«A estranheza está na desproporção das reacções, e na capacidade que uma certa elite lisboeta tem de transformar o particular em universal. Manuel Reis não transformou o país, nem sequer Lisboa. Manuel Reis – sobretudo para aqueles que lhe chamavam Manel – transformou as vidas da elite artística, jornalística e cultural de Lisboa, e de todos os que fazem da noite burguesa, intelectual, endinheirada e libertina (não é uma crítica) uma primeira casa. Foram estes, e só estes, que reagiram na semana passada como uma tribo que acabou de perder o seu xamã. Não há mal nisso. É até muito compreensível – desde que a tribo saiba que é apenas uma tribo. Ou, para citar a mais famosa frase da carreira de Mário de Carvalho, desde que não confunda o género humano com o Manuel Germano.
Infelizmente, esta tribo em particular, até por estar muito habituada a pôr-se ao lado dos “excluídos”, tem nítidas dificuldades em admitir o quão elitista é o seu mundo. Ela nunca teve de esperar nas filas do Lux, e pode chamar Guida Gorda a Margarida Martins sem ser acusada de body shaming, mas não percebe que o elogio exorbitante a Manuel Reis é também uma autocongratulação pelos seus próprios privilégios. O texto mais emblemático que li sobre Reis foi escrito por José Couto Nogueira no Sapo24, e é muito revelador quanto a isso: “E os que não conseguiam passar da porta [do Frágil]? Uma amiga que viveu esses tempos contou-me o que era passar a franquia da zona dos comuns para o espaço lá dentro – e como, ao entrar, se sentia a validação de fazer parte do clube exclusivo da elite cultural.”»
Excerto de «Nós, os que esperámos à porta do Lux», João Miguel Tavares no Público
Estas, como outras elites merdosas que nos parasitam, vivem numa espécie de huis clos sartriano imaginando que o inferno são os outros que ficam do lado de fora da porta... do Lux.
Só faltam as aspas aí nas "elites".
ResponderEliminarProvincianismo bisonho e irremediável - que se estende até àquilo que, no meu tempo, se chamava "boites".
ResponderEliminarTerra de Salcedes, Gouvarinhos , Abranhos e um longo etc.
Continuam por aí, só que sob outros nomes.
Vide, noutro ( não muito diferente...) registo, o caso do Nanito de Berkeley...