31/12/2018

Crónica da avaria que a geringonça está a infligir ao País (168)

Outras avarias da geringonça e do país.

Depois de três anos a anunciar-nos os seus milagres, o maior crescimento do século, o «melhor desempenho de sempre para as contas públicas» (desde dona Maria II ou antes?), entre outros, Costa descoseu-se no seu discurso do Natal e confessou afinal ter virado a «página dos anos difíceis» e não a «página da austeridade». Poderia ter sido um lapsus linguae que lhe fez fugir a boca para a verdade do estrangulamento dos serviços públicos pelas cativações e pela falta de investimento, mas o mais provável é estar a falar para dentro da geringonça tentando sofrear as exigências comunistas e bloquistas.

Seja como for, gradualmente as habilidades e o contorcionismo oportunista de Costa parecem estar a cansar o eleitorado com a sua avaliação na sondagem da Aximage a atingir o ponto mais baixo de sempre e a descer até mais do que as intenções de voto no PS as quais, ainda assim, colocam os socialistas com 37% quase 5 pontos percentuais acima de PSD + CDS.

A visita quase clandestina de Serguei Lavrov, ministro dos Negócios Estrangeiros da máxima confiança de Putin, recebido em Belém em 24 de Novembro (ver agenda que é a única referência à visita e omite as conversas com Santos Silva) vem confirmar a aproximação do governo de Costa às potências autocráticas que a recepção a Xi Jinping e a baba figurada e literal derramada pelas figuras do regime já tinham abundantemente mostrado.

Na crónica anterior mencionei o Programa Nacional de Investimentos para a próxima década e os seus 20 mil milhões e de obras públicas. De acordo com o outro contribuinte do (Im)pertinências, que também escreveu sobre tema e cita detalhes dos 65 projectos, metade ou mais do plano não será financiado pelo governo - trata-se de uma espécie de evasão à realidade que começa a comprometer os amanhãs que cantariam e que, em boa verdade, como escreveu Helena Matos, não são para construir um futuro mas para prolongar o passado.

Prossegue a pouca-vergonha da Pediatria do Hospital de S. João que continuará em contentores pelo menos mais dois anos, tudo depois de as obras financiadas com filantropia terem começado em Novembro de 2016 e sido embargadas três semanas depois. É apenas mais um exemplo da degradação do tão adorado SNS a que se junta a golpada da «mudança de critérios para autorização de utilização especial de medicamentos que foi operada no Infarmed (que) passou a recusar quase todos os tratamentos inovadores que poderiam ser usados em oncologia», como aqui denuncia Leal da Costa.

Uma auditoria da Inspecção Geral de Finanças que revelava problemas graves de governação da Cruz Vermelha e subvenções recebidas indevidamente foi «engavetada», escreveu o Expresso. Nada que espante, tratando-se uma organização que é considerada um feudo do PS e actualmente é presidida por Francisco George, uma espécie de socialista honorário.

Um dos sinais da paralisia da administração pública é o atraso do processamento dos pedidos de reforma e de outros processos administrativos da Segurança Social que chega a 6 meses. A coisa pode atingir o caricato, como o que se passou com um amigo francês residente em Portugal que precisou de enviar documentação da SS portuguesa para a de Espanha, onde trabalhou vários anos, e lhe foi dito que a mera remessa de papel poderia demorar quase um ano.

Em matéria de greves estamos numa fase em que os comunistas, por um lado pressionados pelo medo de se tornarem supérfluos caso o PS consiga a maioria, e, por outro, acossados por pequenos sindicatos independentes (mais de metade dos que convocam greves) ou mesmo por grupos inorgânicos que usam o WhatsApp como meio de comunicação, irão usar intensamente o seu aparelho sindical. A semana passada tivemos greves da CP, dos funcionários do SEF, dos impostos, dos enfermeiros e o controleiro Arménio Carlos da CGTP (e membro do CC do PCP) promete que 2019 será um ano de luta e ameaça que «saltou a tampa da panela de pressão», o que é uma imagem muito adequada ao facto de os comunistas terem servido de tampa durante mais de dois anos.

Recorde-se que estas greves são invariavelmente na administração pública, porque «os privados» (que é como a esquerdalhada designa o Portugal produtivo) quase não têm greves, apesar de entre 2011 e 2017 os salários médios terem crescido 6% e 3% , respectivamente. Os valores actuais dos salários médios são: 1.461 euros para os 671 mil funcionários públicos que constituem uma parte significativa da freguesia eleitoral da geringonça e 913 euros para os quase 4 milhões de produtivos.

Em linha com a falta de fé do FMI que reduziu as estimativas do crescimento europeu em 2019 e em particular do português para 1,8%, O BCE prevê que o PIB da Zona Euro abrande para 1,7% em 2019 e para 1,7% e 1,5% em 2020 e 2021. Lá se irá o maior crescimento do século que Costa atribuía aos seus passes de mágica e, quem ainda não tinha visto, poderá ver agora que se tratava apenas de arrasto pela conjuntura.

A estas perspectivas pouco animadoras devemos acrescentar que à medida que o desemprego diminui (o retalho e a grande distribuição têm dificuldades crescentes em recrutar pessoal) os ganhos de produção por essa via tornam-se marginais, uma vez que produtividade está praticamente estagnada. A isto devemos acrescentar que o número de horas trabalhadas, apesar de ter aumentado face aos anos de crise, é inferior em 6,7% ao máximo alcançado no terceiro trimestre de 2002.

E como se pode aumentar a produtividade? Com melhor qualificação do trabalho e melhores gestores, dirão as almas sensíveis, o que, sendo uma parte da verdade, tem o pequeno problema de serem necessárias décadas para melhorar significativamente um e outro dos factores. E quanto a mais capital, que seria a via rápida para melhorar a produtividade, precisamos de mais investimento estrangeiro (mais voltado para nos comprar propriedades do que para investir produtivamente) ou mais investimento português, para o que precisaríamos de nos endividarmos mais ou da poupança que não temos (ver aqui o post do outro contribuinte).

1 comentário:

  1. Como tem sido o (mau) hábito... o texto é excelente.
    Ignorante de matérias económicas e financeiras (alcoólicas & bagaceiras na minha adolescência) comprendo sempre o que transmitis. Ainda bem.

    Abraço

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