09/04/2017

Se o ridículo fosse mortal, Dijsselbloem teria infligido várias baixas ao governo da geringonça

Tudo começou com uma entrevista ao Frankfurter Allgemeine Zeitung, em que Jeroen Dijsselbloem disse: «O pacto na zona euro baseia-se na confiança. Com a crise do euro, os países do norte na zona euro mostraram a sua solidariedade para com os países em crise. Como social-democrata considero a solidariedade extremamente importante. Mas quem a exige, também tem obrigações. Não posso gastar todo o meu dinheiro em álcool e mulheres e continuar a pedir ajuda. Este princípio aplica-se a nível pessoal, local, nacional e, inclusivamente, europeu.»

O enunciado de Dijsselbloem inclui factos (os países do norte na zona euro mostraram a sua solidariedade para com os países em crise), premissas geralmente aceites (o pacto na zona euro baseia-se na confiança; quem exige a solidariedade, também tem obrigações) e princípios pessoais (não posso gastar todo o meu dinheiro em álcool e mulheres e continuar a pedir ajuda). É óbvio para quem tenha metade dos neurónios a funcionar que álcool e mulheres é mais ou menos o que um português em privado diria putas e vinho verde, como sinónimo para designar dinheiro mal gasto e provavelmente mal ganho

Reagindo a esta entrevista, o primeiro-ministro português considerou que os portugueses foram ofendidos, ou seja assumiu que os portugueses gastam mal o dinheiro que recebem em nome da solidariedade, exige a demissão de Dijsselbloem, o presidente socialista do Eurogrupo, e classifica-o como «racista, xenófobo e sexista» o que no politiquês corrente são três dos insultos mais graves em vigor na vulgata socialista.

Com o sentido de oportunidade que caracteriza o costismo, alguns dias depois, no dia 1 de Abril (uma piada involuntária), o Acção Socialista Expresso publica na primeira página uma suposta sondagem por «socialistas europeus» a Centeno para substituir Dijsselbloem, sondagem de que não se encontram traços na imprensa internacional.

Se a coisa tivesse ficado por aqui, já teríamos várias vítimas do ridículo no governo e no semanário de referência. Não ficou.

Tivemos de seguida uma cena protagonizada por Mourinho Félix cuidadosamente encenada e filmada por um cameraman de causas (ver aqui o vídeo devidamente legendado), em que o ajudante de secretário de Estado se dirige a Dijsselbloem enquanto lhe segura a mão para ele não o deixar a falar sozinho. «Quero dizer-lhe que foi profundamente chocante aquilo que disse dos países que estiveram sob resgate e gostaríamos que pedisse desculpas perante os ministros e a imprensa». Dijsselbloem responde «eu vou dizer alguma coisa sobre isso... mas a reacção de Portugal também foi chocante. Bom, não lhe vou exigir um pedido de desculpas mas vou dizer alguma coisa


Num país que tivesse um pingo de dignidade e respeito por si próprio ninguém teria enfiado a carapuça e reagido à entrevista de Dijsselbloem. Num país desses, nenhum ajudante de secretário de Estado teria montado aquela cena ridícula. Num país desses, se um ajudante de secretário tivesse montado tal cena e ouvisse uma resposta irónica do visado, o vídeo encenado seria rapidamente esquecido, Neste país, o ajudante de secretário foi promovido a herói nacional e quase ninguém percebeu a ironia da resposta de Dijsselbloem.

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