Enquanto por cá os 64 mortos do incêndio de Pedrógão não inspiraram mais do que manobras de spin do governo, com a poderosa ajuda do jornalismo de causas e dos mídia do regime, no mesmo fuso horário, a 3 horas de voo, perante um desastre que vitimou 79 residentes na Torre Grenfell, o governo inglês de May (não exactamente um prodígio de sound judgement) e os mídia reagiram de modo radicalmente diferente.
Apesar da resposta dos meios de combate ao incêndio em Londres terem funcionado sem falhas (ao contrário de cá), apesar do governo de May não ter entre os seus membros ninguém especialmente envolvido com o revestimento do edifício que teve um papel decisivo no desastre (ao contrário de cá, em que Costa foi o MAI que aprovou o SIRESP que falhou, uma vez mais, em toda a linha e o actual ministro da Agricultura, responsável pelas florestas, ocupa pela 3.ª vez nos últimos 22 anos a mesma pasta), apesar disso, May pediu desculpa ao povo britânico pelo acontecido.
Foram imediatamente iniciados inquéritos para apurar o que causou e porque se propagou o incêndio tão rapidamente. As conclusões preliminares apontam para o revestimento ter tido um papel decisivo e a Arconic, o seu fabricante, interrompeu imediatamente as vendas desses painéis. As autoridades locais estão a remover revestimentos semelhantes potencialmente perigosos em 95 edifícios já identificados e a instalar sistemas de sprinklers. A polícia fez saber que estão a ser consideradas acusações de homicídio involuntário porque concluíram que partes da Grenfell Tower falharam nos testes de segurança.
O que se passou por cá? Nada, tirando o jogo do empurra entre as diversas áreas da administração, as perguntas do governo e, claro, o choro da ministra e os abraços e beijinhos do performer que faz o papel de presidente da República.
Ah, claro, já me esquecia, também tivemos um clérigo do trotskismo a exigir, sob o olhar compreensivo do ministro do Agricultura, «a redução forçada das manchas de eucalipto», por acaso a espécie florestal que menos arde e que é economicamente sustentável.
30/06/2017
TIROU-ME AS PALAVRAS DA BOCA: É possível que haja uma diferença entre uma fraude intelectual e as teses tele-evangelistas mas é difícil descobrir (2)
Tele-evangelista no púlpito, antes de ascender ao Olimpo do Conselho de Estado e do Conselho Consultivo do Banco de Portugal |
Desta vez a fraude intelectual é «única medida estrutural que salva Portugal: a reflorestação com a redução forçada das manchas de eucalipto» que Louçã propõe na sua «Agenda do rescaldo» que eu me propus desmistificar antes de ler o que outros com mais propriedade fizeram.
Por exemplo Henrique Pereira dos Santos, um arquitecto paisagista que sabe do que escreve e num artigo do jornal Eco («Eucaliptocratas, diz ele») desfaz linha a linha os argumentos de pós-verdades e os factos alternativos que a mente alucinada do tele-evangelista e picareta falante produziu a respeito dos coitados dos eucaliptos. E, se dispuser de mais uns minutos, também pode ler o artigo de José Manuel Fernandes no Observador [«Incêndios, eucaliptos ou a ignorância e arrogância do Bloco (e do dr. Louçã)»] que aliás cita o de Pereira dos Santos.
29/06/2017
CASE STUDY: Trumpologia (21) - Depois de mim virá quem bom me fará, podia ter dito o Barack
Mais trumpologia.
É bastante significativo que dos 37 países considerados (8 das Américas, 6 de África, 7 da Ásia, 4 do Médio Oriente, 11 da Europa e a Rússia), apenas na Rússia (por uma grande diferença) e em Israel (por uma pequena) a taxa de aprovação do Donald é mais elevada do que a do Barack. Nos restantes a diferença é da ordem das dezenas de pontos percentuais (lista completa). Serão o Donald e o Vladimir almas gémeas?
The Economist |
É bastante significativo que dos 37 países considerados (8 das Américas, 6 de África, 7 da Ásia, 4 do Médio Oriente, 11 da Europa e a Rússia), apenas na Rússia (por uma grande diferença) e em Israel (por uma pequena) a taxa de aprovação do Donald é mais elevada do que a do Barack. Nos restantes a diferença é da ordem das dezenas de pontos percentuais (lista completa). Serão o Donald e o Vladimir almas gémeas?
28/06/2017
A mentira como política oficial (34) - A realidade paralela dos autocratas
Erdogan trumps Darwin: Turkey
«Any day now, the education ministry is expected to publish changes to the official curriculum. The latest addition is a class on last summer’s coup attempt against the government of Recep Tayyip Erdogan. Booklets distributed to schoolchildren last year described the coup as an attempt by foreign powers to occupy Turkey. The new course is likely to be just as enlightening. To spare impressionable minds further confusion about the state of the world, officials have also removed the theory of evolution from high-school biology books; such subjects are “beyond [the] comprehension” of the young, reckons the head of the education board. Mr Erdogan is determined, however, to teach children respect for all lifestyles: on Sunday his policemen broke up an LGBT pride rally in Istanbul using tear-gas and rubber bullets. Turkish parents can rest easy. Their children are surely in good hands.»
The Economist Espresso de ontem
«Any day now, the education ministry is expected to publish changes to the official curriculum. The latest addition is a class on last summer’s coup attempt against the government of Recep Tayyip Erdogan. Booklets distributed to schoolchildren last year described the coup as an attempt by foreign powers to occupy Turkey. The new course is likely to be just as enlightening. To spare impressionable minds further confusion about the state of the world, officials have also removed the theory of evolution from high-school biology books; such subjects are “beyond [the] comprehension” of the young, reckons the head of the education board. Mr Erdogan is determined, however, to teach children respect for all lifestyles: on Sunday his policemen broke up an LGBT pride rally in Istanbul using tear-gas and rubber bullets. Turkish parents can rest easy. Their children are surely in good hands.»
The Economist Espresso de ontem
Agitprop e spin, agora e sempre
Um observador atento da produção "noticiosa" dos mídia desde o fatídico dia 17 terá notado um aumento substancial do caudal de "boas notícias", normalmente já volumoso. Caudal que foi bruscamente diminuído na passada segunda-feira para dar lugar à transformação de um suicídio aparentemente inexistente no suicídio político de Passos Coelho.
Uma das "boas notícias" aproveitada pelos spin doctors socialistas foi o encontro «de mais de 30 minutos» de Costa com Narendra Modi, no Palácio das Necessidades, encontro estranhamente não previamente anunciado. Para quê um encontro de mais de 30 minutos? perguntareis. Não se sabe bem. Aparentemente, houve falhas no spin e as versões publicadas não estavam devidamente alinhadas.
Segundo o Expresso, o semanário de reverência, a coisa parece ter sido para apreciaram a «vista para o Tejo e a Ponte 25 de Abril». O jornal Eco destaca o acordo para criar um fundo de quatro milhões de euros para ciência e tecnologia - não se riam, mas até nas pobres despesas de I&D aqui no burgo (uns 2,3 mil milhões) os quatro milhões são uma ridicularia de 0,17%. O Negócios titula que «Costa e Modi clicam para lançamento do Índia Portugal Startup Hub». Finalmente a nota do governo fala nos 11 acordos de cooperação assinados.
Contudo, o grande teste do spin vai ser a tentativa de apagamento da «"fita do tempo” das comunicações registadas pela Autoridade Nacional da Protecção Civil (ANPC)», segundo a qual «as comunicações fracassaram quase por completo, impedindo a ajuda às populações em perigo. E causaram o caos entre as diversas forças envolvidas no combate, que não conseguiam comunicar entre si.» (PÚBLICO)
Segundo o Expresso Curto de ontem, aquelas informações são conhecidas de Costa desde o dia 23. Como uma das manobras possíveis de apagamento pode passar pela demissão da MAI, cito Filipe Santos Costa que escreveu nesse mesmo Expresso Curto: «A ironia, porém, é esta: Constança Urbano de Sousa pode acabar por sair do Governo por causa de um sistema de comunicações que foi comprado pelo primeiro-ministro, quando este era MAI. É a política no seu pior.»
Uma das "boas notícias" aproveitada pelos spin doctors socialistas foi o encontro «de mais de 30 minutos» de Costa com Narendra Modi, no Palácio das Necessidades, encontro estranhamente não previamente anunciado. Para quê um encontro de mais de 30 minutos? perguntareis. Não se sabe bem. Aparentemente, houve falhas no spin e as versões publicadas não estavam devidamente alinhadas.
Segundo o Expresso, o semanário de reverência, a coisa parece ter sido para apreciaram a «vista para o Tejo e a Ponte 25 de Abril». O jornal Eco destaca o acordo para criar um fundo de quatro milhões de euros para ciência e tecnologia - não se riam, mas até nas pobres despesas de I&D aqui no burgo (uns 2,3 mil milhões) os quatro milhões são uma ridicularia de 0,17%. O Negócios titula que «Costa e Modi clicam para lançamento do Índia Portugal Startup Hub». Finalmente a nota do governo fala nos 11 acordos de cooperação assinados.
Contudo, o grande teste do spin vai ser a tentativa de apagamento da «"fita do tempo” das comunicações registadas pela Autoridade Nacional da Protecção Civil (ANPC)», segundo a qual «as comunicações fracassaram quase por completo, impedindo a ajuda às populações em perigo. E causaram o caos entre as diversas forças envolvidas no combate, que não conseguiam comunicar entre si.» (PÚBLICO)
Segundo o Expresso Curto de ontem, aquelas informações são conhecidas de Costa desde o dia 23. Como uma das manobras possíveis de apagamento pode passar pela demissão da MAI, cito Filipe Santos Costa que escreveu nesse mesmo Expresso Curto: «A ironia, porém, é esta: Constança Urbano de Sousa pode acabar por sair do Governo por causa de um sistema de comunicações que foi comprado pelo primeiro-ministro, quando este era MAI. É a política no seu pior.»
27/06/2017
ARTIGO DEFUNTO: O suicídio de Passos e a arte do agitprop. Aprendam como se faz (2)
Continuação daqui.
Às 11:00 a mesma pesquisa Google de ontem já se tinha multiplicado por 6 e ainda a procissão ia no adro.
Se de uma maneira geral a máquina de agitprop da geringonça funciona muito bem, há casos de excelência. Veja-se a secção de Opinião de um dos diários da manhã:
Qual destes opinion dealers usou a sua argúcia argumentativa para expor as tretas do Costa sobre o incêndio de Pedrogão Grande? Eu perguntaria mesmo mais: qual destes opinion dealers usou a sua argúcia argumentativa para expor quaisquer tretas do Costa?
Às 11:00 a mesma pesquisa Google de ontem já se tinha multiplicado por 6 e ainda a procissão ia no adro.
Se de uma maneira geral a máquina de agitprop da geringonça funciona muito bem, há casos de excelência. Veja-se a secção de Opinião de um dos diários da manhã:
Qual destes opinion dealers usou a sua argúcia argumentativa para expor as tretas do Costa sobre o incêndio de Pedrogão Grande? Eu perguntaria mesmo mais: qual destes opinion dealers usou a sua argúcia argumentativa para expor quaisquer tretas do Costa?
Vivemos num estado policial? (12) - Sim, vivemos. E talvez por isso os polícias nunca são suficientes
Outros casos de polícia: (1), (2), (3), (4), (5), (6), (7), (8), (9), (10) e (11).
Recapitulando:
Segundo o relatório da OCDE divulgado em Fevereiro, Portugal «tem 432 polícias por 100 mil habitantes, um valor que torna a polícia portuguesa 36% mais bem equipada do que as polícias na média dos países europeus» (jornal Eco).
Segundo os números divulgados pelo SOL, 10% dos 21 mil polícias são sindicalistas de 13 sindicatos diferentes e faltaram em 2013 23 mil dias por actividades sindicais. 600 dos 2.100 sindicalistas são dirigentes e cada um tem direito a 4 dias de folga por mês, os restantes 1.500 são delegados sindicais e podem ter 12 horas de folga por mês. As folgas não usadas acumulam-se como «créditos» para o mês seguinte. Dirigentes e delegados sindicais não podem ser transferidos de local de «trabalho» sem acordo expresso.
Não obstante,
Esta aparente abundância de meios não impediu que, segundo o presidente da Associação dos Profissionais da Guarda (APG) disse ao diário do regime, «em cada um dos três concelhos afectados pelo incêndio que há mais de uma semana matou 64 pessoas no centro do país (apenas existiam) dois homens e um carro patrulha».
Assim, a "estrada da morte" não foi cortada por “falta de meios”, titulou o diário. Parêntesis: em que ficamos? Costa disse que a GNR lhe tinha dito que não cortaram a estrada «porque a ameaça naquele local surgiu de forma repentina e inusitada».
E porque só existiam dois homens e um carro patrulha? Segundo o presidente da APG porque, por exemplo, «o posto da GNR de Pedrógão Grande, que tem 15 militares, quando deveria ter o “dobro”. No fim-de-semana do incêndio, entre militares de folga e de férias, restavam dois agentes em patrulha e um no posto».
E se fossem o "dobro" quantos teríamos no fim de fim-de-semana do incêndio? Aí segundo a aritmética do presidente da APG teríamos quatro agentes em patrulha e dois no posto. Seria esse dispositivo suficiente para cortar N236?
Não, segundo um general de GNR ouvido pelo outro diário do regime que disse «para garantir o completo bloqueamento destes pontos seriam precisos 20 homens com viaturas, principalmente motos. Mas como se anda aos pares, seriam quase 15 patrulhas (5 motos e 10 carros), ou seja, 25 homens", »
Agora sim, estamos em condições de estimar o efectivo necessário no posto de Pedrógão Grande para bloquear a N236 naquele fim-de-semana fatídico: 75 agentes = 25 agentes x 15 agentes/5 agentes.
Não admira por isso que como confessou o presidente da APG «alguns militares estão a ter acompanhamento psicológico e estão mesmo de baixa, encontrando-se “tremendamente afectados” pelo que aconteceu».
Recapitulando:
Segundo o relatório da OCDE divulgado em Fevereiro, Portugal «tem 432 polícias por 100 mil habitantes, um valor que torna a polícia portuguesa 36% mais bem equipada do que as polícias na média dos países europeus» (jornal Eco).
Não obstante,
Esta aparente abundância de meios não impediu que, segundo o presidente da Associação dos Profissionais da Guarda (APG) disse ao diário do regime, «em cada um dos três concelhos afectados pelo incêndio que há mais de uma semana matou 64 pessoas no centro do país (apenas existiam) dois homens e um carro patrulha».
Assim, a "estrada da morte" não foi cortada por “falta de meios”, titulou o diário. Parêntesis: em que ficamos? Costa disse que a GNR lhe tinha dito que não cortaram a estrada «porque a ameaça naquele local surgiu de forma repentina e inusitada».
E porque só existiam dois homens e um carro patrulha? Segundo o presidente da APG porque, por exemplo, «o posto da GNR de Pedrógão Grande, que tem 15 militares, quando deveria ter o “dobro”. No fim-de-semana do incêndio, entre militares de folga e de férias, restavam dois agentes em patrulha e um no posto».
E se fossem o "dobro" quantos teríamos no fim de fim-de-semana do incêndio? Aí segundo a aritmética do presidente da APG teríamos quatro agentes em patrulha e dois no posto. Seria esse dispositivo suficiente para cortar N236?
Não, segundo um general de GNR ouvido pelo outro diário do regime que disse «para garantir o completo bloqueamento destes pontos seriam precisos 20 homens com viaturas, principalmente motos. Mas como se anda aos pares, seriam quase 15 patrulhas (5 motos e 10 carros), ou seja, 25 homens", »
Agora sim, estamos em condições de estimar o efectivo necessário no posto de Pedrógão Grande para bloquear a N236 naquele fim-de-semana fatídico: 75 agentes = 25 agentes x 15 agentes/5 agentes.
Não admira por isso que como confessou o presidente da APG «alguns militares estão a ter acompanhamento psicológico e estão mesmo de baixa, encontrando-se “tremendamente afectados” pelo que aconteceu».
Sound bites e nevoeiro informativo
Fonte |
- «Estado antecipa mais 500 milhões ao FMI e vai menos ao mercado em 2017» (DN)
- «António Costa quer antecipar reembolsos ao FMI» (RTP)
- «O Estado português espera reembolsar antecipadamente 1,7 mil milhões de euros ao Fundo Monetário Internacional este ano» (JN)
- «Portugal antecipa pagamento de 1,7 mil milhões de euros ao FMI» Observador
29-04-2017
- «Tesouro quer antecipar pagamento de 6500 milhões ao FMI em 2018» (Público)
- «Governo antecipa pagamento de 7200 milhões até 2019 ao FMI» (Público)
- «Governo prevê antecipar pagamento de €7200 milhões ao FMI em 2018 e 2019» (Expresso)
- «FMI. Portugal pede para antecipar pagamento de 10 mil milhões de euro» (Sol)
- «Centeno diz que reembolso antecipado ao FMI "não é para concluir" nesta legislatura» (Porto Canal)
- «Governo vai antecipar pagamento de mil milhões de euros ao FMI até ao final do mês» (Negócios)
- «Portugal quer antecipar o pagamento até final deste mês de mil milhões de euros de divida que tem para com FMI.» (RTP)
- «Governo vai antecipar pagamento de mil milhões de euros ao FMI até ao final do mês» (Sábado)
- «Portugal quer antecipar pagamento de €10 mil milhões ao FMI» (Expresso)
26/06/2017
ARTIGO DEFUNTO: O suicídio de Passos e a arte do agitprop. Aprendam como se faz
Nos últimos 10 dias, Costa, ministros e dirigentes do PS disseram dezenas de mentiras, meias-mentiras, meias-verdades, omitiram verdades e contradisseram-se inúmeras vezes só a propósito do incêndio de Pedrógão Grande. Com excepção de um pequeníssimo número de comentadores desalinhados, foi precisa uma lupa para encontrar na imprensa um exercício de fact checking a esse respeito.
Num episódio relativamente raro de diarreia verbal, Passos Coelho disse com indesculpável ligeireza que houve «pessoas que puseram termo à vida em desespero» na sequência do incêndio de Pedrógão Grande. Parece que não houve.
Poucas horas depois desta argolada, a máquina da geringonça pôs-se em marcha e um dilúvio de fact checking inundou as páginas online dos jornais desacreditando Passos Coelho. Às 20:00 uma pesquisa Google mostrou aquele número espantoso de ocorrências - ainda que expurgado de redundâncias e de posts de blogues (em todo o caso alguns deles ao serviço do agitprop), restam centenas de referências na imprensa.
Num episódio relativamente raro de diarreia verbal, Passos Coelho disse com indesculpável ligeireza que houve «pessoas que puseram termo à vida em desespero» na sequência do incêndio de Pedrógão Grande. Parece que não houve.
Poucas horas depois desta argolada, a máquina da geringonça pôs-se em marcha e um dilúvio de fact checking inundou as páginas online dos jornais desacreditando Passos Coelho. Às 20:00 uma pesquisa Google mostrou aquele número espantoso de ocorrências - ainda que expurgado de redundâncias e de posts de blogues (em todo o caso alguns deles ao serviço do agitprop), restam centenas de referências na imprensa.
Crónica da anunciada avaria irreparável da geringonça (89)
Outras avarias da geringonça.
Para refrescar as memórias apagadas pelo jornalismo de causas, convirá recordar que o Lacerda Machado, amigo que Costa encarregou de negociar a reversão da reprivatização e de seguida nomeou administrador da TAP, é o mesmo Lacerda Machado administrador da Geocapital (com os dinheiros de Stanley Ho) que detinha 65% da VEM (Varig Engenharia e Manutenção) em parceria com a TAP que detinha 35%, parceria negociada em 2005 com o governo Sócrates. E era o mesmo Lacerda Machado que quando se comprovou que a VEM era um negócio falhado usou uma cláusula do contrato que ele tinha empandeirado ao governo para forçar a TAP a comprar em 2007 os 65% da Geocapital ficando a TAP desde então a suportar os prejuízos (ver aqui um resumo). E é o mesmo Lacerda Machado que fez parte da equipa que Costa como ministro da Administração Interna nomeou para renegociar o contrato do SIRESP, sistema que tem uma história de falhanços, o último dos quais no incêndio de Pedrógão Grande (ver aqui um resumo e ver aqui a história). E foi o mesmo Lacerda Machado que o mesmo Costa encarregou de negociar os helicópteros Kamov para combate aos incêndios florestais, frequentemente inaptos para voar, que segundo as contas do Expresso até Abril do ano passado tinham custado 348 milhões de euros ou 35 mil euros por hora de voo.
Para refrescar as memórias apagadas pelo jornalismo de causas, convirá recordar que o Lacerda Machado, amigo que Costa encarregou de negociar a reversão da reprivatização e de seguida nomeou administrador da TAP, é o mesmo Lacerda Machado administrador da Geocapital (com os dinheiros de Stanley Ho) que detinha 65% da VEM (Varig Engenharia e Manutenção) em parceria com a TAP que detinha 35%, parceria negociada em 2005 com o governo Sócrates. E era o mesmo Lacerda Machado que quando se comprovou que a VEM era um negócio falhado usou uma cláusula do contrato que ele tinha empandeirado ao governo para forçar a TAP a comprar em 2007 os 65% da Geocapital ficando a TAP desde então a suportar os prejuízos (ver aqui um resumo). E é o mesmo Lacerda Machado que fez parte da equipa que Costa como ministro da Administração Interna nomeou para renegociar o contrato do SIRESP, sistema que tem uma história de falhanços, o último dos quais no incêndio de Pedrógão Grande (ver aqui um resumo e ver aqui a história). E foi o mesmo Lacerda Machado que o mesmo Costa encarregou de negociar os helicópteros Kamov para combate aos incêndios florestais, frequentemente inaptos para voar, que segundo as contas do Expresso até Abril do ano passado tinham custado 348 milhões de euros ou 35 mil euros por hora de voo.
Dúvidas (201) - Quem é o Sebastião Pereira? Tem carteira profissional?
Perguntam patrioticamente as agências MadreMedia e Lusa |
E eu pergunto mesmo mais: quem é Javier Martín que escreve no El País?; quem é Aitor Hernández-Morales que escreve no El Espanõl? Têm carteira profissional?
Não seria preciso esta manifestação de estupidez corporativa para ficarmos a saber que um bom número de gente empregada nos jornais, além de estar atrelada à geringonça, confirmado pelo que escreveram sobre o incêndio de Pedrógão Grande, sofre disso mesmo: estupidez corporativa. Tenham vergonha e não façam de Portugal uma espécie de Venezuela ou Turquia, como escreveu a Silvia Román que o Sindicato dos Jornalistas despudoradamente cita.
25/06/2017
Dúvidas (200) - E os riscos de depender da banca portuguesa?
Na 5.ª coluna sua coluna da página 5 do Caderno de Economia do semanário de reverência, Nicolau Santos, o admirador de Baptista da Silva, nosso pastorinho favorito da economia dos amanhãs que cantam e promotor das doutrinas da Mouse School of Economics, publica um artigo com o sonoro título «Riscos de depender da banca espanhola», vituperando a presença crescente dos bancos espanhóis com o fortis ratio «durante a crise em Portugal (de 2002) os bancos espanhóis deixaram de comprar as emissões de dívida da República Portuguesa como cortaram o crédito às empresas públicas».
Considerando que resgate de 2011 pela troika se tornou indispensável essencialmente pelo crescimento da dívida pública e pela dívida das empresas públicas (nem toda ela contabilizada como dívida pública), crescimento entusiasticamente suportado pelos bancos portugueses, não seria mais apropriado a contrario sensu escrever um artigo com o título «Riscos de depender da banca portuguesa»?
Considerando que resgate de 2011 pela troika se tornou indispensável essencialmente pelo crescimento da dívida pública e pela dívida das empresas públicas (nem toda ela contabilizada como dívida pública), crescimento entusiasticamente suportado pelos bancos portugueses, não seria mais apropriado a contrario sensu escrever um artigo com o título «Riscos de depender da banca portuguesa»?
ARTIGO DEFUNTO: Se quisermos saber o que se passou no incêndio de Pedrógão Grande é melhor catar na imprensa portuguesa o que escapou às malhas
Continuação daqui, dali e dacolá.
Por entre as frestas do controlo quase sem falhas dos mídia ocupados pelo jornalismo acolitado à geringonça, escapam algumas informações divergentes da versão oficial. Leia-se este artigo do Expresso Diário de 23-06, também publicado na última página do caderno principal da versão em papel, que contraria frontalmente a versão oficial sobre as origens do incêndio.
«Daniel foi ouvindo em silêncio, ao longo dos dias, as explicações para o incêndio que atingiu Pedrógão Grande. Logo no domingo, António Costa foi o primeiro a falar de trovoada seca, após duas horas de reunião no Comando Nacional de Operações de Socorro da Autoridade Nacional da Proteção Civil, mas afirmou que ainda era "prematuro tirar ilações". Depois surgiu a declaração do diretor nacional da Polícia Judiciária, perentória: "A PJ, em perfeita articulação com a GNR, conseguiu determinar a origem do incêndio e tudo aponta muito claramente para que sejam causas naturais. Inclusivamente encontrámos a árvore que foi atingida por um raio", disse Almeida Rodrigues. Seguiram-se dias de confirmações e desmentidos: os populares a dizer que não houve trovoada, os bombeiros a falar de mão criminosa, o Laboratório Científico da PJ a voltar ao terreno, o IPMA a confinrar os trovões, a recuar depois para ponderação, a afirmar outra vez que houve raios no céu, ali, em Escales Fundeiros, aldeia de Pedrógão Grande com pouco mais de 40 habitantes, onde tudo começou.
Por entre as frestas do controlo quase sem falhas dos mídia ocupados pelo jornalismo acolitado à geringonça, escapam algumas informações divergentes da versão oficial. Leia-se este artigo do Expresso Diário de 23-06, também publicado na última página do caderno principal da versão em papel, que contraria frontalmente a versão oficial sobre as origens do incêndio.
«Daniel foi ouvindo em silêncio, ao longo dos dias, as explicações para o incêndio que atingiu Pedrógão Grande. Logo no domingo, António Costa foi o primeiro a falar de trovoada seca, após duas horas de reunião no Comando Nacional de Operações de Socorro da Autoridade Nacional da Proteção Civil, mas afirmou que ainda era "prematuro tirar ilações". Depois surgiu a declaração do diretor nacional da Polícia Judiciária, perentória: "A PJ, em perfeita articulação com a GNR, conseguiu determinar a origem do incêndio e tudo aponta muito claramente para que sejam causas naturais. Inclusivamente encontrámos a árvore que foi atingida por um raio", disse Almeida Rodrigues. Seguiram-se dias de confirmações e desmentidos: os populares a dizer que não houve trovoada, os bombeiros a falar de mão criminosa, o Laboratório Científico da PJ a voltar ao terreno, o IPMA a confinrar os trovões, a recuar depois para ponderação, a afirmar outra vez que houve raios no céu, ali, em Escales Fundeiros, aldeia de Pedrógão Grande com pouco mais de 40 habitantes, onde tudo começou.
24/06/2017
CASE STUDY: O império de Bezos é muito mais do que a Amazon
Fonte: MarketWatch |
ARTIGO DEFUNTO: Se quisermos saber o que se passou no incêndio de Pedrógão Grande (e nos outros) é melhor ler a imprensa espanhola
Continuação daqui e dali.
«El cártel español del fuego amañó contratos de extinción de incendios en Portugal
El gobierno luso pagó hasta tres veces más de lo que realmente costaba el servicio contratado.
Según la declaración de los propios investigados, sus años de mayor actividad en Portugal fueron 2006 y 2007, pero el sumario del caso investiga adjudicaciones en el país vecino hasta 2015, año en el que se lanza el operativo y se dictan las primeras detenciones.»
(El Español)
«El cártel español del fuego amañó contratos de extinción de incendios en Portugal
El gobierno luso pagó hasta tres veces más de lo que realmente costaba el servicio contratado.
Según la declaración de los propios investigados, sus años de mayor actividad en Portugal fueron 2006 y 2007, pero el sumario del caso investiga adjudicaciones en el país vecino hasta 2015, año en el que se lanza el operativo y se dictan las primeras detenciones.»
(El Español)
23/06/2017
22/06/2017
Por vezes o declínio é mesmo o declínio, dizem eles. E o que diremos nós?
Não é só a nossa classe política que se vem degradando. Leia-se aqui o que escreve o jornalismo inglês de referência (não, não é de reverência) sobre a classe política deles e em particular sobre os seus líderes:
«IT HAS been impossible to watch the general election without being haunted by a single question-cum-exclamation: surely Britain can do better than this? The best performer in the campaign, Jeremy Corbyn, the Labour leader, is a 68-year-old crypto-communist who has never run anything except his own mouth. Theresa May, the Tory leader, tried to make the election all about herself and then demonstrated that there wasn’t much of a self to make it about. As for Tim Farron, the Liberal Democrats’ leader, he looked more like a schoolboy playing the part of a politician in an end-of-term play than a potential prime minister.
(...)
Yet sometimes decline really is decline. Both Mrs May and Mr Corbyn want to extend the already considerable powers of the government, Mr Corbyn massively so. And both promise to lead Britain out of the European Union, a fiendishly complicated operation. Unfortunately, both candidates have demonstrated that they are the flawed captains of flawed teams. Mrs May broke the first rule of politics: don’t kick your most faithful voters in the teeth for no reason. Mr Corbyn has stood out in part because his team is so mediocre. Diane Abbott, his shadow home secretary, stepped down the day before the election citing ill health, after a succession of disastrous interviews.»
«IT HAS been impossible to watch the general election without being haunted by a single question-cum-exclamation: surely Britain can do better than this? The best performer in the campaign, Jeremy Corbyn, the Labour leader, is a 68-year-old crypto-communist who has never run anything except his own mouth. Theresa May, the Tory leader, tried to make the election all about herself and then demonstrated that there wasn’t much of a self to make it about. As for Tim Farron, the Liberal Democrats’ leader, he looked more like a schoolboy playing the part of a politician in an end-of-term play than a potential prime minister.
(...)
Yet sometimes decline really is decline. Both Mrs May and Mr Corbyn want to extend the already considerable powers of the government, Mr Corbyn massively so. And both promise to lead Britain out of the European Union, a fiendishly complicated operation. Unfortunately, both candidates have demonstrated that they are the flawed captains of flawed teams. Mrs May broke the first rule of politics: don’t kick your most faithful voters in the teeth for no reason. Mr Corbyn has stood out in part because his team is so mediocre. Diane Abbott, his shadow home secretary, stepped down the day before the election citing ill health, after a succession of disastrous interviews.»
ARTIGO DEFUNTO: Se quisermos saber o que se passou no incêndio de Pedrógão Grande é melhor ler a imprensa espanhola (continuação)
Continuando a demonstração definitiva de como os mídia portugueses estão controlados pelos partidos da geringonça e a maioria dos jornalistas portugueses estão ao seu serviço e aproveitando os links deixados por um leitor neste comentário:
Enquanto omitem os factos que mostram a descoordenação total na resposta do governo ao incêndio, vão enchendo o vazio com as tretas de Marcelo que, à boa maneira de jurista, faz como aquele que, tendo como a única ferramenta um martelo, imagina todos os problemas como pregos, e exorta os órgãos legislativos a ejacularem com urgência resmas de leis para resolver os resultados das más políticas florestais que têm um século e os problemas de descoordenação do governo da geringonça na utilização dos meios, misturando tudo isso num caldo de afectos equívocos engrossado pelo nevoeiro informativo.
E o que dizer do parlamento que numa hora aprovou cinco propostas para reforma florestal que estavam na gaveta há dois meses? Com gente desta só é possível ter um simulacro de democracia, uma democracia asmática.
- El Mundo - «Protección Civil de Portugal dice que "confundieron" la explosión de una caravana con un accidente aéreo»
- El Mundo - «Caos en el mayor incendio de la historia de Portugal: 64 muertos, un avión fantasma y 27 aldeas evacuadas»
Enquanto omitem os factos que mostram a descoordenação total na resposta do governo ao incêndio, vão enchendo o vazio com as tretas de Marcelo que, à boa maneira de jurista, faz como aquele que, tendo como a única ferramenta um martelo, imagina todos os problemas como pregos, e exorta os órgãos legislativos a ejacularem com urgência resmas de leis para resolver os resultados das más políticas florestais que têm um século e os problemas de descoordenação do governo da geringonça na utilização dos meios, misturando tudo isso num caldo de afectos equívocos engrossado pelo nevoeiro informativo.
E o que dizer do parlamento que numa hora aprovou cinco propostas para reforma florestal que estavam na gaveta há dois meses? Com gente desta só é possível ter um simulacro de democracia, uma democracia asmática.
21/06/2017
Dúvidas (199) - Para que serve a política?
«Os oligarcas não querem que se “faça política” com a tragédia. Mas se não “fizermos política” com a morte evitável de 64 pessoas, para que serve a política? Só para festejar vitórias na Eurovisão?»
Rui Ramos no Observador
Rui Ramos no Observador
ARTIGO DEFUNTO: Se quisermos saber o que se passou no incêndio de Pedrógão Grande é melhor ler a imprensa espanhola
É a demonstração definitiva de como os mídia portugueses estão controlados pelos partidos da geringonça e a maioria dos jornalistas portugueses estão ao seu serviço. Enquanto isso Costa passeia a sua virgindade nos mídia e diz que o problema dos incêndios florestais levará uma década ou mais para resolver. Ninguém lhe pergunta o que ele fez há mais de uma década, enquanto foi entre 2005 e 2007 precisamente ministro de Estado e da Administração Interna de Sócrates, nem se teria sido preciso uma década para evitar a completa descoordenação dos meios existentes ao dispor do governo.
«Enquanto continua o trabalho de extinção, crescente indignação contra as autoridades para notícias que revelam falhas de coordenação graves nas primeiras horas do fogo. Erros, que de acordo com sobreviventes, pode ter matado dezenas de pessoas.
Para a "rodovia da morte"
Maria de Fátima estava retornando de Coimbra no sábado quando soube que um incêndio afetou a área onde seu pai, um residente de Pedrógão Grande vive. "Quando liguei para me disse que era verdade que o fogo tinha cercado-los completamente e eles estavam em perigo , " ele diz Fátima disse à imprensa portuguesa. "Eu tenho que chegar à cidade e encontrar meu pai, mas quando nós tentamos para deixar a área e tomar o IC8 [a estrada que passa perto da área], a Guarda Nacional Republicana (GNR) ter cortado".
De acordo com Fátima, quando perguntou aos agentes da GNR, por onde deveriam sair da área, disseram-lhe que a Estrada Nacional 236 estava livre de perigo. Ao passar por esta via, no entanto, ela encontrou um cenário apocalíptico.
"A fumaça era tão densa que não se via absolutamente nada, tudo o que ficou para fora eram as chamas por entre as árvores", lembra Fátima. "Nós batemos em algo que estava no meio da estrada, e de repente um carro atrás colidiu com o nosso, e nosso pegou logo fogo. Queríamos sair do carro, mas também o calor era tão intenso que não sabíamos se seríamos capazes de sobreviver lá fora. "
(...)
"Eu não quero ver um político andando por aí, dando condolências. Eles deveriam ter estado aqui quando precisamos deles, eles e a GNR, eu deveria ter cortado as estradas e alertado sobre o que tinha de ser feito. Eles poderiam ter salvo muitas pessoas ...".
Por enquanto, a GNR não esclarece se os agentes espalhados pela na área no sábado cometeram o erro grave de que são acusados, mas o corpo policial prometeu abrir uma investigação para determinar o que falhou nos momentos cruciais.
Falta de informação
Entre os testemunhos de sobreviventes outra queixa frequente é a falta de informação por parte das autoridades, e o pânico que não viveu por não se saber se era necessário evacuar a área ou, caso contrário, esperar por ajuda.»
Excerto de «Los supervivientes del incendio acusan a las autoridades: “Nos arrastraron hacia la muerte”» de El Español
«Enquanto continua o trabalho de extinção, crescente indignação contra as autoridades para notícias que revelam falhas de coordenação graves nas primeiras horas do fogo. Erros, que de acordo com sobreviventes, pode ter matado dezenas de pessoas.
Para a "rodovia da morte"
Maria de Fátima estava retornando de Coimbra no sábado quando soube que um incêndio afetou a área onde seu pai, um residente de Pedrógão Grande vive. "Quando liguei para me disse que era verdade que o fogo tinha cercado-los completamente e eles estavam em perigo , " ele diz Fátima disse à imprensa portuguesa. "Eu tenho que chegar à cidade e encontrar meu pai, mas quando nós tentamos para deixar a área e tomar o IC8 [a estrada que passa perto da área], a Guarda Nacional Republicana (GNR) ter cortado".
De acordo com Fátima, quando perguntou aos agentes da GNR, por onde deveriam sair da área, disseram-lhe que a Estrada Nacional 236 estava livre de perigo. Ao passar por esta via, no entanto, ela encontrou um cenário apocalíptico.
"A fumaça era tão densa que não se via absolutamente nada, tudo o que ficou para fora eram as chamas por entre as árvores", lembra Fátima. "Nós batemos em algo que estava no meio da estrada, e de repente um carro atrás colidiu com o nosso, e nosso pegou logo fogo. Queríamos sair do carro, mas também o calor era tão intenso que não sabíamos se seríamos capazes de sobreviver lá fora. "
(...)
"Eu não quero ver um político andando por aí, dando condolências. Eles deveriam ter estado aqui quando precisamos deles, eles e a GNR, eu deveria ter cortado as estradas e alertado sobre o que tinha de ser feito. Eles poderiam ter salvo muitas pessoas ...".
Por enquanto, a GNR não esclarece se os agentes espalhados pela na área no sábado cometeram o erro grave de que são acusados, mas o corpo policial prometeu abrir uma investigação para determinar o que falhou nos momentos cruciais.
Falta de informação
Entre os testemunhos de sobreviventes outra queixa frequente é a falta de informação por parte das autoridades, e o pânico que não viveu por não se saber se era necessário evacuar a área ou, caso contrário, esperar por ajuda.»
Excerto de «Los supervivientes del incendio acusan a las autoridades: “Nos arrastraron hacia la muerte”» de El Español
NÓS VISTOS POR ELES: A inoperância na luta contra os incêndios
Para contrariar a nossa tendência congénita para olhar para o umbigo e para a oscilação bipolar entre vermo-nos como o povo eleito e sentirmo-nos uns desgraçadinhos, deveríamos obrigar-nos a ler todos os dias ao pequeno-almoço uma avaliação das nossas obras feita pela estranja.
Para o pequeno-almoço de hoje aqui vai um excerto em portinhol do artigo de opinião com o elucidativo título «La inoperancia de Portugal en la lucha contra los incendios» que o jornal El Mundo publicou sobre os incêndios de Pedrógão Grande:
«Ontem, Portugal foi atingido por um terrível incêndio que causou mais de 60 mortes. É a tragédia com mais mortos em um único fogo em quase um quarto de século no mundo, um facto que revela as dimensões de um evento que revelou a ineficácia e a alarmante falta de recursos do Estado Português para lidar com incêndios florestais. Um flagelo que assola todos os anos com especial virulência o país vizinho, sem que as medidas proporcionadas sejam tomadas para combatê-lo.
A Polícia judiciária portuguesa acredita que uma tempestade eléctrica é a causa mais provável do incêndio, cuja rápida disseminação foi devida a "condições climáticas desfavoráveis", especialmente pela combinação de altas temperaturas e ventos fortes. Dezenas de moradores da região que circunda o município de Pedrógão Grande ficaram presos em um inferno de chamas e muitos deles pereceram queimados em veículos em que estavam tentando fugir. Outros morreram carbonizados em plena rua. As autoridades portuguesas, completamente ultrapassadas, mobilizam mais de 700 efectivos. Um dispositivo claramente insuficiente para controlar, conter e, finalmente, para apagar um incêndio de proporções tão devastadoras.
Não é aceitável que, no século XXI, num país da União Europeia um incêndio florestal possa causar um número tão elevado de mortes. Especialmente tendo em conta a história dos últimos anos. O que mostra este terrível episódio é que, hoje, Portugal não está preparado para lidar com o fogo. Nem tem realizado trabalho preventivo adequado, nem sequer dispõe de um dispositivo ideal para controlar, conter e extinguir incêndios, o que revela não só a ineficácia de suas equipes, mas uma preocupante ausência de meios. A crise e o resgate reduziram significativamente a capacidade de investimento do executivo Português. Mas isto não é razão para ignorar uma ameaça tão séria e preocupante como a do fogo, cujas consequências dramáticas excedem os danos ambientais.»
20/06/2017
Crónica da anunciada avaria irreparável da geringonça (88)
Outras avarias da geringonça.
O título desta crónica pode induzir o leitor a pensar que aqui em casa se prevê a avaria iminente da geringonça. O que prevejo não é a iminência, é a irreparabilidade que pode levar ainda algum tempo, dependendo de várias circunstâncias. Contra-intuitivamente, uma das circunstâncias é o aumento das intenções de voto no PS que se arrisca a pôr nervosos os comunistas, fazendo-os sentir-se supérfluos, e demasiado excitados os berloquistas. Um bom indicador do nervoso comunista é o aumento de 36% até Abril do número de greves em relação à paz nupcial do mesmo período do ano passado.
Seja como for, como ainda há dias aqui referi, os 44% de intenções de voto nas últimas sondagens devem fazer-nos lembrar os 41% do PS de José Sócrates em Março de 2010 a um ano do resgate.
O título desta crónica pode induzir o leitor a pensar que aqui em casa se prevê a avaria iminente da geringonça. O que prevejo não é a iminência, é a irreparabilidade que pode levar ainda algum tempo, dependendo de várias circunstâncias. Contra-intuitivamente, uma das circunstâncias é o aumento das intenções de voto no PS que se arrisca a pôr nervosos os comunistas, fazendo-os sentir-se supérfluos, e demasiado excitados os berloquistas. Um bom indicador do nervoso comunista é o aumento de 36% até Abril do número de greves em relação à paz nupcial do mesmo período do ano passado.
Seja como for, como ainda há dias aqui referi, os 44% de intenções de voto nas últimas sondagens devem fazer-nos lembrar os 41% do PS de José Sócrates em Março de 2010 a um ano do resgate.
DIÁRIO DE BORDO: já dei que chegue para o peditório dos incêndios (mas não resisto a dar mais uns trocos)
Ao contrário do que dizem alguns maledicentes, a calamidade resultante do incêndio de Pedrógão Grande não se deve ao governo, nem aos Kamov parados comprados com a ajuda do amigo Lacerda Machado, nem ao engavetamento do Plano Nacional contra Incêndios, nem à ineficácia da protecção civil. Deve-se à trovoada seca e ao aquecimento global. O que devemos ao governo é a prosperidade que atravessamos, prosperidade que os mesmos malecidentes atribuem ao turismo e à conjuntura internacional (para já não falar ao governo anterior).
A sério: é claro que este governo tem culpas no cartório e tem uma enorme falta de vergonha, ajudada pela falta de discernimento dos eleitores, quando procura ter créditos do que não fez e foge com o rabo à seringa do que tem responsabilidades. Contudo, o ponto a que chegámos é o resultado de mais de um século de políticas erradas e incúria. Desde pelo menos 04/09/2005 que venho escrevendo sobre este tema - para não maçar os leitores remeto apenas para o último desses posts - e não vou repetir-me.
Tal como uma dívida de 130% do PIB demoraria décadas a atingir a sustentabilidade e não se paga com afectos, beijinhos, abraços e selfies de Marcelo, nem com as manobras e prestidigitação de Costa, também os incêndios florestais não se resolverão com as mesmas tretas - aliás, parte dos incêndios florestais nunca terá solução e, não, não apenas pelas mudanças climáticas.
Correndo o risco de ser amaldiçoado pelo politicamente correcto e a hipocrisia dominante, faço um prognóstico com elevada probabilidade de se concretizar: a uns dias ou semanas de luto, a donativos de gente generosa e bem intencionada e outra nem por isso, a concertos de solidariedade, seguir-se-ão uns meses ou anos de masturbação teorética, serão produzidas mais ejaculações legislativas, serão criados mais organismos onde poderão ser alojados mais ASPON (assessores de porra nenhuma, como dizem os brasileiros) da família César ou de outras, serão adjudicados mais uns contratos com a assessoria de lacerdas e uns anos e vários milhões de euros depois estaremos mais ou menos no mesmo sítio.
A sério: é claro que este governo tem culpas no cartório e tem uma enorme falta de vergonha, ajudada pela falta de discernimento dos eleitores, quando procura ter créditos do que não fez e foge com o rabo à seringa do que tem responsabilidades. Contudo, o ponto a que chegámos é o resultado de mais de um século de políticas erradas e incúria. Desde pelo menos 04/09/2005 que venho escrevendo sobre este tema - para não maçar os leitores remeto apenas para o último desses posts - e não vou repetir-me.
Tal como uma dívida de 130% do PIB demoraria décadas a atingir a sustentabilidade e não se paga com afectos, beijinhos, abraços e selfies de Marcelo, nem com as manobras e prestidigitação de Costa, também os incêndios florestais não se resolverão com as mesmas tretas - aliás, parte dos incêndios florestais nunca terá solução e, não, não apenas pelas mudanças climáticas.
Correndo o risco de ser amaldiçoado pelo politicamente correcto e a hipocrisia dominante, faço um prognóstico com elevada probabilidade de se concretizar: a uns dias ou semanas de luto, a donativos de gente generosa e bem intencionada e outra nem por isso, a concertos de solidariedade, seguir-se-ão uns meses ou anos de masturbação teorética, serão produzidas mais ejaculações legislativas, serão criados mais organismos onde poderão ser alojados mais ASPON (assessores de porra nenhuma, como dizem os brasileiros) da família César ou de outras, serão adjudicados mais uns contratos com a assessoria de lacerdas e uns anos e vários milhões de euros depois estaremos mais ou menos no mesmo sítio.
19/06/2017
Mitos (257) - Macron não tem aparelho partidário (actualização)
Neste post de 30 de Abril escrevi:
Depois da esperada vitória de Emmanuel Macron na primeira volta das eleições presidenciais francesas, e da menos esperada completa derrota do candidato socialista Benoît Hamon (que entretanto teria tentado montar uma estratégia «brinquebalante», inspirada no zingarelho de Costa), começou a circular entre a comentadoria doméstica a ideia de que Macron não teria um aparelho partidário e ficaria dependente dos partidos estabelecidos, nomeadamente do PS.
Macron não tem um partido? Ça dépend de ce qu'on entend par parti. O En Marche!, a organização que suporta Macron, tem 250 mil membros, o dobro do Partido Socialista francês. E não esqueçamos a história dos partidos em França, nomeadamente a criação do RPF (Rassemblement du peuple français) a partir do nada, por Charles de Gaulle em 1946, e a refundação por François Miterrand do PS francês no congresso de Épinay em 1971, a partir dos cacos dos grupúsculos de inspiração socialista.
Resultados da 2.ª volta:
Os franceses têm uma espécie de novo RPF. Irão agora procurar um novo François Miterrand para refundar o PS francês que em 5 anos que caiu de 280 para 29 deputados?
Depois da esperada vitória de Emmanuel Macron na primeira volta das eleições presidenciais francesas, e da menos esperada completa derrota do candidato socialista Benoît Hamon (que entretanto teria tentado montar uma estratégia «brinquebalante», inspirada no zingarelho de Costa), começou a circular entre a comentadoria doméstica a ideia de que Macron não teria um aparelho partidário e ficaria dependente dos partidos estabelecidos, nomeadamente do PS.
Macron não tem um partido? Ça dépend de ce qu'on entend par parti. O En Marche!, a organização que suporta Macron, tem 250 mil membros, o dobro do Partido Socialista francês. E não esqueçamos a história dos partidos em França, nomeadamente a criação do RPF (Rassemblement du peuple français) a partir do nada, por Charles de Gaulle em 1946, e a refundação por François Miterrand do PS francês no congresso de Épinay em 1971, a partir dos cacos dos grupúsculos de inspiração socialista.
Resultados da 2.ª volta:
L'Express |
O politicamente correcto é inimigo da ciência
Há já alguns anos escrevi aqui: as ideologias, em particular os fascismos, como o comunismo, o nazismo, o fundamentalismo islâmico, sem esquecer o politicamente correcto, são inimigas da ciência. Todos os dias temos exemplos disso e ao ler a peça «Onde se meteu a “correcção política”» de Vasco Pulido Valente encontrei mais um.
Como escreve Pulido Valente, tal como a maioria dos portugueses, não li a Bíblia nem senti a necessidade de lê-la e não sei se faço parte da pequena parte dos indígenas que ainda conservam alguma coisa dentro da cabeça pelo que a tradução da Bíblia de Frederico Lourenço talvez não venha a dar-me uma grande ajuda.
Por tudo isso, só confiando na erudição e no discernimento (há boas razões para tal) e na imparcialidade (as razões são menos boas) de Pulido Valente, posso acompanhá-lo na sua conclusão de que a tradução de Frederico Lourenço está irremediavelmente contaminada pelo politicamente correcto ao ponto de traduzir “Filho do Homem” por “Filho da Humanidade”«por causa da “sensibilidade de género”, que de resto se manifesta pela tradução inteira: onde aparece “homem”, se possível Lourenço escreve “ser humano”, enquanto as mulheres são sempre mulheres. Esta conformidade estúpida ao “politicamente correcto” data e deforma a tradução, além de a tornar inútil para qualquer construção teológica. (...) Falta dizer que na sombra pesa o movimento a favor do sacerdócio das mulheres.»
Sendo assim, Frederico Lourenço é mais um dos que em nome das «boas causas» perverte insidiosamente o seu trabalho. Dirão, no domínio inofensivo da “sensibilidade de género”, destes expedientes não vem mal ao mundo. Mas vem, porque é o reflexo da mesma atitude que legitima a pós-verdade e os factos alternativos que, com outros nomes, é tão velha quanto a humanidade. Com essa atitude e em nome de variadas causas já se exilou, prendeu, queimou, torturou e assassinou.
Como escreve Pulido Valente, tal como a maioria dos portugueses, não li a Bíblia nem senti a necessidade de lê-la e não sei se faço parte da pequena parte dos indígenas que ainda conservam alguma coisa dentro da cabeça pelo que a tradução da Bíblia de Frederico Lourenço talvez não venha a dar-me uma grande ajuda.
Por tudo isso, só confiando na erudição e no discernimento (há boas razões para tal) e na imparcialidade (as razões são menos boas) de Pulido Valente, posso acompanhá-lo na sua conclusão de que a tradução de Frederico Lourenço está irremediavelmente contaminada pelo politicamente correcto ao ponto de traduzir “Filho do Homem” por “Filho da Humanidade”«por causa da “sensibilidade de género”, que de resto se manifesta pela tradução inteira: onde aparece “homem”, se possível Lourenço escreve “ser humano”, enquanto as mulheres são sempre mulheres. Esta conformidade estúpida ao “politicamente correcto” data e deforma a tradução, além de a tornar inútil para qualquer construção teológica. (...) Falta dizer que na sombra pesa o movimento a favor do sacerdócio das mulheres.»
Sendo assim, Frederico Lourenço é mais um dos que em nome das «boas causas» perverte insidiosamente o seu trabalho. Dirão, no domínio inofensivo da “sensibilidade de género”, destes expedientes não vem mal ao mundo. Mas vem, porque é o reflexo da mesma atitude que legitima a pós-verdade e os factos alternativos que, com outros nomes, é tão velha quanto a humanidade. Com essa atitude e em nome de variadas causas já se exilou, prendeu, queimou, torturou e assassinou.
18/06/2017
O ruído do silêncio da gente honrada no PS é ensurdecedor (158) - Zangam-se as comadres...
Tudo começou com Manuel dos Santos, um eurodeputado socialista, a chamar cigana a uma deputada socialista concitando ondas de indignação entre os correligionários, os berloquistas e em geral as hostes do politicamente correcto.
Tal indignação é difícil de entender por um agnóstico como eu, visto que os indignados parecem acreditar não haver razões para considerar a etnia «cigana» inferior ao «homem branco», como se sabe o responsável pelas desgraças de que padece a humanidade. No entanto, não consideram ser ofensivo chamar homem branco a qualquer pessoa, por exemplo a um «cigano».
À frente dos indignados socialistas surgiu o chefe Costa que prontamente insultou Manuel dos Santos apodando-o de «uma vergonha para o PS». Que isto seja uma ofensa é discutível por um agnóstico como eu que tem do PS a ideia que tem.
No dia seguinte, por uma extraordinária coincidência, tornou-se público que Manuel dos Santos há vários meses «tem dois genros a trabalhar para si com verbas do Parlamento Europeu. Ambos residem em Portugal e prestam serviços ao eurodeputado com as verbas disponibilizadas pelo Parlamento Europeu para esse efeito». Menos de 24 horas depois, a notícia propaga-se mais depressa do que a contratação de meia dúzia de criaturas da parentela de César.
Moral da estória, se a estória tivesse moral: zangam-se as comadres descobrem-se as verdades.
Chávez & Chávez, Sucessores (57) - Ponto de situação
Outras obras do chávismo.
Vamos na 11.ª semana consecutiva de manifestações contra o governo socialista do herdeiro de Chávez, durante as quais 70 pessoas foram mortas e vários milhares foram feridas. Além da eliminação das liberdades, Maduro está a destruir o que resta da economia venezuelana que enfrenta uma inflação de três dígitos, a maior recessão do mundo e a falta absoluta de bens essenciais. Entretanto, Maduro pretende acabar com o que resta das instituições legítimas e montar uma assembleia constituinte que aprove uma nova constituição que garanta a perenidade do regime chávista.
Registo que uma das manas Mortágua se distanciou das obras do chávismo escrevendo um artigo com o título ternurento «Venezuela meu amor», talvez inspirado no "Hiroshima Meu Amor" de Marguerite Duras e na devastação que o Little Boy lançada do B-29 Enola Gay infligiu a Hiroshima, devastação que o chávismo está a levar a cabo à escala de um país.
Escreveu Joana Mortágua, dando uma bicada aos comunistas que continuam a incensar o chávismo; «A esquerda de que faço parte nunca foi ambígua sobre a condenação de regimes que oprimem o povo e sufocam a democracia. Isso vale para Angola e para o regime venezuelano. Não sei exactamente qual a esquerda de que faz parte Joana Mortágua, mas não recordo ter o Bloco de Esquerda condenado o regime chávista.
Vamos na 11.ª semana consecutiva de manifestações contra o governo socialista do herdeiro de Chávez, durante as quais 70 pessoas foram mortas e vários milhares foram feridas. Além da eliminação das liberdades, Maduro está a destruir o que resta da economia venezuelana que enfrenta uma inflação de três dígitos, a maior recessão do mundo e a falta absoluta de bens essenciais. Entretanto, Maduro pretende acabar com o que resta das instituições legítimas e montar uma assembleia constituinte que aprove uma nova constituição que garanta a perenidade do regime chávista.
Registo que uma das manas Mortágua se distanciou das obras do chávismo escrevendo um artigo com o título ternurento «Venezuela meu amor», talvez inspirado no "Hiroshima Meu Amor" de Marguerite Duras e na devastação que o Little Boy lançada do B-29 Enola Gay infligiu a Hiroshima, devastação que o chávismo está a levar a cabo à escala de um país.
Escreveu Joana Mortágua, dando uma bicada aos comunistas que continuam a incensar o chávismo; «A esquerda de que faço parte nunca foi ambígua sobre a condenação de regimes que oprimem o povo e sufocam a democracia. Isso vale para Angola e para o regime venezuelano. Não sei exactamente qual a esquerda de que faz parte Joana Mortágua, mas não recordo ter o Bloco de Esquerda condenado o regime chávista.
17/06/2017
ARTIGO DEFUNTO: A pobreza das crianças dos países ricos é a riqueza das crianças dos países pobres
Se há coisas que na melhor hipótese se prestam a mal-entendidos, e frequentemente a demagogia, é a pobreza e a riqueza. Como quando se confunde pobreza absoluta com pobreza relativa e se esquece que o índice de pobreza relativa é muito mais uma medida da desigualdade de distribuição do rendimento do que uma medida da pobreza.
Inevitavelmente, o nevoeiro conceptual presta-se a simplificações demagógicas nos mídia, por vezes até inesperadamente em jornais como o Observador que para noticiar o relatório da UNICEF «The State of the World’s Children 2016: A fair chance for every child« recentemente publicado escolheu o título «20% das crianças em países ricos vivem em pobreza».
Sendo considerada em situação de pobreza relativa uma família cujos rendimentos são 60% inferiores ao salário médio nacional, qual é o sentido de comparar uma família pobre nas ilhas Bermudas com um rendimento mensal de 2.700 euros com o de uma família pobre na Venezuela com um rendimento mensal de 17 euros. En passant, note-se que o rendimento médio num território capitalista como as Bermudas (4.638 euros) é 162 vezes maior do que num país socialista como a Venezuela (28,65 euros). Se não quisermos exemplos tão extremos, consideremos dois países europeus como a Suíça (4.420 euros) e a Albânia (260 euros). Se ainda assim for demasiado, compare-se o salário médio da Alemanha (2.158 euros) com o de Portugal (818 euros).
Para citar um livro recente sobre o mau uso das estatísticas, diria que comparar uma criança pobre em Portugal, para não ir mais longe, com uma criança pobre no Uganda, é assim como dizer que os seres humanos têm em média um testículo.
Inevitavelmente, o nevoeiro conceptual presta-se a simplificações demagógicas nos mídia, por vezes até inesperadamente em jornais como o Observador que para noticiar o relatório da UNICEF «The State of the World’s Children 2016: A fair chance for every child« recentemente publicado escolheu o título «20% das crianças em países ricos vivem em pobreza».
Fonte: Rankings by Country of Average Monthly Net Salary (After Tax) (Salaries And Financing) |
Sendo considerada em situação de pobreza relativa uma família cujos rendimentos são 60% inferiores ao salário médio nacional, qual é o sentido de comparar uma família pobre nas ilhas Bermudas com um rendimento mensal de 2.700 euros com o de uma família pobre na Venezuela com um rendimento mensal de 17 euros. En passant, note-se que o rendimento médio num território capitalista como as Bermudas (4.638 euros) é 162 vezes maior do que num país socialista como a Venezuela (28,65 euros). Se não quisermos exemplos tão extremos, consideremos dois países europeus como a Suíça (4.420 euros) e a Albânia (260 euros). Se ainda assim for demasiado, compare-se o salário médio da Alemanha (2.158 euros) com o de Portugal (818 euros).
Para citar um livro recente sobre o mau uso das estatísticas, diria que comparar uma criança pobre em Portugal, para não ir mais longe, com uma criança pobre no Uganda, é assim como dizer que os seres humanos têm em média um testículo.
Pro memoria (346) - Estúpido não será. Talvez ignaro
Helena Garrido é uma das jornalistas apreciada aqui no (Im)pertinências e com quem concordamos frequentemente. Também gostaríamos de concordar com o que escreveu aqui e principalmente com a conclusão, mas temos muitas dúvidas:
Como explicar de outro modo, os resultados das últimas sondagens que quase 70% dos portugueses a terem mais confiança em Costa como primeiro-ministro, o PS com quase 44% de intenções de voto e quase 90% dos portugueses a considerem que Marcelo tem actuado bem?
Talvez nos devamos lembrar de Março de 2010, a um ano do resgate e depois dos casos TVI e "Face Oculta" em que Sócrates e o PS estavam mergulhados até ao pescoço, quando no DN se escreveu (a página original desapareceu misteriosamente, mas ainda é possível encontrar a citação no blogue O Jumento);
«Nem os mediáticos casos TVI e "Face Oculta", nem a avaliação negativa dos inquiridos ao desempenho do Governo parecem dados suficientemente fortes para abalar o Partido Socialista. Se hoje se realizassem eleições legislativas, José Sócrates seria reeleito com 41% dos votos. Uma percentagem quase cinco pontos superior ao resultado eleitoral do seu partido em Setembro último.
O PSD, em disputa acesa há meses pela liderança do partido, com Manuela Ferreira de Leite em breve a abandonar o cargo, aparece como a segunda força mais votada (33%), mas a uma distância significativa dos socialistas. Estes são alguns dos resultados de uma sondagem da Universidade Católica para DN, JN, RTP e Antena 1.»
Talvez estas sondagens sejam mais do mesmo e se possam comparar às de 2010.
«O regime está muito mais doente do que parece. Casos como a TAP, Carlos César ou EDP são apenas a ponta do iceberg. Os políticos e a justiça andam a brincar com o fogo. O povo não é estúpido.»Estúpido não será. Estúpidos são indivíduos, mas não se pode dizer o mesmo dos povos. Mas não teria (e tem ainda) razão Alçada Baptista quando na sua «Peregrinação interior» escreveu «Este povo ignaro e atrasado»?
Como explicar de outro modo, os resultados das últimas sondagens que quase 70% dos portugueses a terem mais confiança em Costa como primeiro-ministro, o PS com quase 44% de intenções de voto e quase 90% dos portugueses a considerem que Marcelo tem actuado bem?
Talvez nos devamos lembrar de Março de 2010, a um ano do resgate e depois dos casos TVI e "Face Oculta" em que Sócrates e o PS estavam mergulhados até ao pescoço, quando no DN se escreveu (a página original desapareceu misteriosamente, mas ainda é possível encontrar a citação no blogue O Jumento);
«Nem os mediáticos casos TVI e "Face Oculta", nem a avaliação negativa dos inquiridos ao desempenho do Governo parecem dados suficientemente fortes para abalar o Partido Socialista. Se hoje se realizassem eleições legislativas, José Sócrates seria reeleito com 41% dos votos. Uma percentagem quase cinco pontos superior ao resultado eleitoral do seu partido em Setembro último.
O PSD, em disputa acesa há meses pela liderança do partido, com Manuela Ferreira de Leite em breve a abandonar o cargo, aparece como a segunda força mais votada (33%), mas a uma distância significativa dos socialistas. Estes são alguns dos resultados de uma sondagem da Universidade Católica para DN, JN, RTP e Antena 1.»
Talvez estas sondagens sejam mais do mesmo e se possam comparar às de 2010.
16/06/2017
Qual destas notícias é falsa?
«Trump oferece asilo político a Alexei Navalny»
Putin himselfie
Putin himselfie
O do Kremlin, como o de Belém, também gosta de selfies (com tropa em vez de criancinhas e velhinhas) |
O ruído do silêncio da gente honrada no PS é ensurdecedor (157) - A César o que é de César
Em comentário ao primeiro post sobre o amigo do Costa, nomeado para a administração da TAP, de quem Fernando Pinto, CEO da TAP há uma eternidade, desde os tempos do estradista Jorge Coelho, diz que «conhece a TAP talvez mais do que eu» (para quem duvida que conheça melhor, recordem-se os tempos de Lacerda na Gebalis que levou a TAP para o Brasil onde perdeu centenas de milhões), um leitor pergunta «E a sobrinha do César?».
Tem o leitor razão, mas não tem toda a razão. A sobrinha é apenas uma das pessoas da parentela de César a quem ele arranjou tenças públicas, como aqui recorda João Miguel Tavares: «Quase todos os familiares directos do líder parlamentar do PS estão em cargos de nomeação ou eleição política. A mulher. O filho. A nora. O irmão. E, agora, a sobrinha, contratada pela Gebalis (empresa municipal de Lisboa) depois de sair da Junta de Freguesia de Alcântara (do PS, claro).»
Esclarecimento a este comentário de um outro leitor sobre «uma interpretação "sui generis" daquilo do "a césar o que é de césar"»:
Os funcionários públicos são empregados do Estado Sucial que dispõe dos empregos. A esquerda em geral e o PS em particular são os donos do Estado Sucial; César é o presidente do PS ergo César é um dos donos do Estado Sucial ergo isso dá a César o direito de dispor do que é de César, em particular dar empregos à família de César. Quod erat demonstrandum.
15/06/2017
Ainda falta muito para a poligamia ser uma unidade familiar poliamorosa?
Unidade familiar poliamorosa |
Não se percebe porque continua a ser estigmatizada a poligamia (e a poliandria). Afinal são unidades familiares poliamorosas.
CASE STUDY: Trumpologia (20) - Quem é que ele nos faz lembrar?
Mais trumpologia.
Segunda-feira, Donald Trump fez uma espécie de edição especial de The Apprentice numa reunião do governo, convocando os mídia para assistir ao show onde exaltou as suas realizações e se comparou a Roosevelt com esta tirada magnífica de bazófia:
Trump está longe de ser o único egomaníaco de serviço nas presidências, embora seja provavelmente o mais descarado. Até nós, habitualmente deprimidos, tristes e lamurientos, atravessamos um período de euforia (que acabará na depressão, como a história mostra), estimulados pelo inquilino de Belém. Inquilino com certos aspectos comparáveis, com as diferenças inevitáveis que vão entre um presidente dos Estados Unidos e um presidente de Portugal - aos olhos do outro uma espécie de mayor de uma cidade do interior. Ora vejamos algumas equivalências:
Segunda-feira, Donald Trump fez uma espécie de edição especial de The Apprentice numa reunião do governo, convocando os mídia para assistir ao show onde exaltou as suas realizações e se comparou a Roosevelt com esta tirada magnífica de bazófia:
«Never has there been a president, with few exceptions — case of FDR, he had a major depression to handle — who has passed more legislation and who has done more things than what we’ve done.»Alguns secretários de Estado produziram homéricas lambidelas no ego do Donaldo, como o secretário da saúde Tom Price que disse sem se rir «"what an incredible honor it is” to lead his department “at this pivotal time under your leadership.”»
Trump está longe de ser o único egomaníaco de serviço nas presidências, embora seja provavelmente o mais descarado. Até nós, habitualmente deprimidos, tristes e lamurientos, atravessamos um período de euforia (que acabará na depressão, como a história mostra), estimulados pelo inquilino de Belém. Inquilino com certos aspectos comparáveis, com as diferenças inevitáveis que vão entre um presidente dos Estados Unidos e um presidente de Portugal - aos olhos do outro uma espécie de mayor de uma cidade do interior. Ora vejamos algumas equivalências:
- «Make America Great again» / «O país estava perdido e carecido de afecto»
- The Apprentice / As Escolhas de Marcelo
- «Grab the pussy» / Beijinhos e selfies, «o universo de afectos»
- Franklin Delano Roosevelt / Teixeira Gomes
14/06/2017
ARTIGO DEFUNTO: PIB e consumo per capita segundo o jornalismo de causas económicas
O Eurostat publicou há poucos dias os «GDP per capita, consumption per capita and price level indices» de onde extraí o diagrama seguinte que mostra o PIB e o consumo per capita portugueses abaixo da média EU28 sendo o primeiro mais abaixo, confirmando o que sabemos: vivemos em termos relativos (e absolutos) acima das nossas posses ou, para sermos precisos, acima do que produzimos.
Se consultarmos o quadro «Volume indices per capita, 2013-2016» no mesmo documento, verificamos ainda que entre 2013 e 2016 o PIB per capita português permaneceu invariável em 77% da média EU28, ao passo que o consumo per capita aumentou ligeiramente de 81% para 82%, confirmando que consumimos mais do que produzimos em termos relativos e desmentindo as teses miserabilistas alimentadas pelos delírios da esquerdalhada sobre os efeitos da austeridade. Dito de outro modo, em termos relativos produzimos o mesmo mas consumimos ligeiramente mais.
Chegados aqui, vejamos o que nos diz o jornalismo de causas económicas que, omitindo a relação entre consumo e PIB, como se pudesse consumir sem produzir, parece ter subjacente a doutrina da Mouse School of Economics postulando que do aumento dos salários e do consumo decorre necessariamente o aumento da produtividade e o produto. Dois exemplos:
Consumo per capita em Portugal fica abaixo da média europeia
A diferença entre os países da UE vai de 53% a 132%, sendo Portugal o sétimo país com a média mais baixa. (Económico)
Consumo “per capita” em Portugal está entre os mais baixos da Zona Euro
O consumo “per capita” em Portugal continua 18% abaixo da média da União Europeia. E é um dos mais baixos entre os membros que partilham o euro (Negócios)
Se consultarmos o quadro «Volume indices per capita, 2013-2016» no mesmo documento, verificamos ainda que entre 2013 e 2016 o PIB per capita português permaneceu invariável em 77% da média EU28, ao passo que o consumo per capita aumentou ligeiramente de 81% para 82%, confirmando que consumimos mais do que produzimos em termos relativos e desmentindo as teses miserabilistas alimentadas pelos delírios da esquerdalhada sobre os efeitos da austeridade. Dito de outro modo, em termos relativos produzimos o mesmo mas consumimos ligeiramente mais.
Chegados aqui, vejamos o que nos diz o jornalismo de causas económicas que, omitindo a relação entre consumo e PIB, como se pudesse consumir sem produzir, parece ter subjacente a doutrina da Mouse School of Economics postulando que do aumento dos salários e do consumo decorre necessariamente o aumento da produtividade e o produto. Dois exemplos:
Consumo per capita em Portugal fica abaixo da média europeia
A diferença entre os países da UE vai de 53% a 132%, sendo Portugal o sétimo país com a média mais baixa. (Económico)
Consumo “per capita” em Portugal está entre os mais baixos da Zona Euro
O consumo “per capita” em Portugal continua 18% abaixo da média da União Europeia. E é um dos mais baixos entre os membros que partilham o euro (Negócios)
O ruído do silêncio da gente honrada no PS é ensurdecedor (156) - O amigo do Costa (II)
Continuação daqui.
«O problema é outro, é o passado, o longínquo, há mais de dez anos, quando esteve do lado da Geocapital no negócio da TAP no Brasil. A Geocapital entrou com a TAP, saiu e a TAP ficou, o resto é história. E muitos prejuízos. Bem se pode dizer que, provavelmente, a TAP não teria as rotas para o Brasil se não tivesse comprado a VEM. Não temos o contra-factual, sabemos que a TAP perdeu centenas de milhões ao longo dos anos nesse negócio de manutenção. Lacerda Machado fez o seu papel, defendendo outros interesses, legítimos, à data. Deveria, por isso, manter uma distância saudável da TAP e de funções, mesmo não executivas. Mas também é o passado recente, a forma como esteve a trabalhar, sem qualquer contrato para o Estado, ou antes para António Costa. Em vários dossiês, sem qualquer tipo de ‘accountability’ pública de nenhum dos órgãos de soberania, nem sequer da sociedade, porque não se sabia a sua função nem o seu papel. Foi corrigido? Foi, mas tarde.»
«Marcelo não é o presidente do Conselho», António Costa (o jornalista, claro) no jornal Eco
«O problema é outro, é o passado, o longínquo, há mais de dez anos, quando esteve do lado da Geocapital no negócio da TAP no Brasil. A Geocapital entrou com a TAP, saiu e a TAP ficou, o resto é história. E muitos prejuízos. Bem se pode dizer que, provavelmente, a TAP não teria as rotas para o Brasil se não tivesse comprado a VEM. Não temos o contra-factual, sabemos que a TAP perdeu centenas de milhões ao longo dos anos nesse negócio de manutenção. Lacerda Machado fez o seu papel, defendendo outros interesses, legítimos, à data. Deveria, por isso, manter uma distância saudável da TAP e de funções, mesmo não executivas. Mas também é o passado recente, a forma como esteve a trabalhar, sem qualquer contrato para o Estado, ou antes para António Costa. Em vários dossiês, sem qualquer tipo de ‘accountability’ pública de nenhum dos órgãos de soberania, nem sequer da sociedade, porque não se sabia a sua função nem o seu papel. Foi corrigido? Foi, mas tarde.»
«Marcelo não é o presidente do Conselho», António Costa (o jornalista, claro) no jornal Eco
O ruído do silêncio da gente honrada no PS é ensurdecedor (155) - O amigo do Costa
«Diogo Lacerda Machado, melhor amigo de António Costa, já esteve envolvido no negócio do SIRESP (segundo o socialista António Galamba, Lacerda Machado era advogado da Motorola, que integrou o consórcio vencedor) e na compra dos helicópteros Kamov (terá sido júri no concurso). Esteve, já com Costa como primeiro-ministro, envolvido na reversão da privatização da TAP, na resolução do caso dos lesados do BES, e ainda no acordo do CaixaBank com Isabel dos Santos para reduzir a exposição do BPI a Angola. Parece que ainda deu uma perninha no dossiê dos lesados do Banif e na tentativa de constituição de um “banco mau” para o sistema financeiro português.
Há mais. Revista Sábado, Abril de 2016: “Lacerda Machado é também administrador da Geocapital, uma sociedade de investimento sedeada em Macau e presidida pelo multimilionário Stanley Ho. O socialista Almeida Santos era presidente da mesa da assembleia geral. A Geocapital foi parceira da TAP na compra da Varig Engenharia e Manutenção, em 2005, mas dois anos depois saiu do negócio. A entretanto apelidada TAP Manutenção e Engenharia é o activo do grupo com mais prejuízos.” Eu admito que Lacerda Machado seja o Mourinho da negociação em Portugal, mas pergunto-me se tal currículo seria possível sem as amizades no PS e a confiança pessoal do primeiro-ministro.»
«Uma cultura política lastimável», João Miguel Tavares no Público
É claro que o PS não tem o exclusivo da ocupação do Estado pelos amigos e correlegionários. Para só citar os partidos do que se costumava chamar «arco de governação» - arco que hoje inclui a ménage à trois da geringonça -, o PSD e o CDS têm uma longa história de distribuição de lugares. Ainda assim, desde o fim do cavaquismo em 1995, o PS ocupou o poder em 16 desses 22 anos e, com a legitimidade que a esquerda se atribui a si mesma para controlar o Estado por «boas causas», não se poupou a nomeações de boys e bateu irremediavelmente a concorrência.
Há mais. Revista Sábado, Abril de 2016: “Lacerda Machado é também administrador da Geocapital, uma sociedade de investimento sedeada em Macau e presidida pelo multimilionário Stanley Ho. O socialista Almeida Santos era presidente da mesa da assembleia geral. A Geocapital foi parceira da TAP na compra da Varig Engenharia e Manutenção, em 2005, mas dois anos depois saiu do negócio. A entretanto apelidada TAP Manutenção e Engenharia é o activo do grupo com mais prejuízos.” Eu admito que Lacerda Machado seja o Mourinho da negociação em Portugal, mas pergunto-me se tal currículo seria possível sem as amizades no PS e a confiança pessoal do primeiro-ministro.»
«Uma cultura política lastimável», João Miguel Tavares no Público
É claro que o PS não tem o exclusivo da ocupação do Estado pelos amigos e correlegionários. Para só citar os partidos do que se costumava chamar «arco de governação» - arco que hoje inclui a ménage à trois da geringonça -, o PSD e o CDS têm uma longa história de distribuição de lugares. Ainda assim, desde o fim do cavaquismo em 1995, o PS ocupou o poder em 16 desses 22 anos e, com a legitimidade que a esquerda se atribui a si mesma para controlar o Estado por «boas causas», não se poupou a nomeações de boys e bateu irremediavelmente a concorrência.
13/06/2017
ARTIGO DEFUNTO: Os espectros que pairam sobre o jornalismo de causas (ACTUALIZAÇÃO)
Resultados da 1.ª volta das eleições legislativas francesas (L'Express) |
Decorridos cinco anos, faz sentido revisitar outra vez um artigo de opinião não assinado do Público, de 23-05-2012, a propósito das eleições presidenciais francesas que deram então a vitória a François Hollande e que o jornalista de causas de serviço na ocasião viu como uma reencarnação do espectro de 1848 do tio Karl e do tio Friedrich.
«Há um espectro que paira sobre a Europa. Um espectro que aponta para o fim de um ciclo de austeridade punitiva nos países vulneráveis à dívida, ao défice público e aos ataques dos mercados financeiros. Não chegou através de uma revolução, nem teve como arauto um revolucionário obediente a ideologias radicais. Bastou uma eleição democrática na França e a subida ao poder de um político centrista para que, num ápice, a Europa reflectisse a fundo sobre a sua caminhada para o caos.»
Títulos inspirados (70) - Talvez infectado pelos afectos e a boa disposição, o semanário de reverência está cada vez mais delirante
Expresso Diário de 12-06 |
Digamos que, com benevolência, a TAP e a SATA são, respectivamente, a 37.ª e a 13.ª piores companhias das 87 melhores entre as cerca de 250 existentes, a maioria delas inqualificáveis sob qualquer ponto de vista.
12/06/2017
O presidente do Brasil pediu para ser recebido? Outra vez a vichyssoise?
«"Houve um pedido do senhor Presidente da República Federativa do Brasil, supondo que podia estar em São Paulo amanhã [domingo] de manhã, e pediu para ser recebido", informou o Presidente, acrescentando que depois "surgiu um problema no programa do senhor Presidente da República Federativa e, pedindo muita desculpa, disse que não estava com disponibilidade de horário para poder aparecer"». (o jornal i titulou «Marcelo e Costa levaram ‘tampa’ de Temer»)
«O cancelamento do encontro "não foi recente", afirmou ainda. "Já sabíamos que não era possível, com muita pena nossa". "Os portugueses estão mal habituados", a "um Presidente da República e a um primeiro-ministro que, por virtude da situação estável (...) do país, têm uma disponibilidade constante que não é habitual noutros Estados"». (acrescentou o Negócios)
Porque será que este episódio me evocou uma visita ao Brasil em 2010 do engenheiro Pinóquio, cujos assessores inventaram ter Chico Buarque pedido ao presidente Lula para interceder junto dele Sócrates para lhe conceder a honra de o convidar a ele Chico?
«O cancelamento do encontro "não foi recente", afirmou ainda. "Já sabíamos que não era possível, com muita pena nossa". "Os portugueses estão mal habituados", a "um Presidente da República e a um primeiro-ministro que, por virtude da situação estável (...) do país, têm uma disponibilidade constante que não é habitual noutros Estados"». (acrescentou o Negócios)
Porque será que este episódio me evocou uma visita ao Brasil em 2010 do engenheiro Pinóquio, cujos assessores inventaram ter Chico Buarque pedido ao presidente Lula para interceder junto dele Sócrates para lhe conceder a honra de o convidar a ele Chico?
A verdadeira obra de arte de Costa
«Mas a verdadeira obra de arte do primeiro-ministro é outra! Foi ter conseguido desvincular-se, ele e os seus ministros, do governo de Sócrates. Foi ter desligado este Partido Socialista salvador daquele outro Partido Socialista cangalheiro. Foi ter conseguido refazer a sua virgindade, suavemente, sem ruptura aparente, sem obrigar ninguém a desdizer-se ou a pedir desculpa, sem criar incómodos a ministros e sem dar argumentos a quem disser que o Partido tem duas caras. Foi ainda ter conseguido associar o Bloco e o PCP a este branqueamento inédito.»
«A obra-prima de António Costa», António Barreto no DN
Crónica da anunciada avaria irreparável da geringonça (87)
Outras avarias da geringonça.
Como seria de esperar numa economia cada vez mais descapitalizada (ver por exemplo «As 10 Questões do Colapso. Portugal: a provável derrocada financeira de 2016-2017» de João César das Neves), a produtividade não só não cresce, o que já seria um problema quando temos uma produtividade PPS inferior a 70% da média UE28, mas ainda se degrada.
Uma economia descapitalizada e, pior do que isso, que não investe o suficiente para compensar a depreciação do capital, e muito do que investe é em sectores de bens não transaccionáveis. Segundo o INE, sendo certo que no 1.º trimestre o investimento em máquinas e ferramentas cresceu 15%, o investimento em construção cresceu 8,5%, o maior aumento desde 2002 e o segundo maior desde 2000, e o crescimento em cadeia caiu de 5,9% para 2,1%. (Económico)
Como seria de esperar numa economia cada vez mais descapitalizada (ver por exemplo «As 10 Questões do Colapso. Portugal: a provável derrocada financeira de 2016-2017» de João César das Neves), a produtividade não só não cresce, o que já seria um problema quando temos uma produtividade PPS inferior a 70% da média UE28, mas ainda se degrada.
Uma economia descapitalizada e, pior do que isso, que não investe o suficiente para compensar a depreciação do capital, e muito do que investe é em sectores de bens não transaccionáveis. Segundo o INE, sendo certo que no 1.º trimestre o investimento em máquinas e ferramentas cresceu 15%, o investimento em construção cresceu 8,5%, o maior aumento desde 2002 e o segundo maior desde 2000, e o crescimento em cadeia caiu de 5,9% para 2,1%. (Económico)
11/06/2017
Um patologista no 10 de Junho é diferente de um patologista no 29 de Maio
«Alguém que dedicou toda a vida a estudar doenças e as suas origens a discursar num Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas só podia dar numa intervenção do 10 de junho fora do comum. Manuel Sobrinho Simões é médico e investigador e também presidente da comissão organizadora das comemorações e aproveitou o momento para falar de genética e até da responsabilidade de portugueses pela propagação de doenças raras. Isto tudo para concluir que os portugueses têm “uma mistura notável de genes com as mais variadas origens (...) somos de uma extraordinária diversidade genética“.» (Observador)
Sete anos e uns dias antes, o mesmo patologista, numa entrevista ao Expresso de 29 de Maio de 2010, disse a Clara Ferreira Alves, aka a Pluma Caprichosa, o seguinte, de que tomámos a devida nota neste post:
«Viemos (todos de África). E nós temos uma diversidade menor, nós e os galegos, do que qualquer outra pessoa na Europa. Somos iguais aos galegos. Mais longe de Adis Abeba. Éramos muito poucos. Se vinham seis pessoas, elas tinham características diferentes umas das outras, mas das seis só uma ou duas chegam ao ponto seguinte. Há uma espécie de efeito de gargalo.
(...)
Um geneticista dirá que é péssimo (termo-nos cruzado pouco).»
De onde temos de concluir: (1) ou bem o conhecimento sobre a genética dos portugueses evoluiu; (2) ou bem os portugueses são seres mutantes, (3) ou bem o presidente dos Afectos que organizou o Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas achou que o país estava carecido de afecto e encomendou um discurso mais afectuoso ao Dr. Sobrinho Simões que não hesitou em contribuir para aumentar a auto-estima dos portugueses em vez de citar outra vez um ditado galego para nos descrever: quando se vê um galego numa escada nunca se sabe se vai a subir ou a descer.
Sete anos e uns dias antes, o mesmo patologista, numa entrevista ao Expresso de 29 de Maio de 2010, disse a Clara Ferreira Alves, aka a Pluma Caprichosa, o seguinte, de que tomámos a devida nota neste post:
«Viemos (todos de África). E nós temos uma diversidade menor, nós e os galegos, do que qualquer outra pessoa na Europa. Somos iguais aos galegos. Mais longe de Adis Abeba. Éramos muito poucos. Se vinham seis pessoas, elas tinham características diferentes umas das outras, mas das seis só uma ou duas chegam ao ponto seguinte. Há uma espécie de efeito de gargalo.
(...)
Um geneticista dirá que é péssimo (termo-nos cruzado pouco).»
De onde temos de concluir: (1) ou bem o conhecimento sobre a genética dos portugueses evoluiu; (2) ou bem os portugueses são seres mutantes, (3) ou bem o presidente dos Afectos que organizou o Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas achou que o país estava carecido de afecto e encomendou um discurso mais afectuoso ao Dr. Sobrinho Simões que não hesitou em contribuir para aumentar a auto-estima dos portugueses em vez de citar outra vez um ditado galego para nos descrever: quando se vê um galego numa escada nunca se sabe se vai a subir ou a descer.
10/06/2017
DIÁRIO DE BORDO: Senhor, concedei-nos a graça de não termos outros cinco anos de TV Marcelo (37) - Não desisti mas também tenho a mesma dúvida
Outras preces.
«Há pessoas de quem não se espera nada. E há aquelas de quem se espera tudo. O prof. Marcelo pertence às duas categorias. Em passeio nos Açores, o homem resolveu explicar o segredo da nossa felicidade, ele próprio: “Quando iniciei o meu mandato, achava que o país estava carecido de afecto e que era uma prioridade esse afecto. As pessoas estavam pessimistas, estavam cépticas, estavam crispadas. (…) o país estava perdido, corria tudo mal”. Então, como um anjo, surgiu o Salvador, ainda mais reluzente que o Sobral.
Com franqueza, já desisti de tentar perceber se o prof. Marcelo diz estas coisas a sério ou se se diverte a gozar com pategos.»
Excerto de «Cinco dias inúteis», Alberto Gonçalves no Observador
«Há pessoas de quem não se espera nada. E há aquelas de quem se espera tudo. O prof. Marcelo pertence às duas categorias. Em passeio nos Açores, o homem resolveu explicar o segredo da nossa felicidade, ele próprio: “Quando iniciei o meu mandato, achava que o país estava carecido de afecto e que era uma prioridade esse afecto. As pessoas estavam pessimistas, estavam cépticas, estavam crispadas. (…) o país estava perdido, corria tudo mal”. Então, como um anjo, surgiu o Salvador, ainda mais reluzente que o Sobral.
Com franqueza, já desisti de tentar perceber se o prof. Marcelo diz estas coisas a sério ou se se diverte a gozar com pategos.»
Excerto de «Cinco dias inúteis», Alberto Gonçalves no Observador
09/06/2017
CAMINHO PARA A INSOLVÊNCIA: Here we go again (14)
«Importações disparam 10,8% em abril. Défice comercial agrava»
«No 1º trimestre o comércio internacional de bens reforçou-se. Em abril, as exportações ficaram praticamente iguais e as importações dispararam. Défice comercial agrava-se 500 milhões de euros.»
Brexit - Unintended consequences (2)
Há um mês meio, escrevi aqui que a convocação de eleições intercalares proporcionaria a Theresa May legitimidade acrescida e estaria a revelar-se uma boa jogada. Muito por culpa dos seus erros políticos (para só citar um, a pirueta com o «dementia tax» do manifesto eleitoral foi um desastre), ajudados pela discrepância entre a pose de estadista e o discurso de firmeza, por um lado, e as tergiversações e as piruetas, por outro, revelou-se uma péssima jogada.
May perdeu a maioria e perdeu a autoridade de que se queria investir para uma negociação dura com a Comissão Europeia. Pela segunda vez em pouco tempo, o Partido Conservador deu outro tiro no pé: o primeiro de Cameron ao prometer o referendo com receio de perder as eleições criou um problema que o eleitorado não sentia como tal e o segundo de May ao querer ganhar força e legitimidade a perdeu.
May não foi a única a perder com estas eleições. Depois de ter ganho o referendo, o UKIP desapareceu do parlamento, Nicola Sturgeon e o SNP afundaram-se literalmente, perdendo quase 40% dos lugares no parlamento, e a facção pró-Europa do Partido Trabalhista irá ser engolida pelos lunáticos de Corbyn que, tendo aumentado 36 lugares e apesar de estarem a 60 da maioria, cantam vitória e dizem-se prontos para governar.
Suspeito que o Brexit vai espoletar uma recomposição das forças políticas do Reino Unido comparável à da Holanda e da França.
May perdeu a maioria e perdeu a autoridade de que se queria investir para uma negociação dura com a Comissão Europeia. Pela segunda vez em pouco tempo, o Partido Conservador deu outro tiro no pé: o primeiro de Cameron ao prometer o referendo com receio de perder as eleições criou um problema que o eleitorado não sentia como tal e o segundo de May ao querer ganhar força e legitimidade a perdeu.
May não foi a única a perder com estas eleições. Depois de ter ganho o referendo, o UKIP desapareceu do parlamento, Nicola Sturgeon e o SNP afundaram-se literalmente, perdendo quase 40% dos lugares no parlamento, e a facção pró-Europa do Partido Trabalhista irá ser engolida pelos lunáticos de Corbyn que, tendo aumentado 36 lugares e apesar de estarem a 60 da maioria, cantam vitória e dizem-se prontos para governar.
Suspeito que o Brexit vai espoletar uma recomposição das forças políticas do Reino Unido comparável à da Holanda e da França.
DIÁRIO DE BORDO: Somos todos Cannes? E se Oscar Wilde não tivesse razão?
Um dos filmes mais aplaudidos, com o prémio da melhor actriz, no festival de Cannes, uma reunião da cinefilia decadente bem-pensante, foi «Aus dem nichts» (Fora de nada).
O tema central - um atentado terrorista - não podia ser mais actual num festival de cinema em França, palco recente de vários atentados do terrorismo islâmico, e num filme produzido e localizado na Alemanha onde o mesmo terrorismo constitui uma séria ameaça. Se estavam à espera de um ataque bombista por terroristas islâmicos a pacíficos cristãos, esqueçam. Deveriam esperar um ataque bombista por terroristas nazis a pacíficos muçulmanos. Passo a palavra ao crítico do Público in loco:
«Uma alemã (Diane Kruger) perde o marido, de origem turca, e o filho num ataque bombista perpetrado por um grupo de extrema-direita. Mas a decisão do julgamento não lhe permite fechar o trabalho de luto e ela decide fazer justiça pelas próprias mãos. O cineasta Fatih Akim, alemão de origem turca, não esconde que a sua empatia está com a personagem de Katja, porque ela é o corpo daquilo que pode estar adormecido em cada um de nós – o justiceiro – e, segundo o próprio realizador, “deve continuar adormecido”».
E assim se vê que Oscar Wilde, de quem dizem ter dito «a vida imita a arte muito mais do que a arte imita a vida», pode muito bem ter-se enganado.
O tema central - um atentado terrorista - não podia ser mais actual num festival de cinema em França, palco recente de vários atentados do terrorismo islâmico, e num filme produzido e localizado na Alemanha onde o mesmo terrorismo constitui uma séria ameaça. Se estavam à espera de um ataque bombista por terroristas islâmicos a pacíficos cristãos, esqueçam. Deveriam esperar um ataque bombista por terroristas nazis a pacíficos muçulmanos. Passo a palavra ao crítico do Público in loco:
«Uma alemã (Diane Kruger) perde o marido, de origem turca, e o filho num ataque bombista perpetrado por um grupo de extrema-direita. Mas a decisão do julgamento não lhe permite fechar o trabalho de luto e ela decide fazer justiça pelas próprias mãos. O cineasta Fatih Akim, alemão de origem turca, não esconde que a sua empatia está com a personagem de Katja, porque ela é o corpo daquilo que pode estar adormecido em cada um de nós – o justiceiro – e, segundo o próprio realizador, “deve continuar adormecido”».
E assim se vê que Oscar Wilde, de quem dizem ter dito «a vida imita a arte muito mais do que a arte imita a vida», pode muito bem ter-se enganado.
08/06/2017
O ruído do silêncio da gente honrada no PS é ensurdecedor (153) - A aldrabice na Praça do Município, como em S. Bento
«Comissão sobre obras na Segunda Circular começou e acabou em vinte minutos. A maioria socialista bloqueou a audição de técnicos e o PSD saiu da sala em protesto. Fernando Medina despachou a questão em poucas linhas.( ...) E assim se concluiu a comissão de inquérito às obras de requalificação da Segunda Circular.» Foram as palavras insuspeitas do Público, um dos diários oficiais da geringonça.
«Todos os dirigentes intermédios da Câmara Municipal de Lisboa — são 135 — estão em funções há anos sem que alguma vez tenha sido aberto um concurso para os lugares que ocupam, como manda a lei. O problema arrasta-se desde a gestão camarária de António Costa e Fernando Medina não o resolveu.» (Observador)
Coloquemos os 135 dirigentes em funções sem concurso no contexto de Parkinson na câmara de Lisboa e consideremos que quando Costa tomou posse já andavam pela câmara uns dez mil apparatchiks, hoje, passados 9 anos, com o herdeiro Medina, a capacidade de manutenção de tenças mantém-se (ver quadro seguinte extraído do Mapa de Pessoal 2016). É uma tença por cada 55 residentes - o dobro de Madrid ou Barcelona.
«Todos os dirigentes intermédios da Câmara Municipal de Lisboa — são 135 — estão em funções há anos sem que alguma vez tenha sido aberto um concurso para os lugares que ocupam, como manda a lei. O problema arrasta-se desde a gestão camarária de António Costa e Fernando Medina não o resolveu.» (Observador)
Coloquemos os 135 dirigentes em funções sem concurso no contexto de Parkinson na câmara de Lisboa e consideremos que quando Costa tomou posse já andavam pela câmara uns dez mil apparatchiks, hoje, passados 9 anos, com o herdeiro Medina, a capacidade de manutenção de tenças mantém-se (ver quadro seguinte extraído do Mapa de Pessoal 2016). É uma tença por cada 55 residentes - o dobro de Madrid ou Barcelona.