08/09/2019

Dúvidas (280) - Não será um poucochinho exagerado? (3) - Está tudo explicado. A investigação em Portugal está a cargo de zombies

Começou com a dúvida se «temos os melhores engenheiros nas escolas portuguesas, que estão entre os melhores do mundo, o que faz com que Portugal não fique atrás de nenhum outro país a nível mundial em matéria de tecnologia e inovação», como garantiu uma luminária presumivelmente inspirada por Belém, onde também se garantem coisas que a medíocre realidade não sustenta.

Continuou com outra dúvida, resultante da primeira, se temos os melhores e não ficamos atrás de nenhum outro país (hipérbole que, se tomada à letra, significaria que temos toda a gente atrás de nós), como explicar que os nossos 362,2 mil cientistas e engenheiros, ou 2,1% do total da UE, só produziram o ano passado 0,13% do número de patentes registadas na UE?

Chegado aqui, carregado de dúvidas, senti-me um pouco como um infiel rodeado de crentes fanáticos jurando que se nos explodirmos no meio de outros infiéis seremos recebidos no Jannah por 72 (setenta e duas) virgens, quantidade exagerada até para um apreciador de virgens.

Investigadores aguardando aprovação de financiamento
da Fundação para a Ciência e Tecnologia
Até que me cruzei com um escrito de António Feijó e Miguel Tamen, professores da Universidade de Lisboa, que, talvez por não serem engenheiros, fazem um diagnóstico do estado da investigação em Portugal, baseados num relatório recente da OCDE, que explica o magro resultado de tanto e tão notável talento. Aqui vai um excerto à guisa de teaser:

«Os domínios que a investigação privilegia resultam, em vez disso, do conjunto avulso de projectos que investigadores e unidades de investigação submetem com sucesso aos concursos que a Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) abre. Sendo a FCT a única, ou a decisiva, instância de financiamento nacional da investigação, o resultado dos seus esforços escapa-lhe sempre. O controle do Estado sobre a investigação não é acompanhado por uma noção daquilo que se investiga, e muito menos por uma ideia daquilo que se devia investigar.

A situação só não é caótica por dizer respeito a um universo de investigadores e unidades relativamente pequeno, que tendem, sempre que se candidatam a financiamentos, a replicar a investigação que têm feito, ou sempre fizeram. Para além disso, o alarde público com que os candidatos decepcionados com os resultados dos concursos de financiamento em cada ano os acolhem, e que logo encontra eco mediático, invariavelmente leva a que financiamento suplementar, mesmo que escasso, lhes seja concedido; e assim, na periferia do sistema, continuam a proliferar zombies

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