03/09/2018

Crónica da avaria que a geringonça está a infligir ao País (151)

Outras avarias da geringonça e do país.

Dada a longevidade da geringonça, por várias vezes me interroguei se não se justificaria mudar o título desta série de «Crónica da anunciada avaria irreparável da geringonça» para outro mais adequado. Não o fiz até agora na convicção, que mantenho, de que a «possibilidade da sua acção (da geringonça) tem a duração limitada pela memória que os portugueses tenham das maldades que, segundo eles, Passos Coelho lhes fez».

Porém, vários factores estão a compensar o desvanecer da memória das maldades. Por um lado, a bonança económica trazida pelas exportações, rebocadas pela conjuntura internacional, e pelo afluxo do turismo, graças ao Daesh que acabou com a concorrência no norte de África. Por outro lado, o oportunismo e o indiscutível talento de Costa para a manipulação e para os equilibrismos conjunturais, a apetência do BE pelo poder e o colapso da oposição democrática, têm vindo a adiar a avaria da geringonça para um horizonte que, face à incapacidade congénita dos portugueses anteciparem o futuro, é aos seus olhos tão longínqua como as catástrofes anunciadas pelos gurus das mudanças climáticas. Ora, se tenho dúvidas sobre quando se tornará irreparável a já visível avaria geringonça, não as tenho quanto aos danos que a governação socialista inspirada e suportada por comunistas e berloquistas está todos os dias a infligir ao País. Daí o rebaptismo.

Exemplo do oportunismo de Costa é a medida pré-anunciada a semana passada pelo Acção Socialista, semanário também conhecido por Expresso, e confirmada pelo próprio Costa no comício da rentrée onde, até pela benevolente bitola do Acção Socialista, Costa disse várias mentiras e outras meias mentiras. A medida consiste num desconto de 50% do IRS durante 3 a 5 anos para os emigrantes que tenham saído entre 2011 e 2015, isto é durante o governo PSD-CDS, e voltem em 2019 ou 2020. Para além da provável ineficácia, se vier a concretizar-se será uma medida profundamente injusta para quem ficou durante o resgate ou emigrou antes ou depois dele (leitura recomendada).

Uma das maiores ameaças ao bem-estar da geringonça é o abcesso do «descongelamento das carreiras», a propósito do qual a Fenprof já prometeu mais uma greve em Outubro. Enquanto isso, apesar do número de alunos do ensino não superior ter diminuído de 1.376 mil em 2011 para 1.322 mil em 2017 o número de professores aumentou de 141,3 mil em 2015 para 145,5 em 2017 e para o próximo ano lectivo o ministério já colocou 6 mil professores contratados.

Se por um lado Costa se propõe aliviar os emigrantes regressados, por outro propõe-se levar o Big Brother a todos os residentes dando concedendo o acesso do Ministério Público aos dados fiscais sem autorização judicial. Trata-se do mesmo governo que se opõe à divulgação dos detentores dos calotes à Caixa por considerá-la uma violação dos dados pessoais.

A imprensa amiga trombeteou como um grande feito a queda de 1.100 milhões de euros do défice até Julho . E qual o milagre que permitiu essa redução? 1.159 milhões resultaram do aumento da receita fiscal, o que superou ligeiramente o aumento de 1.090 mil milhões das despesas correntes. Na verdade, se as coisas não derraparam foi porque nos 7 primeiros meses do ano só foram gastos 36% dos 2,5 mil milhões para dotações de capital, ou seja uma "poupança" de 550 milhões. O resto do milagre resultou só terem sido executados menos de um terço dos empréstimos a empresas públicas. Os resultados desta austeridade socialista na degradação dos serviços públicos são conhecidos.

Ainda assim, o maná da receita fiscal não impediu mais um aumento em Julho de 57 milhões dos pagamentos em atraso das entidades públicas e também não impediu que o montante total das cativações tivesse aumentado mais 300 milhões no 2.º trimestre atingindo 1.344 mil milhões, montante que inclui as cativações da despesa com o transporte ferroviário que atingiram 95 milhões no final de Junho.

O maná da receita fiscal também não está a ser usado para diminuir a dívida pública que no final do ano passado era a décima maior do mundo, comparável à do Sudão (126%) e da Eritreia (131,2%), e era a terceira da Zona Euro apenas ultrapassada pela Itália (131,5%) e a Grécia (181,9%).

O crescimento de 2,3% do 2.º trimestre foi muito celebrado por ter ultrapassado as previsões. O que tem pouco para celebrar é esse crescimento ter sido à boleia do consumo interno que cresceu 2,6% à custa do aumento de 8,8% de bens de consumo duradouro (popós e electrodomésticos). A procura externa líquida (exportações menos importações) teve um contributo ainda mais negativo (-0,7%) do que no 1.º trimestre (-0,6%). O contributo do investimento continuou a diminuir, garantindo que uma vez esmorecida esta foguetada do turismo e o reboque da conjuntura internacional o stock de capital permanecerá insuficiente para um crescimento sustentado da economia.

O crédito ao consumo é que continua bem. No 2.º trimestre o crédito concedido pelos associados da ASFAC (alguns bancos e outras entidades financeiras especializadas no crédito ao consumo) teve um aumento homólogo de 16,5% atingindo 2,6 mil milhões. Ao mesmo tempo, o incumprimento das famílias recomeçou a aumentar.

Entretanto, os indicadores coincidentes do BdP que medem a variação homóloga da actividade económica voltaram a desacelerar em Julho pelo nono mês consecutivo e o índice de produção industrial do INE também desceu em Julho. Valha-nos o turismo que o ano passado gerou receitas de 15.000 milhões e as exportações de componentes para a indústria automóvel que cresceram 8,1% no 1.º semestre atingindo 4,3 mil milhões (15% das exportações portuguesas) dos quais 71% para a Autoeuropa. Moral da estória: não há bem que sempre dure mas pode haver males que nunca acabam, como a dívida pública e a dívida externa.

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