Outras avarias da geringonça e do país.
Governar a correr atrás dos noticiários é o que mais uma vez o governo fez a propósito da CP onde começou a cair uma chuva de euros - na verdade, são apenas boletins meteorológicos anunciado-a. Foram os anúncios dos mil e quatrocentos milhões, das indemnizações compensatórias no futuro contrato de serviço público, dos 168 milhões para os comboios regionais, culminando com a estimativa do sempre prestável semanário de reverência que no próximo quadro comunitário 2021-2027 será necessário investir mil milhões por ano na ferrovia, estimativa que na frágil e crédula meninge dos portugueses se transforma num facto consumado que ofusca o caos em que a CP está mergulhada.
Há menos de dois anos o chefe Costa entregou à Câmara de Lisboa a Carris deixando mais 800 milhões do seu passivo como dívida do Estado para ser paga pelos contribuintes de todo o país. Agora mandou o putativo sucessor Medina anunciar uma redução dos passes sociais na área metropolitana de Lisboa a pretexto de reduzir o tráfego urbano. Logo se levantaram vozes criticando com razão serem os contribuintes de todo o país a pagar a factura dos transporte dos alfacinhas. Outras vozes defenderam que só a melhoria da qualidade dos transportes conseguiria tal propósito, sendo certo, digo eu, que no Estado Sucial em que vivemos essa solução seria paga pelos mesmos contribuintes de todo o país. Porém, a questão de fundo é que, com toda a evidência, nenhuma dessas soluções teria impacto significativo na redução do volume de tráfego (leia-se este post do Impertinente), redução que exigiria outras soluções, como uma taxa de congestionamento variável por hora e por zona em que o utilizador-condutor pagaria o impacto ambiental e o uso das infraestruturas urbanas.
Falando de tráfego, espevitada pela expectativa do aumento dos impostos resultante da alteração do sistema de medição dos consumo e emissões, a venda de veículos novos aumentou 28% em Agosto.
Com os vagares a que a justiça nos habituou (melhor os vagares de Joana Marques Vidal do que os apagões de provas de Pinto Monteiro), mais de um ano depois parece estar pronta a acusação da Protecção Civil (preenchida com os amigos de Costa, recorde-se) e de outras entidades pelas 6 dezenas de mortes do incêndio de Pedrógão Grande.
Os efeitos do virar da página da austeridade continuam a fazer-se sentir nos hospitais. Desta vez, foi o de Gaia-Espinho cujos médicos se demitiram alegando que o hospital está «parcialmente destruído com infraestruturas de vários anos e que funcionam mal».
Pelo lado da geringonça, pela primeira vez em mais de 40 anos, os comunistas dão a entender que estão disponíveis para participar num governo. Dirão, isso é só conversa fiada. Conversa será, mas não é fiada e terá um preço. Ainda a lamber as feridas do caso do investidor especulativo Robles, que os fez perder quase 1/3 de intenções de voto, os berloquistas também se declararam prontos para saltar para o comboio. Tudo isto em sintonia com Manuel Alegre e João Soares, o Dupond e o Dupont da Esquerda Unida, que se declararam a favor de uma participação de comunistas e berloquistas no governo (jornal SOL).
É apenas mais um exemplo da doutrina L'État c'est nous e do desinteresse pelo conflito de interesses: o Inspector Geral de Finanças, que já pertencia à Santa Casa é nomeado para o Conselho das Fundações.
Recordam-se dos anúncios do milagre da queda de 1.100 milhões de euros do défice até Julho? Pois bem, isso era em contabilidade pública. Em contabilidade nacional, que é o que interessa para a CE, o défice estimado pela UTAO no 1.º semestre é de 1,6% do PIB, incluindo a recapitalização do Novo Banco - o Ronaldo das Finanças, que só dá boas notícias, anuncia os défices e defende critérios conforme dá mais jeito (leia-se este post e os nele linkados).
Lembram-se dos anúncios dos crescimentos miraculosos? Pois bem, na EU28 Portugal com os seus 2,3% no 2.º trimestre foi o 8.º país que menos cresceu, sendo que os outros sete incluem apenas um que pertence ao mesmo campeonato de Portugal - a Grécia. Todos os outros países do nosso campeonato têm crescimentos superiores e, um a um, vão ultrapassando, o PIB per capita português. Sobre as perspectiva futuras, convém sublinhar que «o crescimento económico pela empregabilidade tem os dias contados».
Enquanto o vento da conjuntura internacional nos empurrar, a coisa irá indo, porém, como reconheceu Jean-Claude Trichet, o ex-presidente do BCE, a situação financeira actual está tão perigosa como antes da crise de 2008 com a agravante, acrescento eu, dos novos riscos: guerra comercial de Trump e uma UE abalada pelo Brexit, por uma Itália à beira do abismo, a crise dos refugiados e a emergência dos nacionalismos incentivados por uma Rússia de Putin cada vez mais agressiva e intervencionista.
Com os problemas por resolver e as reformas por fazer - pior, as contra-reformas da geringonça já feitas e as que se seguirão para comprar eleitorado -, qualquer espirro na conjuntura internacional traz-nos uma pneumonia para a qual não estamos preparados com a dívida pública e a dívida externa que temos, a deterioração da balança comercial que se anuncia, com a continuada baixa produtividade, com um Estado pletórico e uma carga fiscal pesada e sem competitividade fiscal (segundo a OCDE, temos o segundo IRC mais alto da Europa). Eu, que sou agnóstico, digo que Deus nos ajude.
Desculpar-me-á, mas não é o Costa que anda atrás dos noticiários mas são estes que andam atrás do Costa. O que é bem pior.
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