23/07/2018

Crónica da anunciada avaria irreparável da geringonça (145)

Outras avarias da geringonça.

Esta semana tivemos uma reedição da comédia de Tancos com o ministro das forças desarmadas - dispensado do serviço militar por ter o pé chato (OK, é uma boutade) -, a confessar não fazer a menor ideia se ainda há ou não há material desaparecido de Tancos ainda por recuperar como o ministério público parece ter concluído.

E tivemos também novas comédias, como a contratação da empresa de um dos amigos de Costa, que já tinha feito a campanha das eleições legislativas, a fazer agora a campanha de sensibilização para limpeza das matas. Com tantos amigos destes, bem podia Costa substituir os concursos públicos pela sua lista de amigos. De notar também o tique situacionista, fazendo lembrar o Estado Novo, de nomear a Sr.ª Costa para madrinha do navio NRP Sines acabado de construir nos estaleiros de Viana do Castelo. Ou o desvio de meio milhão de euros dos donativos para a reconstrução das habitações destruídas pelos incêndios em Pedrógão usados em casas não prioritárias - quem sabe se os seus proprietários não estariam numa qualquer das muitas listas de amigos.

Quem é membro permanente da lista de amigos do PS é evidentemente Medina deixado por Costa no seu lugar na Câmara de Lisboa. Deve ter sido nessa qualidade que o governo resolveu ajudar Medina cedendo à Câmara prédios para serem arrendados a valor abaixo do mercado, prédios que constituem activos da Segurança Social representando as reservas para pagar no futuro as pensões de reforma.

Ainda assim, a comédia de maior sucesso passou-se no parlamento com 140-votações-140 incluindo votos de pesar, resoluções, projectos e propostas de lei, entre as quais a lei de finanças locais, o regime do alojamento local e alterações à legislação laboral, com os deputados afobados a levantarem-se e a sentarem-se como se estivessem no ginásio. Entre as 140 votações lá aprovaram o novo regime do alojamento local para tentar a prazo acabar ele, ou talvez, quem sabe?, criar a necessidade de o subsidiar.

Além das citadas comédias, tivemos a continuação da novela das desavenças conjugais no seio da geringonça. Santos Silva exigiu juras de euro-fidelidade aos parceiros, Costa pôs água na fervura, o camarada Jerónimo ameaçou «conflitualidade insanável». No final tudo se compôs: «Esquerda unida impede baixa do ISP» (belo título o camarada João Oliveira traduz o pensamento do camarada secretário-geral garantindo que «nunca será por falta do PCP» que o zingarelho avariará. Contribuindo para alargar a geringonça ao bloco central o «PSD abstém-se e salva a face do Governo nas alterações à legislação laboral» (outro belo título).

Apesar das tentativas do PS através das suas antenas nas redacções para limpar a folha dos seus, as investigações da operação Tutti Frutti estão a revelar uma espécie bloco central da corrupção que envolver gente do PSD e do PS na troca de favores e adjudicação de contratos.

As sondagens mostram que os «utentes» consideram que o SNS está agora pior do que nos anos da crise. A tão celebrada realização do Estado Social está em 17.º lugar na UE28 em termos de eficiência e a imprensa do regime descobre, após quase 3 anos a assobiar para o lado, que o SNS está à beira do colapso. Poderia dar vários exemplos mas basta o do Expresso, o semanário de reverência ultimamente a sofrer epifanias sucessivas, como a último fim de semana em que descobriu que no OE 2018 a percentagem das despesas do SNS no do PIB é mais baixa nos últimos 15 anos.

E não é só o SNS que tem sido atingido pelo «virar da página da austeridade». Há inúmeros exemplos e um dos que se tornaram mais evidentes recentemente é o da CP que um dias destes já não tem comboios a circular e já começa a cortar até no Alfa Pendular, o ex-libris dos transportes públicos estatais.

O investimento, sem o qual não há crescimento (a não ser na visão miraculosa da realidade virtual do socialismo), representou o ano passado 16% do PIB em Portugal, 21% em Espanha, 23% na Irlanda e 20% em média na Zona Euro. Em termos nominais, o investimento cresceu entre 2014 e 2017 5,4% em Portugal e na Irlanda quatro vezes mais (22,3%). Não admira por isso que até para o investimento imobiliário falte capital português com o volume de activos geridos pelos fundos de investimento a cair 36% em relação a 2007.

Se falamos em investimento, que no luso-economês tem como sinónimo subsídios, temos de falar no Portugal 2020, um programa em que a avaliação dos projectos de investimento leva em média o dobro do tempo previsto e a taxa de execução anda pelos 24% (dados citado pelo Expresso). E porquê? Por várias razões, desde incompetência até ao adiar do pagamento da comparticipação do Estado Português sem a qual não vem dinheiro de Bruxelas.

Prenunciando um inevitável aumento das taxas de juro, a inflação em Junho atingiu 2% na Zona Euro, enquanto a dívida pública portuguesa atingiu no final do 1.º trimestre 126,4% do PIB, o terceiro maior rácio segundo o Eurostat. De notar que o BdP detém 47 mil milhões de títulos da dívida pública - o governador Carlos Costa deverá estar agora com as perninhas a tremer como os banqueiros alemães ameaçados in illo tempore por Pedro Nuno Santos.

Fonte: Eco

Se fosse só a dívida pública já seria caso para pormos as barbas de molho, mas dá-se o caso de a dívida total da economia, isto é Estado, empresas não financeiras e famílias, bateu novo recorde. No que respeita às famílias, o crédito ao consumo registou em Maio uma subida homóloga de 16,3%, sobretudo devido ao crédito pessoal (22,7%) e para compra de automóvel (14,8%). Por isso, apesar do rendimento disponível dos portugueses estar a crescer acima da média europeia há 3 anos, nem assim a poupança tem crescido.

E sem poupança não há investimento e sem investimento não há crescimento. Não admira por isso que o indicador coincidente do BdP mostre o crescimento da actividade económica a desacelerar há oito meses consecutivos.

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