07/12/2004

CASE STUDY: Despedido pelas razões erradas? (1)

Nunca se tinha visto tanto português de acordo. O actuação do governo foi "má" ou "muito má" para 55 por cento dos inquiridos na sondagem da Universidade Católica e "medíocre" ou "má" para 79,7%, na sondagem do IPOM. Concordam com a dissolução da AR 74,2% e 59% dos inquiridos, segundo as sondagens do IPOM e da Eurosondagem, respectivamente. Com este score, ao fim de 4 míseros meses, o governo do doutor Lopes vai entrar para o Guiness. Será provavelmente o pior governo do mundo. Por uma vez na vida, o PCP e o BE falaram em coro de «alívio», pelos vistos em uníssono com o sentir do povo esmagado por 120 dias de santanismo. O período de graça, que sustentou o guterrismo durante 2 anos, não durou no santanismo um só dia.

Por trás de tanta fartura de concordância espreita um quid pro quo. Donde veio esta insólita convergência de analistas, de comentadores, de luminárias e de cidadãos que já engoliram todos os sapos que havia para engolir nos últimos 30 anos (por falta de tempo, não vou recuar até ao fássismo)?
Comecemos pelo que fez o governo do doutor Santana Lopes em 4 meses de vida. O balanço é magro, pouca coisa, mas alguma, foi feita:
  • Aprovou a lei das rendas, que vinha a ser empurrada com a barriga pelo menos deste o tempo do saudoso engenheiro Guterres.
  • Alterou o regime das SCUTS, uma dádiva do governo do saudoso engenheiro Guterres (30 anos das concessões de 900 km custariam, e custarão com o doutor Sócrates, 8% do PIB)
  • Alterou timidamente o sigilo bancário (o suficiente para invocar demónios sem rosto)
  • Limitou os absurdos privilégios dos bancos no IRC (idem, com rosto)
  • Limitou os absurdos privilégios no IRS dos direitos de autor
  • Aboliu os benefícios fiscais do PPR/E e das CPH (chateando a sua base eleitoral) para compensar a redução de IRS nos escalões mais baixos (para felicidade da base eleitoral da esquerda)
  • Preparou um orçamento que ainda ninguém explicou em que é pior do que os antecessores, e parece ser tão bom aos olhos do PR que os sound bites (ainda não desmentidos) que escorrem para os jornais dão indicações de que o PR desejava a aprovação que teve lugar esta tarde.
Tudo isto é um bocado merdoso para 4 meses? É sim senhor. Mas alguém se lembra as decisões dos três governos anteriores nos primeiros 4 meses?

(Cenas dos próximos capítulos: as barracadas e os tiros nos pés)

ESCLARECIMENTO:
Uma percentagem significativa dos posts do Impertinências tem referências críticas ao doutor Santana Lopes, desde há mais de um ano, ainda nem ele sonhava vir a ser primeiro-ministro - tinha então ambições mais modestas, como ser o próximo PR. Então porquê este súbito desvelo impertinente pelo homem? O homem é ele e a circunstância, teria dito Ortega y Gasset se não estivesse a olhar para o umbigo. Ocupei-me do homem. Agora é a vez da circunstância.

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