugal, a liberdade é muito difícil, sobretudo porque não temos liberais. Temos libertinos, demagogos ou ultramontanos
de todas as cores, mas pessoas que compreendam a dimensão profunda da liberdade já reparei que há muito poucas.
» (António Alçada Baptista)
The Second Coming: «The best lack all conviction, while the worst; Are full of passionate intensity» (W. B. Yeats)

31/05/2009

ESTADO DE SÍTIO: desta vez o órgão legislativo ejaculou uma fábrica

Não sei qual o grupo parlamentar que teve a iniciativa da Resolução da Assembleia da República n.º 40/2009 publicada na passada sexta-feira no DR. Só sei que nesta ejaculação do órgão legislativo está lá tudo quanto é paleio, buzzword de consultoria de vão de escada, recomendando ao governo a «criação de um sistema designado Fábrica de Ideias».

A «fábrica» terá por base os «cinco princípios de inovação universalmente aceites» (?), que vão desde a «importação da inovação para a linha da frente, envolvendo sobretudo os funcionários públicos de primeira linha e os cidadãos» até à «adopção de uma abordagem estruturada de geração e de aceleração da implementação no terreno de ideias inovadoras». Como a «fábrica» não pode ficar-se só pelos princípios os deputados fizeram questão de adicionar os alicerces, que incluem estas pedras basilares: «modelo de governança», «cultura organizacional e gestão da mudança», «métricas de inovação» e, last but not least o «ecossistema de parceiros para a inovação». Os incentivos também não são esquecidos e prevê-se «um prémio para todas as ideias seleccionadas e implementadas».

E o que produzirá tal fábrica? Não se sabe. Só sabe que deverá ser constituída em cada ministério uma «central de inovação».

Por muito que seja difícil a um sujeito passivo, que sustenta as criaturas que produzem tais ideias, sonhar que a mais humilde inovação possa surgir das entranhas da vaca marsupial pública, isso não derrota a imaginação alimentada pelo ócio sonolento daquelas duzentas e tantas almas pousadas nas bancadas do parlamento, entretidas com os seus laptops a navegar na Net.

30/05/2009

O (IM)PERTINÊNCIAS FEITO PELOS SEUS DETRACTORES: Ó Fernanda, canse-o!

Requerimento a Fernanda

Ó Fernanda, dado
que já estou cansado
do ar teatral
a que ele equivale
em todo o horário
de cada canal,
no noticiário,
no telejornal,
ligando-se ao povo,
do qual ele se afasta,
gastando de novo
a fala já gasta
e a pôr agastado
quem muito se agasta
por ser enganado.
Ó Fernanda, dado
que é tempo de basta,
que já estou cansado
do excesso de carga,
do excesso de banda,
da banda que é larga,
da gente que é branda,
da frase que é ópio,
do estilo que é próprio
para a propaganda,
da falta de estudo,
do tudo que é zero,
dos logros a esmo
e do exagero
que o nega a si mesmo,
do acto que é baço,
do sério que é escasso,
mantendo a mentira,
mantendo a vaidade,
negando a verdade,
que sempre enjoou,
nas pedras que atira,
mas sem que refira
o caos que criou.
Ó Fernanda, dado
que já estou cansado,
que falta paciência,
por ter suportado
em exagerado
o que é aparência.
Ó Fernanda, dado
que já estou cansado,
ao fim e ao cabo,
das farsas que ele faz,
a querer que o diabo
me leve o que ele traz,
ele que é um amigo
de Sao Satanás,
entenda o que eu digo:
Eu já estou cansado!
Sem aviso prévio,
ó Fernanda, prive-o
de ser contestado!
Retire-o do Estado!
Torne-o bem privado!
Ó Fernanda, leve-o!
Traga-nos alívio!
Tenha-o só num pátio
para o seu convívio!
Ó Fernanda, trate-o!
Ó Fernanda, amanse-o!
Ó Fernanda, ate-o!
Ó Fernanda, canse-o!


Euleriano Ponati, poeta não titular

[Enviado por JARF]

A via rápida de bestial para besta (3)

Aparte as particularidades domésticas, os casos de Rendeiro & Loureiro, no que respeita ao trânsito do Olimpo mediático para o reino de Hades da comunicação social, são relativamente vulgares no mundo dos negócios da política e da política dos negócios. O que nos distingue é mais a pequenez dos casos, a sanha invejosa e a ausência de consequências penais, quando estão em causa comportamentos ilícitos, substituídas pela condenação na praça pública.

Sem me esforçar muito, lembro-me de vários casos globais, por assim dizer. Dos menos recentes, entre os muitos possíveis aqui listados pelo (Im)pertinências, cito Kenneth Lay, Chairman e CEO da Enron, preso depois de ter sido considera durante anos um modelo de homem de negócios. Dos mais recentes, Madoff reverenciado durante décadas como um guru das finanças; Ken Lewis, CEO do BofA, caído em desgraça no ano seguinte a ter sido eleito o banqueiro do ano; Angelo Mozilo do Countrywide, banco de crédito imobiliário falido, vilipendiado pouco depois de ter recebido o prémio «lifetime of achievement».

Entre os casos mais notáveis, encontra-se a Société Génerale, o gigante financeiro francês, durante décadas apontado como um modelo de risk management até receber 11 mil milhões de dólares de CDS pagos pelos contribuintes americanos via bailout da AIG.

29/05/2009

Dias Loureiro ao pé dele devia ser beatificado

«Dias Loureiro ao pé dele devia ser beatificado», escrevi aqui. Talvez parecesse uma opinião insensata. O blasfemo João Miranda demonstra que, pelo contrário, faz bastante sentido.



Obrigado.

CASE STUDY: os anúncios precipitados são sempre um bocadinho exagerados

Contrariando os negacionistas que já tinham descartado o aquecimento global, aí está a meteorologia a desmenti-los.


Contrariando os fiéis que já davam como adquirido o regresso do aquecimento global, após um breve intervalo, aí está a meteorologia a desmenti-los.

28/05/2009

A via rápida de bestial para besta (2)

Depois de João Rendeiro, chegou a vez de Dias Loureiro. Beneficiário do estatuto difuso de sacerdote do cavaquismo e do carinho complacente de diversas camadas dirigentes do PS, bastantemente retribuído com o lip service prestado a Sócrates, a metade das declarações de Oliveira e Costa que lhe foram dedicadas acabou com o estado de graça, já bastante abalado desde que começou a ser confrontado com contradições no caso BPN. E, contudo, verdadeiramente nada de novo se veio a saber que não se soubesse já, para não falar do que se sabe e só mais lá para frente se falará, quando o homem já estiver completamente atolado na desonra (de que ele é único responsável, diga-se).

Acabaram as entrevistas reverenciais e as referências laudatórias. Até as mais pungentes meias verdades ou meias mentiras, prudentemente omitidas até agora, começam a ser badaladas. Só para citar uma ridícula: afinal o homem não jogou golfe com Clinton, limitou-se a pisar o mesmo green.

Mais do que revelar aspectos escondidos do carácter de Dias Loureiro, as notícias e os comentários saídos da clandestinidade da falta de coluna vertebral revelam principalmente aspectos públicos do carácter dos portugueses em geral e das classes jornalísticas e políticas em particular, que só batem em moribundos anunciados. Compare-se com os temores e as reverências que merecem às mesmas classes, com honrosas excepções, as trapalhadas de Sócrates (Dias Loureiro ao pé dele devia ser beatificado).

Uma inveja mal disfarçada do filho do merceeiro de Aguiar da Beira, que com muita iniciativa, algum talento e muito contorcionismo ético, chegou onde a maioria dos representantes da classe do esperma feliz, com igual contorcionismo ético, mas sem um módico de iniciativa e talento, não chega. É o que é.

AVALIAÇÃO CONTÍNUA: com a verdade me enganas

Secção Assaults of thoughts

Durante o jantar anual da associação dos correspondentes na Casa Branca, no passado dia 9, Barack Obama vestiu o fato de Seinfeld e fez um espectáculo de stand up comedy muito aplaudido. De todas as piadas que disse acerca do pessoal da Casa Branca e dele próprio, há uma que no (Im)pertinências devemos relevar especialmente, compensando a longa série de posts (na última contagem já ia em 30) que o Pertinente tem dedicado a zurzir o Grande Comunicador.

Mostrando uma auto-ironia algo surpreendente Obama saiu-se com esta pérola:

«During the second 100 days, we will design, build and open a library dedicated to my first 100 days

É justo atribuir-lhe 2 afonsos, supondo que se trata de auto-ironia mesmo. À cautela, leva também 2 chateaubriands não vá o homem ter-se deixado levar pelo seu avantajado ego.

27/05/2009

DIÁRIO DE BORDO: reparando o Hubble (3)


John Grunsfeld e Andrew Feustel em acção (e as suas imagens reflectidas na superfície do telescópio).

Nem todos os obamas de Obama fazem felizes os obamófilos: episódio (30) A justiça não é muda e parece não ser cega

Torturado pelo dilema da substituição do juiz David Souter, o presidente Obama acabou por escolher Sonia Sotomayor que em tempos terá dito «that judges' legal findings are informed by their own life experiences as well as their legal research» o que, sendo inegavelmente verdade, faz suspeitar que esta escolha não seguiu o segundo dos critérios contraditórios que Obama enumerou durante a campanha, precisamente o que melhor garantiria que a justiça é cega.

Duvida-se, por isso, que a juíza Sotomayor seja alguém «dedicated to the rule of law, who honours our constitutional traditions… and the appropriate limits of the judicial role», que seria um dos paradigmas em cuja escolha Obama estava encalhado. É mais de esperar que seja um prosélito da justiça de causas.

26/05/2009

ARTIGO DEFUNTO: a nossa princesinha dos guinchos ficou-lhes atravessada na garganta

«From the sounds that Michelle Larcher de Brito was making on Court 14, you would have imagined that the 16-year-old Portuguese was a victim in a Freddy Krueger slash-fest rather than a promising young tennis player making her first impact at the grand slams.

The occasional power of Larcher de Brito's groundstrokes helped her through. But the more noteworthy aspect of her performance was the power of her vocal cords as she earned the right to be considered one of the loudest players in modern times to have screeched at the grand slams.
She can now be mentioned in the same breath as Monica Seles, Maria Sharapova and Victoria Azarenka, a teenager from Belarus who recently broke into the top 10.

But the loudest competitor at Roland Garros was still Larcher de Brito, and you would not have been that surprised if South had suddenly stopped during a rally and stuck her fingers in her ears.

First, Keothavong was beaten 6-0, 6-0 by Safina, then South lost 0-6, 7-6, 7-5 to the Little Queen of Screams, and Katie O'Brien was beaten 6-1, 6-1 by Olga Govortsova, of Belarus.
»

Nem o facto do jornalista de causas Mark Hodgkinson ter visto eliminar 3 compatriotas no mesmo dia, desculpa a estúpida xenofobia com que se refere à nossa miúda.

A nossa princesinha dos guinchos em acção no torneio de Montreal contra uma súbdita do czar

CAMINHO PARA A SERVIDÃO: o governo não quer

A Sonancom e a Zon não sabem se querem, a Caixa, um dos maiores accionistas da Zon, não diz que sim nem que não, a autoridade de regulação está muda, mas o «Governo não quer fusão da Sonaecom com a TV Cabo».

O governo não quer? O que tem o governo com isso? Já tratou da reforma administrativa? Já reduziu a legião de utentes da vaca marsupial pública? Já reduziu as despesas públicas correntes? Já agilizou a máquina judicial? Já reformou a fábrica de analfabetos funcionais?

25/05/2009

Eu diria mesmo mais

"Nunca vi um pessimista criar um único posto de trabalho" disse ontem Sócrates, na sua encarnação de secretário-geral, durante um jantar-comício (suponho nestes eventos se forneça alimento para o corpo e para o espírito).

Eu diria mesmo mais, também nunca vi um optimista criar um único posto de trabalho. Os postos de trabalho são criados pelo investimento ou, mais exactamente, por algum investimento. Nuns casos com dinheiro de pessimistas (o investimento potencialmente mais reprodutivo), noutros por dinheiro de optimistas (o investimento de maior risco). Infelizmente o investimento público é feito por optimistas com o dinheiro dos pessimistas.

CASE STUDY: First In, First Out? Last In, First Out?

As crises precedentes apresentam um padrão nos diferentes sectores da economia americana que pode ajudar a antecipar o seu comportamento na actual. Pelo menos é o que concluem os homens da McKinsey («Mapping decline and recovery across sectors», The McKinsey Quartely), que, como se sabe, foram apanhados a dormir como todos os outros.

Clicar para ampliar

24/05/2009

BLOGARIDADES: antes do tempo

Um e outro falam sobre a geração deles, os olhares e o resto como eu poderia falar sobre a minha geração, que por um feliz acaso também mete um Bénard um bocadinho mais novo, por alturas do Tempo e o Modo.

Estão definitivamente a ficar velhos – antes do tempo.

DIÁRIO DE BORDO: reparando o Hubble (2)


John Grunsfeld, fotografado por Andrew Feustel (reflectido no visor de Grunsfeld), prepara-se para reparar o Hubble.

O melhor do comércio externo são as importações

O estudo «Multi-product Firms and Product Turnover in the Developing World: Evidence from India», citado recentemente pela Economist, analisa os efeitos na economia indiana da redução drástica de 2/3 das tarifas alfandegárias imposta à Índia pelo FMI em 1991, como condição para o pacote de assistência financeira.

Contrariamente à vulgata esquerdista, que certamente teria antecipado as maiores catástrofes em matéria de crescimento e desemprego, a economia indiana reagiu excepcionalmente bem. Sendo certo que as importações duplicaram entre 1991 e 1997, a produção industrial aumentou 50% nesse mesmo período, devido essencialmente à disponibilidade de bens de intermédios e de capital mais baratos. Por razões que o estudo explica, a importação desses bens mais do triplicou entre finais dos anos 80 e 2000, enquanto a importação de bens de consumo não chegou a duplicar.

Os efeitos teriam sido naturalmente muito diferentes se, ao contrário do que se passou, o crescimento das importações de bens de consumo tivesse sido significativamente superior ao de bens de intermédios e de capital. O que se teria passado nesse caso seria provavelmente muito semelhante ao que se passou com a economia portuguesa: estagnação e endividamento.

Em conclusão, o melhor do comércio externo são as importações (na condição de se exportar o suficiente para as pagar).

23/05/2009

22/05/2009

A via rápida de bestial para besta

O «voto de louvor e confiança» ao «bom senso e rigor» de João Rendeiro há um ano proposto por Pinto Balsemão, Saviotti e Vaz Guedes (certamente aprovado por unanimidade e aclamação) transformou-se ontem num voto de desconfiança.

Recordemos que durante 2007 já os mercados de capitais tinham iniciado uma queda consistente das alturas estratosféricas. Do final de 2007 para o voto de louvor, os índices mais importantes tinham caído acentuadamente: Euro Stoxx 50 de 4400 para 3800, o Dow Jones de 13400 para 12800, o S&P de 1500 para 1400, o Footsie de 6500 para 5500, o Nikkei de 16500 para 13000. Como seria possível o doutor Rendeiro ter uma galinha dos ovos de ouro só para eles?

O que levará gente tão experiente a enganar-se tão redondamente nos movimentos dos mercados e, sobretudo, na avaliação das pessoas? Como explicar a migração do bom senso e rigor para a falta de senso e de rigor e da confiança para a desconfiança em 12 meses a respeito de alguém que conheciam há anos?

DIÁRIO DE BORDO: reparando o Hubble (1)


O telescópio Hubble acabava de ser capturado e amarrado ao Space Shuttle Atlantis lançado no dia 9. Começavam as reparações.