Este post está relacionado com este e este posts do Pertinente, pretende refutar algumas conclusões do ensaio de Ricardo Reis (RR), citado aqui pelo Blasfémias, e é uma continuação dos meus posts (1), (2) e (3).
No primeiro post mostrei que nas actividades com taxa normal de IVA, a redução da TSU acompanhada ou não pelo aumento do IVA determinará um aumento do lucro, a não ser que a empresa decida reduzir os preços, e admiti que tal poderá não acontecer nos bens e serviços não transaccionáveis.
No segundo post mostrei que nas actividades com IVA reduzido (se este se mantiver) e nas isentas de IVA, o impacto da redução da TSU combinado com o do aumento do IVA depende da magnitude de uma e de outro, podendo o efeito líquido ser uma redução do lucro seguida dum possível aumento de preços.
No terceiro post mostrei que nas actividades isentas de IVA , e em particular nos serviços financeiros, uma redução relevante da TSU conduziria a um aumento dos lucros, porque dada a estrutura de custos desses serviços o aumento fiscal e socialmente admissível do IVA passivo não seria suficiente para compensar a redução dos custos.
Neste post trato das empresas exportadoras. Consideremos separadamente as vendas para os mercados interno e externo e para simplificar imaginemos a empresa cindida em duas. À «empresa» que vende para o mercado interno aplicam-se as conclusões do primeiro post. Na «empresa» exportadora a redução da TSU terá um efeito directo na redução dos custos e o aumento do IVA não acresce aos seus custos operacionais porque o IVA passivo incluído nas compras aos fornecedores é recuperado posteriormente na totalidade. Assim, do ponto de vista dos resultados, estes aumentariam se os preços de venda se mantivessem. Como a «empresa» exportadora compete no mercado internacional, vamos admitir como provável que baixaria os seus preços na precisa medida da redução da TSU, mantendo assim os resultados. Teríamos então neste caso o efeito previsto pelos macroeconomistas que defendem esta solução.
Resta saber a dimensão e outras consequências desse efeito.
Num contexto de falta de liquidez e de restrições no acesso ao crédito como o que vivemos, devemos ainda considerar o impacto financeiro negativo do aumento do IVA passivo na liquidez da «empresa» exportadora, uma vez que existe um diferimento superior a 30 dias entre o pagamento do IVA passivo e a sua recuperação. Mais importante do que esse impacto pode ser o efeito perverso de incentivar estas empresas a substituírem as compras de matérias-primas no mercado interno pelo mercado externo, aproveitando o mecanismo do reverse charge que permite à empresa não pagar o IVA ao seu fornecedor comunitário e na declaração seguinte incluir o IVA dessas compras ao mesmo tempo a pagar e a recuperar do Estado. Neste caso, a consequência é o aumento do IVA passivo, apesar de neutro nos custos da empresa, poder induzir o aumento das importações.
Consideremos agora o impacto da redução da TSU na redução dos custos e o consequente aumento potencial da competitividade da empresa exportadora. Tomemos, por exemplo três empresas fortemente exportadoras e bastante competitivas: a BA Vidro (2/3 de exportações), EFACEC (2/3 de exportações) e SEMAPA (85% de exportações). Em todas estas empresas os custos com pessoal se situam no intervalo 10-15% dos custos operacionais, pelo que mesmo uma redução na ordem dos 8% (a mais alta até agora mencionada, salvo erro) teria um efeito de apenas ao redor de 1%. Sem falar do nosso maior exportador (PETROGAL) onde os custos com pessoal representam menos de 3% dos custos operacionais.
Poder-se-ia argumentar que sendo uma parte significativa das exportações constituída por produtos com uma incorporação média mais elevada de mão-de-obra, o peso dos custos com pessoal em relação aos custos operacionais será muito diferente daqueles exemplos. Poder, poderia, mas não teria sustentação. Segundo o estudo da Central de Balanços do BdeP «Análise Sectorial das Sociedades Não Financeiras em Portugal» acabado de publicar, com base nos dados da declaração IES de 2010, a estrutura dos custos operacionais é a seguinte:
Donde se concluiu que em média na indústria os custos com pessoal representam cerca de 15% dos custos operacionais, e em consequência o impacto nestes custos da mesma redução de 8% da TSU seria apenas ligeiramente superior a 1%. A consideração do peso significativo dos custos financeiros na estrutura da maioria das empresas diluiria ainda mais os efeitos da redução da TSU nos custos totais. Evidentemente, em rigor, deveríamos estimar o efeito nas empresas a montante da redução da TSU a qual, ao diminuir os seus custos, permitiria baixar os preços e induzir a redução dos custos das empresas exportadoras. Tendo em atenção, uma vez mais, a estrutura média de custos não parece que isso permitisse baixar mais do que umas décimas nos preços das exportações, sobretudo se considerarmos que uma parte significativa desses fornecimentos é constituía por bens e serviços não transaccionáveis, como certas matérias-primas, a energia ou os serviços financeiros.
Se nos lembrarmos que esta chamada «desvalorização fiscal» visaria substituir uma impossível desvalorização cambial, fica a pergunta: faria sentido uma desvalorização pontual e única de 1% ou 2%? Recordemos que em 1983, no quadro da intervenção do FMI, o escudo foi desvalorizado 12% one shot. Ainda se fosse um crawling peg de 1% ou 2% ao mês...
No próximo post irei analisar o caso particular do turismo, um dos sectores exportadores mais importantes com 7,6 mil milhões de receitas em 2010.
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