A propósito de um dos muitos dislates do presidente Marcelo questionando-se sobre «a obrigação do Estado intervir na situação de emergência da comunicação social», escrevi que a incapacidade de uma parte dos mídia responderem aos novos desafios da emergência do digital e das redes sociais, incapacidade a que chamam crise da comunicação social, tem a mesma lógica dos carroceiros do início do século passado chamarem crise dos transportes à emergência do automóvel.
Luís Cabral, professor da universidade de Nova Iorque, que escreve regularmente uma da meia dúzia de peças a que se poderia limitar a edição pletórica de quase 200 páginas do Expresso, tirou-me mais uma vez as palavras da boca:
«Há alguns meses, António Costa dizia que “um dos maiores problemas do país é a péssima qualidade da nossa informação”. Uma perspectiva diferente: o facto de o primeiro-ministro não gostar dos jornalistas é provavelmente sinal de que estão fazendo um bom trabalho.
Por outras palavras, tal como as grandes editoras de música confundiram o fim do mundo com o fim do seu mundo, é possível que Marcelo esteja confundindo a crise do jornalismo com a crise dos jornais. (...)
O que me preocupa mais é o modus operandi do regime em que os governos tentam (e por vezes conseguem) ameaçar e influenciar as redacções. O que me preocupa mais é o fluxo de promissores jornalistas que se ‘vendem’ aos salários mais altos no Governo. O que me preocupa mais, enfim, é a promiscuidade entre políticos e comentadores políticos, uma ‘roda giratória’ que abafa por completo os famosos lóbis americanos.
É neste contexto que devemos analisar a pergunta do Presidente: “A grande interrogação que eu tenho formulado a mim mesmo é a seguinte: até que ponto o Estado não tem a obrigação de intervir?” Pelo que escrevi nos parágrafos anteriores, penso que a resposta é clara: a obrigação do Estado é justamente não intervir. Neste aspecto, o que se pede ao Governo não é que faça mais, é que faça menos.
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